Antes de realizar o seu primeiro filme já ia regularmente ao cinema como espectador?
Ia, sim... Mas via mais filmes de Hollywood. E a minha ideia de bom filme era então algo que falasse a Hollywood...
Que filmes mais o marcavam nesses tempos?
Todos aqueles filmes de acção e com super-heróis. Só comecei a ter consciência de um outro cinema quando comecei a fazer filmes... Há uma diferença entre o que eu queria ser e o que estou a fazer. Hoje sigo o meu coração. Faço o que sinto que devo fazer... E comecei a fazer as coisas desta maneira sem saber que ia seguir o plano que hoje estou a desenvolver.
Fez-se realizador e cinéfilo quase em simultâneo…
Ao mesmo tempo, sim. Ao mesmo tempo que me estou a descobrir estou a aprender. E até agora é assim que tenho trabalhado. Ainda estou a aprender, a descobrir... Tenho visto trabalhos de grandes realizadores... Quero aprender...
Consegue apontar algumas das suas descobertas mais recentes?
Truffaut. Gosto muito d’ Os 400 Goples... É para mim o melhor filme, neste momento. Também gosto muito do Ladrão de Bicicletas do [Vittorio] De Sica... Todos os realizadores do neo-realismo... Mas só agora me apercebo de que aquele é o meu tipo de cinema. São filmes próximos do que estou a fazer... Mas antes não sabia que estes filmes existiam. São filmes admiráveis... Esta ideia de ser paciente face a um público também se aplica, no fundo, a mim. Sou como qualquer um que começa exposto a Hollywood e depois descobre outro cinema. E é uma descoberta espantosa. Se aconteceu comigo pode acontecer com qualquer um.
O que conhece do cinema português?
Gostei do que vi dos realizadores mais jovens. Gostei da curta que ganhou em Cannes a Palma de Ouro [Arena, de João Salaviza]. É um cinema muito bom, muito energético. É o tipo de cinema que quero ver. Que quero descobrir. Também gosto do trabalho dos irmãos Dardenne, do [Gus] Van Sant... Gosto muito do Elephant. Impressionou-me muito quando vi esse filme pela primeira vez.
Como descreve a sensação de ganhar prémios? O seu primeiro filme venceu em Locarno. Kinatay valeu-lhe um prémio de Melhor Realizador em Cannes...
Para ser sincero a primeira vez [Locarno, 2005] foi marcante. Há toda uma grande alegria que se desenvolve enquanto estamos a filmar. Muitas vezes digo que, no fim, muitos dos filmes que estamos a fazer acabarão esquecidos daqui a uns anos e esses filmes premiados são aqueles que serão recordados. Mas o mais importante é mesmo a relação que desenvolvemos quando estamos a fazer os filmes. Não podemos perder o que há de prazer neste trabalho. É por pensar assim que os prémios e o reconhecimento funcionam para mim como bónus. A alegria inicial vem de fazer os filmes. Estes são bónus que sabem bem, naturalmente. É claro que ganhar um prémio em Cannes faz toda a diferença, sobretudo pelas portas que abre. É-se reconhecido, é-se aplaudido... Mas, como disse, não é isso... Gosto de ser reconhecido, de ver que fazem uma retrospectiva do meu trabalho, mas é apenas parte de um todo que é ser realizador. Não é “a” alegria maior.
A história política das Filipinas, dos dias de Marcos até hoje, afectou a forma como evoluiu o cinema local?
Hoje não... Nos dias de Lino Brocka os filmes reflectiam assuntos políticos por causa da situação que se vivia então. Havia a ditadura... Havia filmes que não eram mostrados de todo. Só se podiam mostrar no estrangeiro. Hoje em dia é diferente. Podemos dizer o que quisermos. A censura pode sempre cortar os filmes... Mas se queremos mostrar o nosso cinema podemos mostrá-lo fora das Filipinas sem ter de o esconder. A única razão por que temos uma censura deve-se ao circuito comercial. Um filme tem de passar pela censura por causa da estreia. Mas podemos passar os filmes em sessões especiais ou salas de cinema de autor sem pedir autorização à censura. Mas isso não podíamos fazer nos dias de Marcos. Hoje temos essa liberdade.
(continua)