quarta-feira, fevereiro 13, 2008

Spielberg diz não a Pequim

Quando faltam 177 dias para a abertura oficial dos Jogos Olímpicos de Pequim, Steven Spielberg abandonou o seu cargo de consultor artístico da organização. De acordo com as notícias divulgadas na noite de terça-feira (BBC), o cineasta de Tubarão, A Lista de Schindler e Munique emitiu uma declaração onde afirma que a China não está a pressionar suficientemente o seu aliado Sudão no sentido de este país pôr fim ao "continuado sofrimento humano" que se prolonga na região do Darfur. Segundo Spielberg, a situação é premente, tendo morrido mais de 200 mil pessoas, elevando-se a dois milhões o número de deslocados: "A minha consciência não me permite continuar a trabalhar como antes."
A decisão de Spielberg surgiu no mesmo dia em que foi promovido um "Dia Global de Acção" a favor do Darfur. A organização dessa jornada entregou uma carta — assinada por vários laureados com o Nobel e antigos atletas olímpicos — na missão da China nas Nações Unidas, lembrando que "todos temos a noção do tremendo potencial da China para ajudar a pôr fim ao conflito do Darfur." A carta foi entregue pelos nadadores olímpicos Shannon Shakespeare e Nikki Dryden, e a actriz Mia Farrow (que já manifestara publicamente o seu desagrado pelo envolvimento de Spielberg com a organização dos Jogos).
Na sua declaração, Spielberg afirma: "Neste momento, o meu tempo e a minha energia devem ser gastos, não em cerimónias olímpicas, mas em fazer tudo o que puder para pôr fim aos indescritíveis crimes contra a humanidade que continuam a ser cometidos no Darfur." E considera ainda: "O governo do Sudão é o principal responsável por estes crimes, mas a comunidade internacional, em particular a China, devia fazer mais."
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Porque a política é feita de gestos, vale a pena confrontar com estas informações todos aqueles que insistem em promover uma imagem simplista de Steven Spielberg (e do cinema americano em geral), reduzindo o seu trabalho e o seu pensamento a um folclore maniqueísta de "dólares" e "efeitos especiais". Não está em causa a legitimidade de, seja quem for, pensar "melhor" ou "pior" do seu cinema — mas uma atitude como esta não pode ser avaliada pela indiferença nem mascarada pelo silêncio.