Bandas locais, como os Inspiral Carpets ou Happy Mondays, já reflectiam desde há algum tempo esta procura de festa dançante em clima rock'n'roll. Contudo, e apesar da enorme visibilidade que tiveram pouco tempo depois, já nos primeiros anos de 90, os verdadeiros líderes da nova mensagem foram os Stone Roses. Já editavam singles desde 1985. Encantaram tudo e todos ao som dançante de, primeiro, Elephant Stone (ainda em 1988) e mais tarde Fools Gold (já em 1989). Mas no mesmo ano entraram para a história dos autores dos melhores discos de estreia de todos os tempos com um álbum (que deixava fora do alinhamento estes dois singles) onde se inventava o futuro através de uma inteligente revisitação de memórias. Em concreto, juntando a nova atitude luminosa, festiva e despreocupada a um reencontro com tradições antigas da pop britânica, recordando os dias do rock psicadélico, em finais dos anos 60. O disco de estreia dos Stone Roses foi lançado por alturas da chegada da Primavera de 1989. Não foi o que mais ostensivamente contribuiu para o cruzar de ingredientes que gerou o som a que se veio a chamar "Madcherster" que então ganhou adeptos à escala global. Mas foi a banda sonora de referência para uma atitude que definiu a forma como a pop e os seus seguidores entraram então nos anos 90.
A década de 80 assistiu à explosão da pop electrónica, à revolução de costumes que deu protagonismo à música de dança fora das pistas das discotecas, à emergência definitiva do hip hop como uma nova força da música popular urbana. Mas foi ao som de um reencontro com o passado que se definiu o último grande movimento da década em solo britânico. Um movimento que procurava na memória das tradições pop de finais de 60 os ingredientes para uma nova linguagem luminosa, festiva e despreocupada. E que teve no álbum de estreia dos Stone Roses o seu disco de referência.
Na verdade, Stone Roses (Silvertone, 1989) é o mais atípico dos discos que acabaram associados ao chamado "Madchester", a ligação estabelecendo-se mais pela geografia (o facto da banda ser de Manchester) e pela atitude em palco, tranquila e descontraída, dos elementos do grupo. Mas não foi por acaso que este disco se destacou entre os demais, chegando a conhecer junto da imprensa musical um raro tom de aclamação quase unânime. Produzido por John Leckie, Stone Roses apresentava uma colecção de canções de melodismo clássico, plenas de referências a modelos que fizeram escola em finais dos anos 60, chegando inclusivamente a recorrer (como se escuta em Don't Stop) a técnicas então em voga na época, como a utilização de bobinas rebobinadas como cenário para uma canção. A capa, que usava no fundo uma pintura do guitarrista John Squire, colocou também este disco entre a lista dos "casos" de referência do design ao serviço da música pop.
Roupas largas, chapéus de abas, o gosto pela festa, foram imagem de marca que os admiradores da banda adoptaram. Ficaram hinos, como Made Of Stone ou She Bangs The Drums... Toda uma aclamação que mesmo assim não salvou o desmoronar de uma carreira que, na verdade, não teve outro episódio deste calibre. E que nos daria apenas um segundo álbum em 1994, uma sombra deste disco editado há 20 anos.
PS. Versão editada de textos publicados no DN a 3 de Abril, num dossier sobre os 20 anos do álbum de estreia dos Stone Roses