sexta-feira, outubro 17, 2008

Em conversa: Ry Cooder (3/3)

Concluímos hoje a publicação de uma entrevista com Ry Cooder, que serviu de base a um artigo sobre o Buena Vista Social Club publicado a 12 de Outubro no DN.

Foi importante trazer Wim Wenders a bordo desta aventura e fazer o filme sobre o Buena Vista Social Club?
O Wim Wenders filma muito bem. Ele sabe como colocar uma câmara. Sabe que, um mau enquadramento perde tudo. Sabe também fazer com que as pessoas gostem de falar. Bom, não é difícil por cubanos a falar... São muito expressivos. Ele fez um trabalho notável. E mostrou, com realismo, ao mundo, o que se passava. O mundo gostou, reagiu, quis saber mais, e comprou os discos.

Tinha já colaborado com Wim Wenders em Paris, Texas. Mas esse foi, certamente, um trabalho muito diferente...
Claro. Esse era uma ficção e este era um documentário... Mas todos os trabalhos são diferentes. Cada vez que nos sentamos para trabalhar é diferente.

Recentemente abordou espaços de cultura latina em Los Angeles na trilogia que começou com Chávez Ravine. A música latina é um velho interesse seu?
Sempre gostei de música latina. Los Angeles tem uma população mexicana muito significativa e isso sempre me interessou desde miúdo. E há até uma influência de Cuba na cultura mexicana, porque era muito popular nos anos 40. Posso dizer que, vindo de Los Angeles, sabia um pouco ao que ia... Mas, claro, Los Angeles é uma coisa e Havana é outra!

A trilogia que iniciou nesse álbum tem uma carga narrativa muito evidente. Gostaria de a levar a cinema?
Não será tão fácil. Em primeiro lugar não se pode recriar um passado que desapareceu... Mas gosto de rádio, porque nos dá espaço para a imaginação. E o cinema não quer fazer filmes destes... Querem filmes idiotas com violência ou filmes idiotas sobre alcoólicos em recuperação... Faço o que faço... É o que sei fazer. Não sei durante quanto tempo, porque não sei por quanto tempo haverá ainda uma indústria discográfica. A Nonesuch tem feito, contudo, um belo trabalho.

A Nonescuch será uma das últimas editoras a colocar a música acima do negócio? Bom, na verdade também têm de fazer negócio...
Têm de o fazer. Mas tentam fazer um bom trabalho. Só não sei por quanto tempo o poderão fazer... Temos de aceitar o mundo como ele é...

Acredita numa outra vida para a música gravada, através da Internet?
Conheço quem o faço, mas a mim não me interessa. Sei que aparecerão novos métodos de transacção... Mas eu gosto de rádio e de ir a lojas comprar discos. Não o consigo evitar! O vinil está a regressar!

Este disco fecha o ciclo Buena Vista Social Club?
Sim, pelo menos para mim fecha. O que mais poderemos fazer? Podemos ouvir esta gente num palco, juntos, numa explosão de sensações. Mas não há sequela possível. Não posso imaginar o que mais fazer.

Recorda-se desta viagem dos músicos a Nova Iorque?
Lembro-me, sim. Lembro-me deles estarem tão excitados e felizes! Sentia-se que tínhamos feito algo bem feito. Havia uma sensação de realização que não era aquela de apenas mais um concerto.

Quais são as melhores memórias que guarda deste concerto?
Todas as histórias... Mas sobretudo o estar em palco. Não sabíamos se ia se bom, se alguém se ia esquecer de uma palavra, se ia desafinar... Havia algum sentido dramático. Mas depois ver o público a levantar-se e a aproximar-se dos músicos. A entrar em sintonia... Esse momento foi especial. Foi aí que verificámos que o público estava com aquela música. Foi maravilhoso.

Foi uma estreia para muitos daqueles músicos!
E era o Carnegie Hall, o que fazia toda a diferença.

Os músicos conheciam o Carnegie Hall?
Toda a gente conhece o Carnegie Hall! Foi uma ideia do Compay Segundo, que perguntou a dada altura quando é que iríamos tocar no Carnegie Hall. É um lugar mítico. É simbólico e significa muito... Todos os músicos o conhecem.