Vivien Leigh, olhos nos olhos com Clark Gable. Passados 70 anos, que resta de E Tudo o Vento Levou? Um verdadeiro épico e... uma nova edição em DVD — este texto foi publicado no Diário de Notícias (19 de Dezembro), com o título 'Memórias da idade de ouro'.
Curiosíssimo pormenor a descobrir nos extras da edição em DVD/Blu-ray de E Tudo o Vento Levou: o trailer com que o filme foi lançado, em 1939, não inclui uma única imagem do filme. Vemos apenas uma mão a folhear um álbum de aguarelas que sugerem alguns ambientes, com títulos que destacam o romance de Margaret Mitchell e, em particular, as personagens de Rhett Butler e Scarlett O’Hara e os respectivos intérpretes, Clark Gable e Vivien Leigh.
Setenta anos depois, esta é, de facto, uma edição que nos ajuda a perceber um pouco como mudaram os modos de percepção do cinema e, mais especificamente, o seu imaginário comercial e artístico. Hoje em dia, há trailers de filmes que, literalmente, expõem momentos que, em princípio, deveriam funcionar como revelações (veja-se o caso do recente Lua Nova, da saga Twilight, e o modo como nele são dadas a ver muitas peripécias que cortam eventuais efeitos de surpresa). E Tudo o Vento Levou provém de um contexto em que o cinema era, de facto, o núcleo do espectáculo popular. Mais do que isso: ir ao cinema era uma prática colectiva de descoberta, não a “confirmação” de informações mil vezes repetidas por campanhas estereotipadas ou pelos videos virais da Internet (será preciso recordar que, em 1939, não existia Internet?).
O valor essencial da edição é... o próprio filme. A reconversão digital para Blu-ray está feita com verdadeiro espírito de cinemateca e consegue preservar as maravilhas do Technicolor original, postas em causa em 1967 através de um relançamento em cópias de 70 mm que, além do mais, apresentavam uma proporção de fotograma que não podia deixar de amputar o “quadrado” do original. Ironicamente, só com as primeiras edições em cassetes VHS e, mais tarde, em DVD, E Tudo o Vento Levou voltou a ser mostrado nas correctas proporções de imagem.
Agora, o filme pode ser visto também com o comentário, sucinto e didáctico, do historiador Rudy Behlmer. No segundo disco da edição, além dos trailers de várias épocas, os extras incluem um depoimento de Olivia de Havilland e actualidades de 1939 e 1961 (no centenário da Guerra Civil) sobre as sessões de gala em Atlanta. Mas são os documentários que dominam: nada mais nada menos que três, incluindo um narrado por Kenneth Branagh, expandindo a sua evocação à produção de 1939, “o mais grandioso ano de Hollywood”. Há ainda um telefilme, Moviola: The Scarlett O’Hara War (1980), de John Erman, sobre a procura, pelo produtor David O. Selznick, da actriz para interpretar Scarlett (com Tony Curtis e Morgan Brittany nos papéis de Selznick e Vivien Leigh).
Por um lado, será inevitável experimentar um sentimento de nostalgia perante os sinais exuberantes daquela que foi, de facto, a idade de ouro de Hollywood (a edição inclui mesmo uma preciosa reprodução do programa original, distribuído nas salas). Por outro lado, este enquadramento histórico e a excelência do Blu-ray transformam E Tudo o Vento Levou num renovado objecto de sedução e fascínio.
Curiosíssimo pormenor a descobrir nos extras da edição em DVD/Blu-ray de E Tudo o Vento Levou: o trailer com que o filme foi lançado, em 1939, não inclui uma única imagem do filme. Vemos apenas uma mão a folhear um álbum de aguarelas que sugerem alguns ambientes, com títulos que destacam o romance de Margaret Mitchell e, em particular, as personagens de Rhett Butler e Scarlett O’Hara e os respectivos intérpretes, Clark Gable e Vivien Leigh.
Setenta anos depois, esta é, de facto, uma edição que nos ajuda a perceber um pouco como mudaram os modos de percepção do cinema e, mais especificamente, o seu imaginário comercial e artístico. Hoje em dia, há trailers de filmes que, literalmente, expõem momentos que, em princípio, deveriam funcionar como revelações (veja-se o caso do recente Lua Nova, da saga Twilight, e o modo como nele são dadas a ver muitas peripécias que cortam eventuais efeitos de surpresa). E Tudo o Vento Levou provém de um contexto em que o cinema era, de facto, o núcleo do espectáculo popular. Mais do que isso: ir ao cinema era uma prática colectiva de descoberta, não a “confirmação” de informações mil vezes repetidas por campanhas estereotipadas ou pelos videos virais da Internet (será preciso recordar que, em 1939, não existia Internet?).
O valor essencial da edição é... o próprio filme. A reconversão digital para Blu-ray está feita com verdadeiro espírito de cinemateca e consegue preservar as maravilhas do Technicolor original, postas em causa em 1967 através de um relançamento em cópias de 70 mm que, além do mais, apresentavam uma proporção de fotograma que não podia deixar de amputar o “quadrado” do original. Ironicamente, só com as primeiras edições em cassetes VHS e, mais tarde, em DVD, E Tudo o Vento Levou voltou a ser mostrado nas correctas proporções de imagem.
Agora, o filme pode ser visto também com o comentário, sucinto e didáctico, do historiador Rudy Behlmer. No segundo disco da edição, além dos trailers de várias épocas, os extras incluem um depoimento de Olivia de Havilland e actualidades de 1939 e 1961 (no centenário da Guerra Civil) sobre as sessões de gala em Atlanta. Mas são os documentários que dominam: nada mais nada menos que três, incluindo um narrado por Kenneth Branagh, expandindo a sua evocação à produção de 1939, “o mais grandioso ano de Hollywood”. Há ainda um telefilme, Moviola: The Scarlett O’Hara War (1980), de John Erman, sobre a procura, pelo produtor David O. Selznick, da actriz para interpretar Scarlett (com Tony Curtis e Morgan Brittany nos papéis de Selznick e Vivien Leigh).
Por um lado, será inevitável experimentar um sentimento de nostalgia perante os sinais exuberantes daquela que foi, de facto, a idade de ouro de Hollywood (a edição inclui mesmo uma preciosa reprodução do programa original, distribuído nas salas). Por outro lado, este enquadramento histórico e a excelência do Blu-ray transformam E Tudo o Vento Levou num renovado objecto de sedução e fascínio.