Há ideias que só o tempo acaba por reconhecer como proféticas. Em 1892, o compositor checo Antonin Dvorák (1841-1901) chegou a Nova Iorque para, durante três anos, dirigir o National Conservatory Of Music. Dos primeiros contactos com o “novo mundo” nasceu um grande interesse por novas músicas que aí escutou pela primeira vez: a chamada música nativa (dos povos índios) e as expressões populares da música negra. Esta última arrebatou-o, ao ponto de ter então declarado: “estou convencido que a música do futuro neste país tem de ser encontrada no que chamamos as melodias dos negros. Estas podem ser a fundação de uma escola de composição original a desenvolver nos Estados Unidos”. Dvorák não só adivinhava o que poucas décadas depois nasceria das partituras de um Gershwin ou de um Bernstein como, de certa forma, antecipava o que em meados dos anos 50 do século XX se começou a desenhar como o futuro dos caminhos da música popular! No fundo, Dvorák não fazia mais que uma tentativa de aplicação americana das tendências das escolas “nacionalistas” que então ganhavam corpo na Europa, trazendo cada qual à tradição clássica uma multidão de temperos e referências que definiram novos caminhos e vincaram identidades.
A etapa americana da obra de Dvorák ficou registada numa série de obras, a mais emblemática das quais a sua nova sinfonia (com o sub-título Do Novo Mundo), estreada em 1893, perante entusiasmada aclamação, no Carnegie Hall. Ao longo dos anos vários musicólogos têm abordado a obra, nela encontrando não apenas traços das culturas locais que então entusiasmaram o compositor. Na verdade, a sinfonia quase parece um retrato do sentido cosmopolita e multicultural da Nova Iorque que Dvorák tomou como ponto de partida para a sua descoberta da América. Bernstein sublinhou mesmo uma identidade multinacional nesta obra que tanto ecoa a música dos escravos (recentemente libertos), marcas da cultura nativa, as linguagens sinfónicas da época e, também, ecos da sua própria identidade checa.
A 9ª Sinfonia de Dvorák acaba de regressar aos escaparates numa nova gravação pela Naïve Records, com a La Chambre Philarmonique, dirigida por Emmanuel Krivine. O disco inclui ainda o Konzertstück Op 86 de Schumann.