segunda-feira, março 30, 2009

Em conversa: Ambrose Field (1/2)

Iniciamos hoje a publicação de uma entrevista com o compositor britânico Ambrose Field, que serviu de base a um artigo publicado no DN a 27 de Março. A conversa tem como ponto de partida o álbum Being Dufay, que acaba de ser editado no catálogo da ECM e no qual texturas electrónicas envolvem e dão novo corpo a canções e motetes de Guillaume Dufay, um compositor do século XV. Na imagem vemos Ambrose Field (à esquerda), junto ao tenor John Potter, que também participa neste disco.

Como e quando é que a música electrónica chamou a sua atenção?
Creio que deve ter acontecido, em algum ponto, algures nos anos 70, ouvindo discos de bandas como os Pink Floyd e outros nomes do rock progressivo. E também a música de nomes como os Kraftwerk, Brian Eno, Talking Heads. Junto a estes nomes da música popular o que chamava a minha atenção era a forma como a sua utilização das electrónicas amplificava as suas possibilidades musicais, investigando novas áreas. E ainda hoje gosto de descobrir o invulgar... Ao mesmo tempo ouvia também compositores como Toru Takemitsu, Karlheinz Stockhausen ou Arvo Pärt. E nestes, os seus mundos acústicos eram soberbos, detalhados e subtis.

Além de compositor, hoje é um académico. Estudou e ensina música... O que o levou a querer estudar música?
A música permite-nos estabelecer ligações com a personalidade das outras pessoas e eu queria explorar isso mesmo. A dada altura pensei em ser chef, mas não era capaz de cortar os legumes suficientemente depressa...

Como é que descobriu um compositor em si? Teve de contrariar o que aprendeu como estudante para se afirmar depois com uma linguagem própria?
Nunca aprendi a compor, embora as pessoas fossem gostando do que ia criando, sugerindo-me que continuassem, que fizesse mais peças. Para mim a compoisção é uma resposta à cultura a que estamos expostos, ou seja, ao mundo em que vivemos. E nenhum estilo em particular é capaz de traduzir tudo o que existe.

Que referências na música electrónica mais contribuíram para o processo de procura de uma linguagem musical própria?
Não sei se esta obra [o álbum Being Dufay], em particular, revele influências concretas. Creio que sempre gostei de ouvir os mais distintos e variados estilos de música. Tantos quantos pudesse encontrar! A noção de género musical não tem, nunca teve, uma grande importância para mim. O que, assim sendo, me deixa livre para poder fazer explorações sobre o timbre e também sobre o espaço.

A sua música revela um claro interesse pela exploração de texturas. Como pesa a distribuição da melodia e das texturas quando está a compor?
A melodia tem um peso enorme na música. Assim como têm relevo os demais elementos de uma composição. A música em Being Dufay tem muito a ver com a exploração de uma ideia de totalidade, ou seja, nenhum elemento tem mais importância que outro. Esse ponto de partida abre o leque da liberdade de exploração nos mais variados sentidos, pelo timbre, pelo espaço...
(conclui amanhã)