Como cria todas as histórias que filma, todas elas baseadas no quotidiano?
Aquelas histórias são inspiradas pelo dia-a-dia de pessoas que eu conheço. De amigos, de conhecidos, de algo que ouvi contar... De alguém que fala de um neto... Da televisão... Vi aquela história de uma avó a rogar em favor um neto na televisão, pedindo que retirassem as acusações que lançavam sobre ele. Numa outra notícia vi uma outra avó a pedir doações para poder pagar o enterro de um neto. Pensei que se juntasse estas histórias poderia criar algo... Teria não apenas as suas histórias de vida, mas também algo maior, que levantaria também o seu contexto social se juntasse estas experiências. Quando se vive nas Filipinas e se está exposto a estas vidas todos os dias não se pode deixar de fazer parte de tudo isto. Somos isto. E podemo-nos relacionar com isto... Partilhar... E desta história fazer um filme.
Podemos conhecer assim a vida quotidiana nas Filipinas através do seu cinema?
É esse o ponto. É aí que baseio as minhas histórias... Tudo evolve em torno do quotidiano filipino.
O som é uma presença com características muito próprias no seu cinema. Em Serbis, por exemplo, o ruído do tráfego nas ruas da cidade é intenso... E constante...
Quando mostrei o filme em Cannes houve quem tenha manifestado alguns problemas por causa do som do filme. Mais que ser uma personagem do filme, mostra um pouco do que é a nossa cultura. Quem já foi à Ásia meridional, a Banguecoque, ao Vietname, às Filipinas, sabe que o ruído faz parte do nosso dia-a-dia. Quando chegamos à Europa parece que estamos numa cidade fantasma. Não ouvimos ruído, as pessoas andam devagar, ninguém fala alto... É um choque cultural. Há dias, numa sala, parecia que estava num mosteiro. Por isso esse som é importante estar nos filmes. É um ambiente. Ajuda a dar uma tridimensionalidade ao filme. Não é apenas uma banda sonora ou sound design. É uma presença.
O seu cinema está muito ligado às Filipinas. Imagina-se a fazer, um dia, um filme fora do seu país ou uma história não filipina?
Sim, imagino. Não me sinto limitado a estas histórias, mas neste momento é ali que sinto conforto. Porque estas são as histórias que conheço melhor. Se um dia fizer algo fora das Filipinas terei de me familiarizar antes, não apenas com a cultura mas com as pessoas e as histórias. Não me imagino é a filmar sem estar envolvido no processo de criação do argumento. Gosto de ter as mãos na história que conto. Tenho de a compreender, assim como a psicologia das personagens, o que as envolve. A história é, para mim, o mais importante de um filme. Por isso dedico tanto trabalho à preparação de um filme. Se isso não se nota, por exemplo, num Sebis, ao menos sei como aquela gente vive, como existem...
Alguns dos filmes filipinos que têm ganho visibilidade em festivais de cinema retratam questões ligadas à homossexualidade. Porque terão chamado tantas atenções?
Não são filmes que retratem a homossexualidade segundo clichés. Mas o facto é que chamaram atenções de vários públicos. E o público gay e lésbico existe e vê cinema. E éssa é também uma razão pela qual os realizadores abordam estes assuntos.
Da publicidade para o cinema não parece ter trazido muitos hábitos, pelo menos no plano técnico...
Fiz questão de entender esses como dois mundos distintos. Quando trabalhava em publicidade sabia que era um vendedor. Que estava a vender um produto, uma ideia, e tinha uma agenda que tinha de atingir. Ao fazer cinema sei que não tenho de vender nada. Estou antes a contar uma história e tenho de ser verdadeiro no contar dessa história. Mas há uma coisa que aprendi na publicidade e que aplico ao cinema: a disciplina. Em ambos os mundos sou disciplinado, faço o trabalho de preparação de antemão. E assim funciona. Por vezes sinto que essa disciplina falta a alguns realizadores mais jovens. Comportam-se mais como artistas e as equipas têm antes de os “aturar”, seguir e tentar compreender... Não tenho essa atitude, porque sei que este é um trabalho e envolve uma equipa, que precisa de estar empenhada naquilo que estamos a fazer.