Concluímos hoje a publicação de uma entrevista com o compositor britânico Ambrose Field, que serviu de base a um artigo publicado no DN a 27 de Março. A conversa tem como ponto de partida o álbum Being Dufay, que acaba de ser editado no catálogo da ECM e no qual texturas electrónicas envolvem e dão novo corpo a canções e motetes de Guillaume Dufay, um compositor do século XV. Na imagem vemos Ambrose Field (à direita), junto ao tenor John Potter, que também participa neste disco, em plena apresentação ao vivo desta música, acompanhada por projecções.
Porque optou por Guillaume Dufay, e não outro entre os seus contemporâneos, como ponto de partida para esta obra?
Escolhi Dufay porque foi um verdadeiro inovador. Conseguiu ligar ideias de estilo musical e cultura de uma forma que mais nenhum dos seus contemporâneos atingiu. E desenvolveu uma série de técnicas para poder abordar material pré-existente. Era por isso o “candidato” ideal. Ainda por cima as linhas vocais da sua música são extremamente belas, partilhando em comum algumas características com a construção da música popular contemporânea.
Trouxe a música de Guillaume Dufay para um outro tempo e lugar, integrando-a depois na sua própria música. Como fez esse jogo de espaços?
A música de Dufay existe num espaço acústico no disco, permitindo ao ouvinte usar a sua imaginação projectando um tempo, um espaço. Essa resposta individual é muito importante para mim. Para mim, de resto, a música deve ser uma experiência pessoal.
Como é que este disco o faz pensar sobre a relação que a arte do presente pode ter com a memória?
Há aqui uma característica importante, que é o facto de Being Dufay não se comprometer com questões de estilo. Nenhum género se curva perante outro... Há aqui dois tipos de música que, na verdade, correm lado a lado, em paralelo.
Este disco é a porta para outras incursões suas pela música vocal?
Estou a trabalhar num novo conceito entusiasmante neste momento...
Porque escolheu o tenor John Potter para gravar consigo este disco?
Trabalhei com o John [Potter] pela primeira vez há já algum tempo num trabalho que me foi pedido para um festival em Vigeviano, em Itália. Mais tarde, essa peça que apresentámos teve uma resposta fantástica depois de ter ser transmitida pela BBC. E então resolvi desenvolver as ideias que nos levaram até este disco.
Philip Glass uma vez disse que havia quem gostasse da sua música porque era clássica e quem gostase porque não era clássica. O que nos mostra, no que tem assinado como compositor, não está longe desta visão dele... Como se sente nesta terra de ninguém entre a música clássica e a música popular?
Glass acertou aí! Não importa qual é o rótulo que nos querem dar. Para muitos, porque não nos comprometemos ou não alteramos os originais, isto pode ser música antiga... Para outros, pode ser música popular. Não importa qual a escolha final... Digamos antes, e apenas, música. E deixemos que o ouvinte decida depois...
Que desafios enfrenta hoje a música electrónica?
O de ser único.
Como se relaciona, em si, o compositor e o professor de música?
O que faço hoje em dia é, acima de tudo, trabalho de composição. Quando ensino [composição] tento depois ajudar as pessoas a encontrar a sua própria voz, o seu próprio estilo. E levar cada um a fazer a sua contribuição individual. Essa é que é a questão! A música não precisa ser replicada. Precisamos de inovação e isso só acontecerá se soubermos apoiar as pessoas, possibilitando que concretizem as suas ideias. Que façam a sua música!