Em televisão, que significa apresentar filmes com avisos de "cenas eventualmente chocantes"? Quando é que a pedagogia redunda em infantilização colectiva? — este texto foi publicado no Diário de Notícias (12 de Dezembro), com o título 'Bolinhas vermelhas'.
Há dias, numa madrugada da RTP, por volta da uma hora, deparei com o filme Imperdoável (1992), de Clint Eastwood (em todo o caso, terá acabado pelas três horas). Surgia com uma bolinha vermelha no canto superior direito do ecrã, desse modo avisando os espectadores da existência de cenas susceptíveis de ferir algumas sensibilidades.
Já várias vezes escrevi sobre o absurdo desta situação. Numa altura do dia (aliás, da noite) em que é suposto existir uma audiência exclusivamente adulta, sinalizar os filmes deste modo corresponde a infantilizar os espectadores de forma primária e alarmista. Afinal de contas, a televisão não tem que adoptar qualquer atitude paternalista face a esses mesmos espectadores: é mesmo suposto que cada um deles se assuma como indivíduo responsável; e quem se possa sentir de algum modo distante, ou mesmo chocado, tem toda a liberdade para não assistir.
Bem sei que os meus protestos não têm fundamento legal. Que é como quem diz: a RTP e os outros canais limitam-se a cumprir um dispositivo que obriga a sinalizar deste modo os espectáculos classificados para maiores de 16 anos (ou classificação superior). Talvez seja altura de repensar tal dispositivo. Acima de tudo, talvez valha a pena discutir esta muito portuguesa indiferença política que, desde o triunfo do Big Brother, fecha os olhos aos horrores que pululam em horário nobre, enquanto se alarma com a passagem de Clint Eastwood pela madrugada dentro (por irónica coincidência, desde ontem [dia 11] objecto de uma importante retrospectiva na Cinemateca Portuguesa).
Ninguém está a defender a censura para o horário nobre seja de quem for: a televisão não muda por processos de interdição, mas sim através de diferentes políticas culturais e económicas. Trata-se apenas de, ao menos, deixarem o pobre cidadão português ser adulto depois da meia noite. Deixem-no escolher. Deixem-no aceitar e recusar, gostar apaixonadamente ou indignar-se furiosamente. Deixem-no aprender a própria responsabilidade de olhar e assumir as consequências do seu olhar. Deixem-no ser chefe de família e decidir. Bem ou mal, mas deixem-no pensar.
Há dias, numa madrugada da RTP, por volta da uma hora, deparei com o filme Imperdoável (1992), de Clint Eastwood (em todo o caso, terá acabado pelas três horas). Surgia com uma bolinha vermelha no canto superior direito do ecrã, desse modo avisando os espectadores da existência de cenas susceptíveis de ferir algumas sensibilidades.
Já várias vezes escrevi sobre o absurdo desta situação. Numa altura do dia (aliás, da noite) em que é suposto existir uma audiência exclusivamente adulta, sinalizar os filmes deste modo corresponde a infantilizar os espectadores de forma primária e alarmista. Afinal de contas, a televisão não tem que adoptar qualquer atitude paternalista face a esses mesmos espectadores: é mesmo suposto que cada um deles se assuma como indivíduo responsável; e quem se possa sentir de algum modo distante, ou mesmo chocado, tem toda a liberdade para não assistir.
Bem sei que os meus protestos não têm fundamento legal. Que é como quem diz: a RTP e os outros canais limitam-se a cumprir um dispositivo que obriga a sinalizar deste modo os espectáculos classificados para maiores de 16 anos (ou classificação superior). Talvez seja altura de repensar tal dispositivo. Acima de tudo, talvez valha a pena discutir esta muito portuguesa indiferença política que, desde o triunfo do Big Brother, fecha os olhos aos horrores que pululam em horário nobre, enquanto se alarma com a passagem de Clint Eastwood pela madrugada dentro (por irónica coincidência, desde ontem [dia 11] objecto de uma importante retrospectiva na Cinemateca Portuguesa).
Ninguém está a defender a censura para o horário nobre seja de quem for: a televisão não muda por processos de interdição, mas sim através de diferentes políticas culturais e económicas. Trata-se apenas de, ao menos, deixarem o pobre cidadão português ser adulto depois da meia noite. Deixem-no escolher. Deixem-no aceitar e recusar, gostar apaixonadamente ou indignar-se furiosamente. Deixem-no aprender a própria responsabilidade de olhar e assumir as consequências do seu olhar. Deixem-no ser chefe de família e decidir. Bem ou mal, mas deixem-no pensar.