11 Perspectivas — episódio de Sean Penn
11 Perspectivas — episódio de Idrissa Oueadraogo
Este texto foi publicado no Diário de Notícias (9 de Setembro), com o título 'Vendo e revendo o 11 de Setembro >>> O recente aparecimento de um video de Osama Bin-Laden desencadeou as mais variadas reacções políticas e mediáticas, incluindo uma declaração do Presidente George W. Bush. Em vésperas do sexto aniversário dos atentados de 11 de Setembro, compreende-se que assim seja: desde logo porque as ameaças terroristas não se desvaneceram, mas também porque quase todos os combates ideológicos contemporâneos passam pelas imagens e pelo seu potencial efeito de verdade.
Repare-se, aliás, que a avaliação do novo video implicou, antes de tudo o mais, a discussão da veracidade da sua origem. E que assim tenha acontecido, eis o que não resulta apenas da preocupação de perceber até que ponto se está perante um bluff ou face ao discurso de um terrorista. De facto, a babel de imagens em que vivemos transformou a sua legitimação numa questão de todos os dias: vemos realmente aquilo que vemos ou estamos apenas a seguir aquilo que outros nos querem fazer imaginar? Quem manipula? Quem é manipulado?
É conhecida a atitude dominante nas televisões face a tão dramáticas dúvidas. A esmagadora maioria dos formatos televisivos funda-se na ilusão de que a imagem (televisiva) possui uma vocação automática e inquestionável para reproduzir o mundo sem mácula: o repórter está “lá” e isso seria um inquestionável modo de produzir verdade... Não por acaso, o cinema tornou-se um objecto secundário em todas as programações, a ponto de socialmente ter perdido muito da sua importância simbólica e do seu reconhecimento artístico. Essa marginalização do cinema, quotidiana, organizada e sistemática, conseguiu mesmo reduzir os filmes a coisas mais ou menos anedóticas e pitorescas.
Por vezes, o mercado do DVD pode ajudar-nos a combater tais rotinas. Assim, uma feliz coincidência fez com que surgisse a edição de um curioso filme, precisamente sobre as imagens do 11 de Setembro, ou por elas inspirado. É uma produção de 2002, chama-se 11 Perspectivas e resulta de um projecto singular: onze cineastas de todo o mundo, da iraniana Samira Makhmalbaf ao japonês Shohei Imamura, passando pelo mexicano Alejandro González Iñárritu ou o americano Sean Penn, foram convidados a fazer curtas metragens inspiradas na tragédia de 11 de Setembro de 2001. Uma única obrigação: cada episódio deveria ter 11 minutos, 9 segundos e mais um frame (daí o título original: 11’ 09” 01).
O episódio de Idrissa Ouedraogo, do Burkina-Faso, adquiriu uma renovada actualidade. Ele filma a história de cinco rapazes de Ouagadougou, a capital do país. Poucas semanas passadas sobre o 11 de Setembro, deparam na rua com um sósia de Bin Laden: entusiasmados com a possibilidade de receber uma recompensa de muitos milhões de dólares, filmam-no em video para provar a sua descoberta. O desenlace tem algo de caricato, mas também pedagógico: trata-se de um pequeno exercício de comédia bem revelador dos poderes ambíguos da imagem, isto é, da sua capacidade de nos mergulhar numa realidade que se pode confundir com a pura cegueira.
Repare-se, aliás, que a avaliação do novo video implicou, antes de tudo o mais, a discussão da veracidade da sua origem. E que assim tenha acontecido, eis o que não resulta apenas da preocupação de perceber até que ponto se está perante um bluff ou face ao discurso de um terrorista. De facto, a babel de imagens em que vivemos transformou a sua legitimação numa questão de todos os dias: vemos realmente aquilo que vemos ou estamos apenas a seguir aquilo que outros nos querem fazer imaginar? Quem manipula? Quem é manipulado?
É conhecida a atitude dominante nas televisões face a tão dramáticas dúvidas. A esmagadora maioria dos formatos televisivos funda-se na ilusão de que a imagem (televisiva) possui uma vocação automática e inquestionável para reproduzir o mundo sem mácula: o repórter está “lá” e isso seria um inquestionável modo de produzir verdade... Não por acaso, o cinema tornou-se um objecto secundário em todas as programações, a ponto de socialmente ter perdido muito da sua importância simbólica e do seu reconhecimento artístico. Essa marginalização do cinema, quotidiana, organizada e sistemática, conseguiu mesmo reduzir os filmes a coisas mais ou menos anedóticas e pitorescas.
Por vezes, o mercado do DVD pode ajudar-nos a combater tais rotinas. Assim, uma feliz coincidência fez com que surgisse a edição de um curioso filme, precisamente sobre as imagens do 11 de Setembro, ou por elas inspirado. É uma produção de 2002, chama-se 11 Perspectivas e resulta de um projecto singular: onze cineastas de todo o mundo, da iraniana Samira Makhmalbaf ao japonês Shohei Imamura, passando pelo mexicano Alejandro González Iñárritu ou o americano Sean Penn, foram convidados a fazer curtas metragens inspiradas na tragédia de 11 de Setembro de 2001. Uma única obrigação: cada episódio deveria ter 11 minutos, 9 segundos e mais um frame (daí o título original: 11’ 09” 01).
O episódio de Idrissa Ouedraogo, do Burkina-Faso, adquiriu uma renovada actualidade. Ele filma a história de cinco rapazes de Ouagadougou, a capital do país. Poucas semanas passadas sobre o 11 de Setembro, deparam na rua com um sósia de Bin Laden: entusiasmados com a possibilidade de receber uma recompensa de muitos milhões de dólares, filmam-no em video para provar a sua descoberta. O desenlace tem algo de caricato, mas também pedagógico: trata-se de um pequeno exercício de comédia bem revelador dos poderes ambíguos da imagem, isto é, da sua capacidade de nos mergulhar numa realidade que se pode confundir com a pura cegueira.
11 Perspectivas — episódio de Idrissa Oueadraogo