Já a entrarmos no terço final da 62ª edição do Festival de Cannes, vale a pena sublinhar que tem sido um certame pleno de contrastes fascinantes. E, como se esperava, com vários autores habitués a retomar e reconverter algumas componentes fundamentais dos respectivos universos criativos. Assim aconteceu com Quentin Tarantino, com o muito aguardado Inglourious Basterds, e Michael Haneke, com Das Weisse Band.
O caso de Tarantino é, sem dúvida, o mais espectacular, quanto mais não seja porque ele visa uma reconversão quase surreal do clássico filme de guerra, criando uma espécie de ficção em segundo grau que, momento a momento, vai problematizando a própria possibilidade de convocar referências exteriores ao universo em que se move. Vale a pena dizer, a esse propósito, que Inglourious Basterds até consegue integrar na sua banda sonora uma canção como Putting Out the Fire, de David Bowie, originalmente pertencente ao filme Cat People (1982), de Paul Schrader -- convenhamos que ouvir Bowie numa cena de Paris, durante a ocupação nazi, tem tanto de impossível como de irresistível...
Quanto a Haneke, filma desta vez o ambiente de uma pequena comunidade rural nos tempos que antecedem a eclosão da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Rodado num preto e branco austero e envolvente, Das Weisse Band é mais um caso exemplar do labor de um cineasta que não se cansa de problematizar e interrogar os fantasmas da história alemã.