A Baía da Vergonha utiliza o registo documental para dar conta de uma situação chocante nas relações entre os seres humanos e o mundo animal — este texto foi publicado no Diário de Notícias (26 de Fevereiro).
É muito provável que o facto de A Baía da Vergonha (título original: The Cove) ser um filme sobre golfinhos leve alguns espectadores a imaginar uma aventura mais ou menos radiosa, com muitos voos aparatosos nas águas dos oceanos. De facto, estamos perante algo bem diferente: um filme cru e dramático, por vezes profundamente perturbante, sobre o modo como os golfinhos são tratados, ou simplesmente assassinados, nas águas de Taiji, no Japão. Quando do seu lançamento nos EUA, The Wall Street Journal chamou-lhe mesmo “um filme de terror sobre golfinhos”.
Importa sublinhar que se trata de um documentário. Mais do que isso: A Baía da Vergonha desenvolve-se como um inquérito, de tipo jornalístico, tentando perceber porque é que Taiji se apresenta como um lugar de celebração dos golfinhos e do seu habitat, ao mesmo tempo que as autoridades locais bloqueiam todas as formas de acesso ao que acontece na baía a que o título do filme se refere. Na prática, Taiji funciona como um centro de apanha e abate ao serviço de uma indústria que movimenta muitos milhões de dólares: os golfinhos são encurralados na baía, muitos deles mortos com lanças e facas (a sua carne é vendida num mercado cuja transparência o filme contesta), enquanto outros são capturados para serem vendidos a parques de diversão em todo o mundo.
Daí que este seja também um relato com as características de uma aventura recheada de atribulações. Somos, assim, confrontados com o trabalho de uma equipa de filmagens que teve de inventar formas peculiares para registar os “bastidores” de Taiji, colocando câmaras em lugares quase inacessíveis, por vezes correndo sérios riscos físicos.
Um aspecto que confere especial acuidade factual e força moral ao filme é o facto de um dos seus protagonistas ser Ric O’Barry [foto] (69 anos), explorador marítimo que, há mais de 40 anos, treinou os golfinhos da série televisiva Flipper (produção da NBC, originalmente emitida em 1964/67). Como ele próprio confessa, foi o contacto com os animais (e o facto de um deles lhe ter morrido, literalmente, nos braços) que o transformou num activista, defensor tenaz dos direitos dos golfinhos, denunciando todas as formas de cativeiro a que são sujeitos. A esse propósito, O’Barry lembra, por exemplo, que os golfinhos, tantas vezes fechados em tanques do tamanho de piscinas, são animais que, nos oceanos, percorrem algumas dezenas de quilómetros... por dia!
Realizado por Louie Psihoyos (53 anos), fotógrafo e documentarista com uma carreira ligada à National Geographic, A Baía da Vergonha é um dos fenómenos recentes do documentarismo cinematográfico, conseguindo mesmo a proeza de estar nomeado para o Oscar de melhor documentário (cerimónia a 7 de Março). Aliás, a sua lista de distinções é impressionante, começando com o prémio do público do Festival de Sundance de 2009. Depois disso, A Baía da Vergonha já foi reconhecido como melhor documentário do ano pelos sindicatos americanos de produtores e realizadores e ainda por várias associações de críticos, incluindo a National Board of Review.
É muito provável que o facto de A Baía da Vergonha (título original: The Cove) ser um filme sobre golfinhos leve alguns espectadores a imaginar uma aventura mais ou menos radiosa, com muitos voos aparatosos nas águas dos oceanos. De facto, estamos perante algo bem diferente: um filme cru e dramático, por vezes profundamente perturbante, sobre o modo como os golfinhos são tratados, ou simplesmente assassinados, nas águas de Taiji, no Japão. Quando do seu lançamento nos EUA, The Wall Street Journal chamou-lhe mesmo “um filme de terror sobre golfinhos”.
Importa sublinhar que se trata de um documentário. Mais do que isso: A Baía da Vergonha desenvolve-se como um inquérito, de tipo jornalístico, tentando perceber porque é que Taiji se apresenta como um lugar de celebração dos golfinhos e do seu habitat, ao mesmo tempo que as autoridades locais bloqueiam todas as formas de acesso ao que acontece na baía a que o título do filme se refere. Na prática, Taiji funciona como um centro de apanha e abate ao serviço de uma indústria que movimenta muitos milhões de dólares: os golfinhos são encurralados na baía, muitos deles mortos com lanças e facas (a sua carne é vendida num mercado cuja transparência o filme contesta), enquanto outros são capturados para serem vendidos a parques de diversão em todo o mundo.
Daí que este seja também um relato com as características de uma aventura recheada de atribulações. Somos, assim, confrontados com o trabalho de uma equipa de filmagens que teve de inventar formas peculiares para registar os “bastidores” de Taiji, colocando câmaras em lugares quase inacessíveis, por vezes correndo sérios riscos físicos.
Um aspecto que confere especial acuidade factual e força moral ao filme é o facto de um dos seus protagonistas ser Ric O’Barry [foto] (69 anos), explorador marítimo que, há mais de 40 anos, treinou os golfinhos da série televisiva Flipper (produção da NBC, originalmente emitida em 1964/67). Como ele próprio confessa, foi o contacto com os animais (e o facto de um deles lhe ter morrido, literalmente, nos braços) que o transformou num activista, defensor tenaz dos direitos dos golfinhos, denunciando todas as formas de cativeiro a que são sujeitos. A esse propósito, O’Barry lembra, por exemplo, que os golfinhos, tantas vezes fechados em tanques do tamanho de piscinas, são animais que, nos oceanos, percorrem algumas dezenas de quilómetros... por dia!
Realizado por Louie Psihoyos (53 anos), fotógrafo e documentarista com uma carreira ligada à National Geographic, A Baía da Vergonha é um dos fenómenos recentes do documentarismo cinematográfico, conseguindo mesmo a proeza de estar nomeado para o Oscar de melhor documentário (cerimónia a 7 de Março). Aliás, a sua lista de distinções é impressionante, começando com o prémio do público do Festival de Sundance de 2009. Depois disso, A Baía da Vergonha já foi reconhecido como melhor documentário do ano pelos sindicatos americanos de produtores e realizadores e ainda por várias associações de críticos, incluindo a National Board of Review.