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Mala Noche é um filme mais de deambulações, de esperas e desejos não concretizados que de grandes acontecimentos. A história, de resto, é minimalista, pouco mais tendo a acrescentar à proposta de trama acima exposta, juntando apenas um inesperado desaparecimento pontual de Johnny, a doença de Roberto e consequente dedicação de Walt, um raide policial, uma morte e uma ruptura...Como em Elephant ou em Last Days -Últimos Dias, muitas das sequências acontecem em movimento, acompanhando frequentemente Walt na sua caminhada diária pendular de casa para a loja, sorrindo e cumprimentando tudo e todos, nesse ritual escondendo a si mesmo e aos demais a solidão que, na verdade, assombra a sua vida. Por seu lado, Roberto e Johnny são esboços da inesquecível personagem que River Phoenix compôs poucos anos depois em A Caminho de Idaho. Vivem na rua, imaginamos que, mais dia, menos dia, vendendo o corpo para sobreviver. Vidas de desconforto, de silêncio e sombra, mesmo assim, talvez, mais luminosas do que as que teriam do outro lado da fronteira.Rodado a preto e branco, em 16 mm, Mala Noche custou 25 mil dólares. Dinheiro que o próprio Gus van Sant juntou nos dois anos anteriores à rodagem do filme, trabalhando então em Nova Iorque numa agência de publicidade. O filme revelar-se-ia um determinante motor de arranque para uma carreira notável, definindo desde logo muitas das preocupações do realizador. E acabou depois reconhecido como um dos casos pioneiros daquilo a que veio a designar-se por new queer cinema, do qual diversos exemplos têm conhecido estreia recente nas salas portuguesas.
PS. Texto originalmente publicado no DN