O perfil pode fazer lembrar Al Pacino, mas é Alfredo Castro, grande actor do teatro chileno e presença dominante no filme Tony Manero, agora estreado entre nós — este texto foi publicado no Diário de Notícias (11 de Março), com o título 'Entre fábula e realismo'.
Lembram-se desse filme genial que é Peeping Tom (1960), de Michael Powell? Chamou-se entre nós A Vítima do Medo. Nele se conta a história, cristalina e macabra, de um cineasta amador (interpretado por Karlheinz Böhm) que assassina mulheres, filmando-lhes o rosto no momento da morte. Mais do que uma pura expressão do género de terror, Peeping Tom coloca em cena um tema clássico, inevitavelmente incómodo, que a euforia “audiovisual” do mundo contemporâneo recusa enfrentar. A saber: as alianças simbólicas entre cinema e morte, ou melhor, o modo como as imagens existem como expressão ambígua de fantasmas que nos habitam.
Tony Manero, do chileno Pablo Larrain, não possui a complexidade estrutural do trabalho de Powell. Em todo o caso, o filme participa dessa evidência muito íntima que permite pressentir o cinema como máquina de histórias e situações que nos transportam para um mundo alternativo com tanto de sedutor como de inquietante. Neste caso, a personagem central, ao imitar “Tony Manero” (isto é, John Travolta no clássico Febre de Sábado à Noite, dirigido por John Badham em 1977), vive uma espécie de fábula cinéfila que o “liberta” da crueza da sua existência e, no limite, da brutalidade dos seus crimes.
Evocando os tempos conturbados da ditadura de Augusto Pinochet, Tony Manero repõe na actualidade cinematográfica a possibilidade de um realismo que resiste às aparências mais ou menos pitorescas (mesmo se as integra), procurando as convulsões mais secretas dos seres humanos. É um realismo dos corpos e dos lugares apoiado numa laboriosa escrita dramática. Daí que seja fundamental celebrar a qualidade dos actores, com inevitável destaque para o protagonista, Alfredo Castro.
Lembram-se desse filme genial que é Peeping Tom (1960), de Michael Powell? Chamou-se entre nós A Vítima do Medo. Nele se conta a história, cristalina e macabra, de um cineasta amador (interpretado por Karlheinz Böhm) que assassina mulheres, filmando-lhes o rosto no momento da morte. Mais do que uma pura expressão do género de terror, Peeping Tom coloca em cena um tema clássico, inevitavelmente incómodo, que a euforia “audiovisual” do mundo contemporâneo recusa enfrentar. A saber: as alianças simbólicas entre cinema e morte, ou melhor, o modo como as imagens existem como expressão ambígua de fantasmas que nos habitam.
Tony Manero, do chileno Pablo Larrain, não possui a complexidade estrutural do trabalho de Powell. Em todo o caso, o filme participa dessa evidência muito íntima que permite pressentir o cinema como máquina de histórias e situações que nos transportam para um mundo alternativo com tanto de sedutor como de inquietante. Neste caso, a personagem central, ao imitar “Tony Manero” (isto é, John Travolta no clássico Febre de Sábado à Noite, dirigido por John Badham em 1977), vive uma espécie de fábula cinéfila que o “liberta” da crueza da sua existência e, no limite, da brutalidade dos seus crimes.
Evocando os tempos conturbados da ditadura de Augusto Pinochet, Tony Manero repõe na actualidade cinematográfica a possibilidade de um realismo que resiste às aparências mais ou menos pitorescas (mesmo se as integra), procurando as convulsões mais secretas dos seres humanos. É um realismo dos corpos e dos lugares apoiado numa laboriosa escrita dramática. Daí que seja fundamental celebrar a qualidade dos actores, com inevitável destaque para o protagonista, Alfredo Castro.
>>> Trailers de Tony Manero (2008) e Febre de Sábado à Noite (1977).