Composto por Robert Schumann (1810-1856) em 1850, o seu Concerto para Violoncelo op 129 pode não ser hoje das peças mais citadas da sua obra mas, na altura, alcançou a mesma popularidade que o hoje ainda referencial Concerto para Piano Op 54, composto alguns anos antes, igualmente em lá menor. Francamente emotivo, revelando uma construção reflectida e apelando à entrega da interpretação, é uma obra que se escuta de um fôlego só, de tão eloquentemente encadeados que se apresentam os três andamentos. O violoncelo tem uma presença constante, poética, acentuando tonalidades nostálgicas, ocasionalmente ensaiando a contemplação da luz, sugerindo no fim um tom de serenidade, como o próprio compositor chegou a sugerir ao descrever o concerto. Tal como hoje a escutamos, esta foi uma obra que nasceu igualmente de um só fôlego. Schumann começou a delinear o concerto a 2 de Setembro de 1985. A 16 estava completamente esboçado. E a 24, concluído. A obra teve todavia uma estreia pública póstuma, interpretada pela primeira vez apenas em 1860, quatro anos depois da morte de Schumann.
Nesta gravação, pela Mahler Chamber Orchestra, dirigida por Claudio Abbado (ed. Deutsche Grammophon), é solista a veterana violoncelista russa Natalia Gutman (na foto), antiga aluna de Rostropovich, em Moscovo. Natália Gutman interpretou regularmente esta obra no ano passado numa digressão que assinalava os 150 anos da morte de Schumann e o centenário do nascimento de Shostakovich. O disco, uma gravação ao vivo, foi registado em Itália, em 2006. Com carreira internacional desde meados dos anos 60, Natalia tem corrido o mundo e tocado com as melhores orquestras e maestros. Chegou a partilhar o palco com Sviatoslav Richter numa interpretação da Sonata para Violoncelo de Chopin. A sua discografia tem mostrado alguma atenção para com repertórios contemporâneos, apresentando hoje um leque variado de registos que a revelam tão entregue à música de um Messiaen como à de um Britten, Shostakovich ou Dvorák. Em 1990 fundou, com o marido, Oleg Kagan, o International Musikfest am Tegernsee, festival de música de câmara com palco nos Alpes Bávaros. Poderemos vê-la, em Abril de 2008, em concerto na Gulbenkian, num programa com peças de música de câmara de Brahms, no qual estará acompanhada por Viktor Tretjakov (violino), Yuri Bashmet (viola) e Vassily Lobanov (piano). Johannes Brahms é, curiosamente, companheiro de Gutman também neste disco no qual, além do Concerto para Violoncelo de Schumann, interpreta a Serenata Nº 1 op.11, de Brahms (1833-1897), composta em 1858 e 59, numa etapa anterior à da obra sinfónica do compositor. As duas peças sublinham a espantosa identificação de Gutman, de Abbado e da orquestra à poética elegância dos repertórios românticos. Nota final para uma capa que, mesmo usando um critério "antigo" (títulos sobre pintura), emprega da melhor forma o megnífico Die Musik, de Gustav Klimt, sob um arranjo gráfico arejado e actual.