Depois de várias reflexões suscitadas pela campanha de lançamento de Second Life, é tempo de abordar o filme — este texto foi publicado no Diário de Notícias (29 de Janeiro), com o título 'Um filme sem dimensão humana'.
Infelizmente, repete-se com Second Life uma situação que, ao longo de décadas, tem marcado muitos filmes portugueses. O seu lançamento contribuiu para instalar um clima de conflito primário (em especial na Net) que nada tem a ver com o confronto de ideias. E quando o produtor Alexandre Valente fala em “revolucionar o panorama do cinema português” está, porventura com alguma ingenuidade, a criar problemas a si próprio.
De facto, quatro décadas passadas sobre a revolução sexual dos anos 60 (37 anos depois de O Último Tango em Paris), só por profundo logro simbólico se poderá pensar que há alguma “ousadia” em meia dúzia de planos anódinos de nus femininos. Qualquer melodrama (muito vestido) feito por Douglas Sirk na década de 50 envolve mais risco e perturbação.
Por perverso paradoxo, a história de Second Life — um homem que morre e “sobrevive” para a segunda vida a que se refere o título — está longe de aplicar um modelo simples. Na sua estrutura não linear, remete mesmo para as experiências mais ousadas (essas sim) do cinema dos anos 60, nomeadamente para clássicos de Alain Resnais como O Último Ano em Marienbad. Mas não são os modelos que fazem os filmes: Second Life é uma penosa colecção de cenas desgarradas, praticando todos os pecados (tempo dilatado, diálogos pesadamente “literários”, cenas sem motivação dramática) que o senso comum mais ignorante tende a atribuir ao cinema português “intelectual”.
Tudo isto é tanto mais triste quanto Second Life, desde a fotografia (Acácio de Almeida) à música (Bernardo Sassetti), revela um simples mérito de produtor: saber reunir profissionais com talento. Não basta, como é óbvio. Como não basta ir buscar nomes da televisão que, além de não serem capazes de inscrever no ecrã a mais discreta chispa de representação, nunca são objecto de qualquer verdadeiro trabalho de direcção. É a coisa mais penosa em qualquer filme: sentir que quem representa (vestido ou despido) está reduzido a uma função pobremente decorativa, sem dimensão humana.
Infelizmente, repete-se com Second Life uma situação que, ao longo de décadas, tem marcado muitos filmes portugueses. O seu lançamento contribuiu para instalar um clima de conflito primário (em especial na Net) que nada tem a ver com o confronto de ideias. E quando o produtor Alexandre Valente fala em “revolucionar o panorama do cinema português” está, porventura com alguma ingenuidade, a criar problemas a si próprio.
De facto, quatro décadas passadas sobre a revolução sexual dos anos 60 (37 anos depois de O Último Tango em Paris), só por profundo logro simbólico se poderá pensar que há alguma “ousadia” em meia dúzia de planos anódinos de nus femininos. Qualquer melodrama (muito vestido) feito por Douglas Sirk na década de 50 envolve mais risco e perturbação.
Por perverso paradoxo, a história de Second Life — um homem que morre e “sobrevive” para a segunda vida a que se refere o título — está longe de aplicar um modelo simples. Na sua estrutura não linear, remete mesmo para as experiências mais ousadas (essas sim) do cinema dos anos 60, nomeadamente para clássicos de Alain Resnais como O Último Ano em Marienbad. Mas não são os modelos que fazem os filmes: Second Life é uma penosa colecção de cenas desgarradas, praticando todos os pecados (tempo dilatado, diálogos pesadamente “literários”, cenas sem motivação dramática) que o senso comum mais ignorante tende a atribuir ao cinema português “intelectual”.
Tudo isto é tanto mais triste quanto Second Life, desde a fotografia (Acácio de Almeida) à música (Bernardo Sassetti), revela um simples mérito de produtor: saber reunir profissionais com talento. Não basta, como é óbvio. Como não basta ir buscar nomes da televisão que, além de não serem capazes de inscrever no ecrã a mais discreta chispa de representação, nunca são objecto de qualquer verdadeiro trabalho de direcção. É a coisa mais penosa em qualquer filme: sentir que quem representa (vestido ou despido) está reduzido a uma função pobremente decorativa, sem dimensão humana.