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Trata-se, isso sim, de estabelecer uma linha de demarcação. De facto, uma coisa é a existência de um público infantil, obviamente importante no plano cultural e também, importa dizê-lo sem qualquer preconceito, enquanto factor económico. Outra coisa bem diferente é o generalizado triunfo de um “infantilismo” do marketing e da imagem pública do cinema cujo efeito primordial é a secundarização de todos os filmes que se distingam pela gravidade própria de uma visão adulta.
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Aliás, a simples existência de um filme como State of Play filme contraria também esse grosseiro lugar-comum (não poucas vezes favorecido pelo jornalismo mais medíocre) segundo o qual o cinema americano são... “explosões” e “efeitos especiais”. A sua permanência decorre da simples incapacidade de olhar para a diversidade dos filmes, das histórias e dos estilos. Seja como for, vale a pena insistir no facto de a dimensão social e as componentes políticas serem factores nada acidentais na história de Hollywood, mas sim inerentes a todos os seus conceitos de narrativa e espectáculo (ou será que alguém pensa que E Tudo o Vento Levou é um manual técnico sobre a apanha do algodão?)
State of Play é mesmo um exemplo modelar de um cinema que se mantém fiel a valores de observação e crítica social que nos remetem para a nobre tradição dos thrillers políticos da década de 70. Nessa época, pela acção conjunta de diversos factores, desde a guerra do Vietname ao escândalo Watergate, o melhor cinema americano deu mostras de uma notável capacidade de dar conta do presente made in USA. O caso de All the President's Men/Os Homens do Presidente (1976), de Alan J. Pakula, com Dustin Hoffman e Robert Redford, é esclarecedor: abordando, precisamente, o Watergate, o cinema americano mantinha uma relação directa e empenhada com as convulsões do seu país e, mais do que isso, com as suas feridas mais dolorosas e perturbantes. A diferença não está nos filmes, mas nos valores de consumo: nessa altura, o mercado não tinha medo de ser adulto.