segunda-feira, janeiro 21, 2008

Discos da semana, 21 de Janeiro

Nestas primeiras semanas de 2008, e enquanto as novas fornadas não chegam aos escaparates, tempo disponível para falar de algumas das últimas edições de 2007. E o álbum hoje em destaque, curiosamente, acabou de ter lançamento entre nós. Trata-se de Night Drive, espantoso depoimento de transformação dos Chromatics, uma banda de Portland (EUA) que, com origens num passado punk, se reinventou no último ano optando por uma radical deslocação de azimutes estéticos para uma paisagem a 180 graus de distância, rumo a uma pop electrónica minimal, contida e... sombria. O fundador Adam Miller (que viveu a etapa punk do grupo) partilha hoje os Chromatics com Johnny Jewel (também membro dos Glass Candy) e a vocalista Ruth Radelet. Juntos concebem em Night Drive uma espécie de filme negro (não é por acaso que o disco tem como subtítulo a designação Original Motion Picture Soundtrack), com acção algures num lugar onde as visões do italo disco de Giorgio Moroder acabaram transformadas numa distopia... O álbum abre com uma referência de tempo, uma voz sugerindo, ao telefone, um cenário de fim de noite, depois de horas entre bares e discotecas... É nesse instante, desencantado, ainda sem a luz do dia, ruas vazias e a solidão por companhia, que acontecem as canções que, de certa maneira, se sugerem como banda sonora para uma qualquer história after hours... A voz, melancólica, de Ruth Radelet, acompanha quadros que se sucedem, sugerindo todos eles histórias mais de resignação e contemplação que de intervenção. É ao tempo dos melhores dias de Moroder que os Chromatics vão buscar as referências para a sua sombria pop electrónica. O frio que se comentava na música de uns Ultravox (fase John Foxx), de uns Human League pré-Dare, cruzado com desencantos disco é suportado por uma contida produção pouco dada a adornos desnecessários. Night Drive é um dos melhores álbuns de pop electrónica dos últimos anos. E não é preciso citar a (espantosa) versão de Running Up That Hill, de Kate Bush, para o apontar como essencial.
Chromatics
"Night Drive"
Italians Do It Better / Sabotage
5 / 5
Para ouvir: MySpace


Revelados em 2002 em Whip It On, os dinamarqueses Raveonettes cedo deixaram claro que o seu recurso ao pastiche era opção de estilo, mais concretamente, um jogo de citações, e não uma estratégia de compensação para a falta de ideias (que bate à porta de muitas outras bandas, não esta). Ao quarto álbum, o primeiro depois de uma ligação a uma multinacional, ei-los que mostram porque são ainda um nome a ter em conta no actual cenário indie rock. Se os sabíamos já capazes de reinventar os mais diversos domínios do que, ao longo dos anos se convencionou designar por garage rock, agora propõem em Lust Lust Lust o que poderia ser o elo perdido entre o surf rock e o shoegazing... Ou seja, entre Jan & Dean e os My Bloody Valentine, entre Dick Dale e os Jesus & Mary Chain, os Raveonettes encontram uma nova identidade, que exploram num alinhamento cheio de belas canções, entre as quais se destacam Hallucination, You Want Candy (esta no extremo mais retro da questão), Blitzed e o soberbo Dead Sound, single de avanço que doseia de forma irresistível momentos de placidez e descarga de electricidade, com referência óbvia aos Suicide no belíssimo refrão. A personalidade compósita deste duo, que vive da soma de referências captadas em discos de várias etapas de história rock’n’roll permite destacar Lust Lust Lust da actual maré de revivalismo shoegazer que revelou já belos outros momentos em discos dos Asobi Seksu, Midnight Movies e mesmo os Magnetic Fields.
Raveonettes
"Lust Lust Lust"
Fierce Panta
4 / 5
Para ouvir: MySpace


