Jon Stewart continua a ser um caso exemplar de um humor televisivo genuinamente político: com Bush e, agora, com Obama — este texto foi publicado no Diário de Notícias (3 de Maio), com o título 'As lições políticas de Jon Stewart'.
Desde Herman José até Os Contemporâneos, são vários os exemplos que nos permitem perceber que o género humorístico, em particular na televisão, tem mantido uma energia contagiante no Portugal pós-25 de Abril. Apesar disso, continua a existir uma mitologia simplista segundo a qual o humor se dá melhor (seria até mais “fácil”) em tempos de algum bloqueio criativo. E surge sempre o exemplo fatídico: o teatro de revista terá tido o seu período áureo quando teve que lidar com a censura oficial, nos tempos do Estado Novo.
Considero esta última asserção duplamente gratuita. Em primeiro lugar porque, durante largos anos depois de 1974, a revista continuou a ser um espaço de espantosa alegria e invenção, não se tendo dado mal com as condições de liberdade inerentes à vida democrática. Depois, porque analisar os problemas de uma determinada forma de expressão omitindo as condições estruturais da sua produção é um gesto gratuito, tendencialmente demagógico. Para os mais distraídos, recomenda-se uma visita ao Parque Mayer para avaliar o modo como anos e anos de impotência política (que continuam...) reduziram a uma quase ruína aquele que era o núcleo de trabalho de muitos e respeitáveis profissionais.
Vem isto a propósito da (re)descoberta do humor de Jon Stewart depois de George W. Bush, isto é, em plena época de Barack Obama. Também por alguma imprensa dos EUA circulou essa ideia determinista segundo a qual a saída de cena de Bush, personagem preferencial de muitas formas de intervenção humorística, iria implicar uma perda, não apenas da qualidade do humor, mas de temas interessantes. Para desmentir tal ideia, basta acompanhar o que tem acontecido em The Daily Show (entre nós transmitido pela SIC Radical; também disponível no respectivo site oficial).
Para além da qualidade de escrita do programa de Stewart, obviamente apoiada numa talentosa galeria de argumentistas, há em The Daily Show uma abertura à actualidade que, à boa maneira americana, recusa isolar o mundo do espectáculo dos outros espaços da vida colectiva. Para nos ficarmos por exemplos recentes, lembremos que, entre os convidados do programa, surgiram Nancy Pelosi [foto à direita], presidente da Câmara dos Representantes, e o actor Hugh Jackman [foto à esquerda]. Seja como for, o essencial joga-se sempre através da capacidade de enfrentar aquilo que, na vida social (e, muito em particular, na paisagem televisiva) tenta limitar a simples liberdade de olhar e compreender a pluralidade dos eventos.
Não por acaso, Stewart tem visado com especial contundência os discursos catastrofistas difundidos pela Fox News, lembrando-lhes, entre outras coisas, a necessidade de aprender a viver num lugar que ele, apoiante de Obama, bem conhece: a oposição. Em todo o caso, não se pense que as actividades da Casa Branca se tornaram tabu em The Daily Show. Não só Obama tem sido várias vezes visado (sem esquecer o tema irresistível do cão presidencial...), como, em particular nas entrevistas, Stewart sabe adoptar o discurso do cidadão comum que quer perceber o que está realmente a acontecer com os dinheiros do seu país. Para quem ainda duvidasse que o humor é sempre político, vale a pena ver The Daily Show.
Desde Herman José até Os Contemporâneos, são vários os exemplos que nos permitem perceber que o género humorístico, em particular na televisão, tem mantido uma energia contagiante no Portugal pós-25 de Abril. Apesar disso, continua a existir uma mitologia simplista segundo a qual o humor se dá melhor (seria até mais “fácil”) em tempos de algum bloqueio criativo. E surge sempre o exemplo fatídico: o teatro de revista terá tido o seu período áureo quando teve que lidar com a censura oficial, nos tempos do Estado Novo.
Considero esta última asserção duplamente gratuita. Em primeiro lugar porque, durante largos anos depois de 1974, a revista continuou a ser um espaço de espantosa alegria e invenção, não se tendo dado mal com as condições de liberdade inerentes à vida democrática. Depois, porque analisar os problemas de uma determinada forma de expressão omitindo as condições estruturais da sua produção é um gesto gratuito, tendencialmente demagógico. Para os mais distraídos, recomenda-se uma visita ao Parque Mayer para avaliar o modo como anos e anos de impotência política (que continuam...) reduziram a uma quase ruína aquele que era o núcleo de trabalho de muitos e respeitáveis profissionais.
Vem isto a propósito da (re)descoberta do humor de Jon Stewart depois de George W. Bush, isto é, em plena época de Barack Obama. Também por alguma imprensa dos EUA circulou essa ideia determinista segundo a qual a saída de cena de Bush, personagem preferencial de muitas formas de intervenção humorística, iria implicar uma perda, não apenas da qualidade do humor, mas de temas interessantes. Para desmentir tal ideia, basta acompanhar o que tem acontecido em The Daily Show (entre nós transmitido pela SIC Radical; também disponível no respectivo site oficial).
Para além da qualidade de escrita do programa de Stewart, obviamente apoiada numa talentosa galeria de argumentistas, há em The Daily Show uma abertura à actualidade que, à boa maneira americana, recusa isolar o mundo do espectáculo dos outros espaços da vida colectiva. Para nos ficarmos por exemplos recentes, lembremos que, entre os convidados do programa, surgiram Nancy Pelosi [foto à direita], presidente da Câmara dos Representantes, e o actor Hugh Jackman [foto à esquerda]. Seja como for, o essencial joga-se sempre através da capacidade de enfrentar aquilo que, na vida social (e, muito em particular, na paisagem televisiva) tenta limitar a simples liberdade de olhar e compreender a pluralidade dos eventos.
Não por acaso, Stewart tem visado com especial contundência os discursos catastrofistas difundidos pela Fox News, lembrando-lhes, entre outras coisas, a necessidade de aprender a viver num lugar que ele, apoiante de Obama, bem conhece: a oposição. Em todo o caso, não se pense que as actividades da Casa Branca se tornaram tabu em The Daily Show. Não só Obama tem sido várias vezes visado (sem esquecer o tema irresistível do cão presidencial...), como, em particular nas entrevistas, Stewart sabe adoptar o discurso do cidadão comum que quer perceber o que está realmente a acontecer com os dinheiros do seu país. Para quem ainda duvidasse que o humor é sempre político, vale a pena ver The Daily Show.