Se fizermos uma pesquisa no Flickr com a palavra "holga" encontramos cerca de 280 mil imagens. Dito de outro modo: a câmara mais "tosca" do mundo (uma espécie de Ed Wood do mundo da fotografia) regressou como um singularíssimo fenómeno de culto ampliado pelos circuitos específicos da Internet -- é disso mesmo que dá conta um interessantíssimo artigo do jornal The Independent, intitulado justamente 'O culto de Holga'.
É certo que a utilização de película de 120 (normalmente um recurso específico de profissionais) numa máquina de muito pobre qualidade óptica (toda ela feita em plástico) foi, desde sempre um paradoxo sem solução, inclusivé conferindo às imagens uma muito típica e reconhecível irregularidade de enquadramento [exemplo em cima]. Mas essa é também uma das origens do charme da Holga, a ponto de se poder dizer que o fetichismo das suas fotografias nasce da "rentabilização" das suas limitações técnicas.
Nascida na China, em finais da década de 1960, visando o gigantesco mercado do proletariado chinês, a ocidentalização da Holga rapidamente gerou um perverso interesse artístico pelas suas "imperfeições", a ponto de se poder dizer que se foi estabelecendo uma "estética-holga", de muito bizarra e também muito intensa sedução. Por exemplo, surgiu mesmo uma solução para adaptação do mais corrente filme de 35 mm, dando origem a fotografias de desconcertante "distanciação", mostrando as perfurações da película [imagem em baixo].
Dir-se-ia que a Holga nos permite reencontrar as delícias (e, apetece dizer, os "ruídos") de uma arte fotográfica pré-digital, anterior à "limpeza" asséptica tantas vezes favorecida pelas novas tecnologias. Este é, afinal, um fenómeno revivalista que contém uma singular reivindicação dos olhares, isto é, um gosto renovado pela sua mais básica liberdade.