terça-feira, dezembro 01, 2009

Nos bastidores de um muro

Esta é uma versão editada de um texto publicado a 28 de Novembro no DN com o título ‘Um muro que fez história há 30 anos’.

A história por trás de The Wall está longe de ser pacífica, de resto correspondendo a um período de agitadas convulsões internas entre o grupo (financeiras e pessoais), encetando um processo que culminaria com a saída do próprio Roger Waters poucos anos depois. A génese da ideia surge na sequência de um incidente no concerto final da digressão que se seguira à edição do anterior Animals (de 1977). Enervado pelo comportamento da multidão, Roger Waters deu por si a cuspir sobre um espectador da primeira fila. Incomodado pela sua própria atitude, o músico começou então a imaginar um disco conceptual que expressasse a noção da construção de barreiras não apenas entre músico e público, mas entre os seres humanos em geral.
Nos meses seguintes, ao mesmo tempo que David Gilmour e Richard Wright lançavam os seus primeiros discos a solo, Roger Waters trabalhou, por si, duas novas ideias que, depois, apresentou ao grupo para delas escolher qual seria o próximo álbum dos Pink Floyd. Uma das ideias corresponde ao que, cinco anos depois, seria o seu álbum a solo The Pros And Cons Of Hitch Hiking. A outra, com o título de trabalho Bricks In The Wall, representava o desenvolvimento da ideia nascida depois do "caso" em palco de finais de 1977. E foi o escolhido.
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As canções revelavam desde logo uma personagem central para a história que se ia contar. Chamava-se Pink, desenhado como projecção de traços do próprio Roger Waters . Pink é uma alma assombrada pela presença de uma mãe sobreprotectora, magoada por professores opressivos, cada um dos seus problemas representando mais um tijolo que junta ao muro que o vai isolando. Pink é também um músico atormentado, com história de infidelidades e drogas. E, como se sente pelo jogo de afinidades na letra de Nobody Home, chama pontualmente à sua caracterização a figura de Syd Barrett.
A gravação de The Wall não foi um mar de tranquilidades. Pelo contrário, acentuou os focos de desentendimento entre os elementos do grupo que, já na digressão de 1977, começavam a dar sinais de convívio difícil. O próprio teclista, Richard Wright, chegou a abandonar o grupo a meio das sessões de gravação, surgindo como músico contratado na digressão que se seguiu ao lançamento do disco (retomando o estatuto de membro oficial do grupo oito anos mais tarde, na hora de partir novamente para a estrada, dessa vez para acompanhar a edição de A Momentary lapse Of Reason).