quinta-feira, dezembro 24, 2009

Sherlock Holmes, séc. XXI

Como refazer a dupla Sherlock Holmes/John Watson para o século XXI? Guy Ritchie tem uma resposta original — este texto foi publicado no Diário de Notícias (23 de Dezembro), com o título 'Uma aventura nostálgica lembrando Errol Flynn'.

Que relação existe entre Sherlock Holmes e um herói como Robin dos Bosques, eternizado por Errol Flynn há mais de 70 anos? Guy Ritchie não confunde um com o outro, mas arrisca uma derivação desconcertante, sedutora e saborosamente nostálgica. A saber: o detective criado por Conan Doyle poderá ter também um lugar na genealogia clássica do cinema de aventuras.
A hipótese reduz a mera sugestão as ambivalências (morais e sexuais) que marcavam esse filme fabuloso que é A Vida Íntima de Sherlock Holmes, realizado por Billy Wilder em 1970. Vogamos, agora, num espaço em que a desenvoltura intelectual de Holmes e as atribulações físicas da acção não se contradizem, antes parecem atrair-se e contaminar-se como dois registos cúmplices. Na prática, isso arrasta uma consequência que, nos tempos que correm, merece ser valorizada: em vez do alarido de filmes que confundem o exibicionismo técnico com a criação narrativa, o novo Sherlock Holmes interessa-se, de facto, pelas personagens e pelos sentidos do seu comportamento. Ou ainda: os actores não são peças decorativas e, em boa verdade, só por pura incompetência se poderia menosprezar o talento multifacetado de Robert Downey Jr. (Holmes) e Jude Law (Watson).
Resta acrescentar que a sofisticação técnica acaba por ser vital, não exactamente para multiplicar as explosões, mas para criar uma sugestiva Londres de época em que a ponte sobre o Tamisa (na altura, em fase de construção) acaba por ter um fundamental papel cenográfico e simbólico.