sábado, outubro 20, 2007

Música de arquivo

Philip Glass está a lançar, através da série “Archive”, na sua própria editora – a Orange Mountain Music – uma série de gravações de obras que, ao longo dos anos, acabaram arredadas do protagonismo mediático pelo impacte de outras composições. O segundo volume da série acaba de ser editado (por lá, que por cá a coisa nunca é garantida) e, depois de um primeiro disco dedicado ao teatro (ver em baixo) apresenta duas obras de música orquestral (a segunda, curiosamente, também ligada ao teatro). O alinhamento abre com Days And Nights In Rocinha, uma espécie de retrato impressionista da Rocinha (no Rio de Janeiro), obra de 1988 que revela enormes afinidades com algumas das reflexões musicais apresentadas, na mesma altura, na banda sonora de Powaqatsi, de Godfrey Reggio. Sem a carga representativa do sentir musical local (como Glass mostrou já em obras como Orion, Passages ou The Screens), antes como em outras peças retrato (como, por exemplo, Itaipu), Days And Nights In Rocinha opta pela sugestão do lugar através de ideias-chave, assimilando-as, integrando-as, numa matriz muito pessoal onde, todavia, uma certa intenção “fotográfica” é evidente. Da visita à Rocinha e sua escola de samba, Glass trouxe uma puslão rítmica que, nesta peça, se desenha num crescendo repetitivo que, ao mesmo tempo, assiste ao ganhar de forma de duas linhas melódicas, que também se repetem, numa estrutura relativamente à do clássico Bolero de Maurice Ravel. Menos surpreendente, e intimamente relacionada com variações para orquestra e coro de um dos seus estudos para piano, Persephone (banda sonora de mais uma colaboração com Robert Wilson) conclui o alinhamento.

Já com alguns meses de vida, o volume um da série Archives, de Philip Glass, mostrou música que o compositor escreveu e gravou para peças de teatro, afinal, o espaço de intervenção onde deu os seus mais importantes primeiros passos, entre Paris e Nova Iorque, nos anos 60 e 70. Contudo, não encontramos aqui registos de obras dessa etapa inicial, mas antes música para produções relativamente recentes e apenas medianamente interessantes. O disco abre com uma versão instrumental de The Sound Of a Voice (de 2003), na qual se cruza a linguagem de Glass com instrumentação oriental (afinal conta-se uma história de um guerreiro japonês). A fechar, In The Summer House (1993), um diálogo para violino e violoncelo.