E agora uma estreia... Aaron Thomas é australiano, somando já nove anos de estrada, guitarra às costas, correndo palcos pelo seu país natal, os Estados Unidos e, mais recentemente, Espanha. Vive hoje em Madrid, assinando pela local Popstock o seu álbum de estreia, que é também lançado entre nós. As canções de Follow The Elephants não escondem as suas principais referências, que passam por nomes como os de Jeff Buckley (uma quase inevitabilidade geracional), Radiohead, Bob Dylan ou os Beatles. Na música há, contudo, além destes pilares estruturais, marcas de uma convivência com uma noção de grande espaço, assim como uma ligação fluida entre o urbano e o selvagem, que muitas vezes escutámos em mestres da pop independente australiana, dos Go Betweens aos Triffids. As palavras, escritas por si, sempre na primeira pessoa, são pequenos contos do dia a dia. Momentos e histórias, que partem do real, da observação, ocasionalmente traduzindo uma noção de distância e separação, natural em quem optou por encontrar casa no outro lado do mundo. Uma voz agradável, e uma escrita segura (nove anos de estrada foram certamente tempo de teste, ensaio e erro) fazem de Follow The Elephants uma estreia merecedora da atenção dos amantes da canção de autor com passado rock’n’roll e vontade de contar histórias. Para fãs de Jeff Buckley, Dylan... Por aí...
Aaron Thomas
"Follow The Elephants"
Popstock
3 / 5
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Oito anos depois do The Covers Album, Cat Power edita um novo disco de versões. Mais que uma mera montra de paixões, admirações, de gostos, Jukebox revela uma forma de vestir os outros pela nossa voz. Ou seja, Cat Power escolheu entre temas de terceiros) uma série de canções que expressam males de alma que conhece, assimilando-os, transformando-os, fazendo-os, assim, também seus. Ao longo deste alinhamento dá nova voz e corpo instrumental, numa banda que reúne músicos da Blues Explosion e Dirty Three, a canções que conhecemos cantadas por Frank Sinatra, Bob Dylan, Joni Mitchell, Hank Williams, Janis Joplin, Billie Holliday ou James Brown, entre outros. Uma das versões, na verdade, parte de um original seu Metal Hart, de 1998, que agora reinterpreta A estes 11 temas juntou ainda um inédito, de sua autoria, Song To Bobby, homenagem a Bob Dylan, com travo às memórias do mestre, nos dias antes da electricidade. Não deixa de ser curioso o facto de ser esta a melhor canção do alinhamento, confirmando que, nem sempre, os álbuns de versões mostram o melhor de cada cantor. O disco acontece a dois tempos, ora sublinhando uma admiração sabida pelo rhythm’n’blues, ora optando pontualmente pela quase nudez para voz e acompanhamento minimal, nesta segunda opção, nascendo algumas das mais interessantes das reinvenções aqui registadas. A melhor das covers no álbum escuta-se na sublime nova leitura, dreamy, de Lost Someone, original de James Brown, exemplo de fuga aos códigos retro de paixão r&b de que Cat Power tanto gosta, mas que reduzem, em outros instantes deste disco, outras pérolas a um caldo morno, tecnicamente irrepreensível, mas por vezes pouco imaginativo. O discreto New York New York, outrora de Sinatra, é triste engano, duplamente equívoco ao ser colocado como faixa de abertura.
Cat Power
“Jukebox”
Matador / Popstock
3 / 5
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A fechar o lote de discos apresentados esta semana, um EP de estreia de um novo projecto nacional, de que já aqui se falou no Sound + Vision. Já se fala deles há algum tempo, sobretudo desde finais de 2007. E as melhores expectativas dessas primeiras opiniões confirmam-se, agora, neste convincente EP de apresentação. Acima de tudo, Plutão mostra nos Macacos do Chinês (um bom nome, acrescente-se) um raro exemplo de evolução estética, face ao que conhecemos do habitual panorama (musicalmente pobre, apesar das conhecidas excepções) da maior parte dos projectos nacionais nascidos nos domínios do hip hop e suas esferas adjacentes. Nos Macacos do Chinês observamos um gosto pelo trabalho de construção cénica, pelo jogo entre a palavra, o ritmo e a melodia. Curiosamente, o tema que dá título ao EP é o que menos reflecte esta ideia, revelando ainda uma vontade, muito habitual na cultura hip hop portuguesa, em usar mais palavras que as que o tempo deveria permitir na canção. Já os dois restantes temas, um deles usando um sample de uma gravação de O Lago dos Cisnes, de Tchaikovsky, revelam o aprumo de formas acima referido, indiciando aqui caminho a seguir... Através dos Macacos do Chinês o que conhecemos no Reino Unido como grime chega a estas paragens, para começar a descobrir a sua eventual expressão local. Um belo ponto de partida para um projecto a acompanhar com atenção.
Macacos do Chinês
“Plutão”
Enchufada
4 / 5
Para ouvir: MySpace


Também esta semana:
Damien Rice, Happy Mondays (reedições), Vic Chesnutt, British Sea Power, Justin Timberlake (DVD)

Brevemente:
28 de Janeiro: Sérgio Godinho (ao vivo), Eels (best of), These New Puritans, Novembro, Sam The Kid (repackage), Sons & Daughters, Cage The Elephant, Wendy James, Susumu Yokota, Miss Kittin, Lightspeed Champion
4 de Fevereiro: KD Lang, The Kills, Hot Chip, Triffids (reedições), Morcheeba, Joni Mitchell (DVD), Cass McCombs
11 de Fevereiro: Morrissey (best of), Michael Jackson (reedição)

Fevereiro: Vampire Weekend, Rita Redshoes, Boy Kill Boy, The B-52’s, Gary Numan (reedição), Buzzcocks, Bob Mould, Durutti Column (reedição), Goldfrapp, Soft Cell (reedição), UHF (reedição), Petrus Castrus (reedição), Quinteto Académico + 2 (reedição), Telectu (reedição), Quarteto 1111 (reedição), Mind da Gap (best of), Duran Duran (reedições – três primeiros álbuns numa caixa), ABC, Moby, Sigur Rós, Sebastien Tellier, Correcto
Março: Bauhaus, R.E.M., Breeders, Elbow, Supergrass, Billy Bragg, Faces (reedições), Nick Cave & The Bad Seeds, Van Morrisson, Devotchka, Daft Punk, Young Knives, Zombies (reedição), John Tavener, Philip Glass (BSO), The Grid, The Teenagers, Super Nada, OMD (reedição), Guillemots, The La’s (reedição), Cinematic Orchestra (live), We Are Scientists, Why?

Estas datas são provisórias e podem ser alteradas