segunda-feira, janeiro 01, 2007

Televisão "versus" Presidente

Erros televisivos. No espaço te-levisivo português acontecem coisas absolutamente incom-preensíveis. Exemplo: os in-fantis erros iconográficos que, hoje à noite, marcaram a mensagem de Ano Novo do Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva. Poderíamos admitir (e até defender) a ideia de que a Presidência da República teria vontade de arriscar em modelos de comunicação que se demarcassem da retórica mais corrente das linguagens televisivas. Mas não: estávamos perante um tradicional dispositivo de talking head, com o autor da mensagem a dirigir-se a uma câmara frontal que, no plano específico da transmissão, corresponde ao olhar dos espectadores, em geral, e de cada um, em particular.
Como compor o espaço? Ora, que aconteceu? Desde logo uma indefinição de espaço que fazia com que as mãos de Cavaco Silva estivessem constantemente a entrar e sair do enquadramento, criando um "ruído" visual tão desagradável quanto distractivo. Aliás, era óbvio que ninguém reflectiu sobre o efeito de tal "ruído", uma vez que a mensagem se iniciou com o enquadramento um pouco mais aberto, surgindo depois um breve zoom para a frente que instaurou o novo e desastroso enquadramento. Como se isto não bastasse, o quadro lateral (na zona inferior direita do ecrã), onde surgia inserida a linguagem gestual para surdos, ostentava um erro crasso: como compreender, de facto, que a pessoa encarregada desse trabalho usasse uma camisola vermelha, impondo uma agressiva mancha de cor que desequilibrava toda a composição do quadro?
A questão do olhar. Em todo o caso, o mais absurdo resultava da absoluta falsidade do olhar a que o Presidente estava sujeito. De facto, Cavaco Silva surgia compelido a ler o seu texto num dispositivo (teletexto, presume-se) que, em vez de integrado na câmara — como acontece há décadas no mais vulgar dos telejornais —, estava colocado abaixo da sua objectiva. Efeito prático: o Presidente fixava um ponto, algures por baixo do nível do nosso próprio olhar, fazendo com que o seu corpo parecesse repuxado para trás, em situação de desconforto e também de impossível empatia comunicacional.
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O Presidente da República falou dos desafios e dificuldades que esperam os portugueses no ano de 2007. São questões graves que, além do mais, encontram no mais alto magistrado do Estado um lugar institucional, simbólico e político cuja dignidade importa preservar por todos os meios, incluindo as mensagens televisivas. Infelizmente, tal como as coisas se passaram, prevaleceu um amadorismo mediático que só pode minimizar as mensagens que se tentam veicular.

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