Concluímos hoje a publicação de uma entrevista com Geoff Barrow, dos Portishead. Esta conversa serviu de base a dois artigos entretanto já publicados no DN
Consegue ter uma visão profissional, não emocional, sobre a música dos Portishead?
Sou puramente científico. Ou emocional, apenas, pelo melhor ponto de vista... Não me agrada tanto ser tido excessivamente em consideração. Ser referência em excesso.... Gosto mais do modelo dos Can... Mas sem as drogas. Não sou bom com drogas.
Como define o caminho musical que o grupo tomou?
De um ponto de vista pessoal diria que foi uma maneira muito vulgar, mas disfuncional, me sentir no mundo. Tem a ver com uma luta pela comunicação.
O tom sombrio da música de onde vem? Dessa dificuldade em comunicar? Ou do mundo que vos envolve?
Um pouco das duas coisas.
O mundo é hoje mais sombrio que há 14 anos...
Se vivermos no sonho das celebridades não veríamos isso. Mas sim, o mundo real é mais sombrio.
Third será uma banda sonora possível para quem vive o mundo fora dessas luzes das celebridades?
Ficaria feliz se reflectisse algo fora desse mundo. Não sei se será uma banda sonora. Estamos felizes por ver que o disco traduz quem somos e o que queremos.
Como decidem sobre o que falam as canções?
Esse é trabalho da Beth. Eu respondo apenas pelo trabalho musical.
Então como se relaciona a música com as palavras que Beth cria?
Relaciono-me com o que ela escreve muito mais hoje que no passado. Era muito novo quando começámos. E muito focado na música.
Encarava as palavras mais como um som mais que um sentido?
Sim, completamente. Mas hoje sinto que há mais.
Isso fá-lo ouvir, hoje, Dummy ou Portishead de outra maneira?
Faz, sim.
Third é um álbum de detalhe. De contenção. Como decidem o que fica nas canções, às quais parecem ter tirado quase tudo...
É nessa etapa que me perco no trabalho. Gosto da pureza do vinil. Mas também da distorção do vinil. Há uma emoção na distorção. Não acredito que as novas tecnologias de gravação sejam a resposta. Faz com que todos soem ao mesmo.
Como reage perante discos de outros artistas. Consegue esquecer que é um produtor?
Quando escuto música moderna nunca deixo de ser um produtor. Mas quando é música antiga, sou um melómano.
O que entende por música antiga?
Podem ser os Joy Division, os Kraftwerk... Ou o Elvis.
Como acompanha a produção actual?
Tenho uma pequena editora e assino bandas... Por isso escuto de tudo um pouco. Vanguarda, jazz...
Ao ser editor tem a visão do outro lado do negócio...
E que é terrível...
Consegue imaginar o que terá sido, para um editor, assinar uma banda como os Portishead?
Sei que, se fosse hoje nunca teríamos chegado a ser tocados na rádio.
Teria a Internet....
Sim, mas ninguém investiria hoje grandes somas de dinheiro numa banda que não teria grande exposição. E que ninguém iria ouvir... Hoje as pessoas ficam à espera que lhes digam o que ouvir. Veja-se a Amy Winehouse. Dizem que tem uma voz soul incrível... Pode cantar bem... Mas não é uma Aretha Franklin! É uma mulher perturbada e muito estilizada. É um pastiche! Mas ao mesmo tempo temos raparigas que, depois, acabam a descobrir a música soul dos anos 60... E não há nada errado com isso.
Tem memórias do concerto de 1998 no Sudoeste?
Provavelmente... não. Tenho memórias de Portugal, mas de férias que aí passei. Mas sempre tivemos uma boa relação com o público português.