terça-feira, dezembro 05, 2006

Discos da semana, 4 de Dezembro

Sam The Kid “Pratica(mente)”
Numa entre as muitas contundentes reflexões que lança entre as sólidas rimas do seu novo disco, Sam The Kid lembra os muitos que só lhe elogiaram apenas os instrumentais... É justo. Mas não é menos verdade que, apesar das promessas encasuladas nos seus dois primeiros álbuns, coube a Beats: Volume 1 o efeito de cartão de definitiva afirmação de um talento que já se lhe adivinhava (e que alguns bootlegs de maquetes de beats e colagens que por aí circulam entre amigos já revelavam sem sombra de dúvida). Agora, a Pratica(mente) cabe o passo seguinte. O da reconfirmação do instinto e arte do produtor e da revelação das capacidades do MC e magnífico construtor de rimas que, finalmente, se mostra ao nível das capacidades “instrumentais” já conhecidas... Este é um álbum de síntese e balanço, retrato, por dentro, de um espaço em clara afirmação no panorama musical português, mas que, contudo, nos últimos tempos, tem primado pelo tiro ao lado, em grande parte reflexo do excesso de propostas menores que têm chegado a disco. Pratica(mente) sublinha também a mestria de um pensador de sons, cuja afirmação personalidade muito se deve a um gosto melómano que sabe traçar caminho próprio ao revelar conhecimento e admiração pelas várias escolas da música portuguesa. Notas finais ainda para a excepcional utilização de vozes gravadas (entrevistas, telefonemas, conversas ocasionais) que conferem um tom vivencial à arte final do disco e sublinham algumas das suas farpas. A voz de António Pinho Vargas a agradecer o estímulo que representa ser citado por um outro artista que sirva de lição a Vítor Espadinha.
Ao Samuel os parabéns, pelo melhor álbum da sua discografia e, também, o melhor disco do hip hop português até ao momento!

Steve Reich “Phases”
A assinalar o seu 70º aniversário, Steve Reich vê a sua editora de há já longos anos, a Nonesuch, a editar uma caixa comemorativa de cinco CDs. A memória de alguns pode recordar a monumental antologia Works (caixa de dez discos, editada em 1997, não se podendo portanto esperar de Phases uma colecção do mesmo calibre, uma selecção de "fases" históricas sendo, naturalmente compreensível. Aqui estão, inevitavelmente (e nas mesmas gravações já editadas antes em CD) peças fulcrais como Drumming, The Desert Music, Tehillim ou Music For 18 Musicians, o pioneiro Come Out, representações de fases criativas de finais de 80 e dos anos 90 como New York Counterpoint ou Electric Counterpoint e algumas criações posteriores a 97 como You Are (Variations), Cello Counterpiont e o Triple Concert, para o Kronos Quartet. Apesar da excelência do levantamento, esta visão em apenas cinco discos exclui peças não menos fundamentais como Clapping Music, Different Trains ou Sextet, ignora trabalhos fundamentais para palco como The Cave (representado em Works) ou o mais recente Three Tales (que vimos no CCB). Assim como não junta uma qualquer gravação inédita. De resto, pensada para assinalar também este momento, Daniel Variations (apresentada há dias na Casa da Música), podia morar aqui. Mesmo assim, apesar de ausências que se não devem deixar de assinalar, uma antologia sobretudo recomendada a iniciados, muitos certamente sendo os que, depois de ver exemplos vivos de aplicações da genética “reichiana” na música de Sufjan Stevens ou Final Fantasy, desejam, agora, conhecer a fonte de tão estimulantes visões.

Alluminium “Alluminium”
É antiga a tradição de adaptar a arranjos “sinfónicos” peças e canções nascidas em berço rock. É também antiga (e extensa) a lista de exemplos em que a alma da matéria prima se perde no processo, o pitoresco a aflorar depois em metamorfoses incompletas, exemplos raros de excepção sendo as sinfonias que Philip Glass fez nascer de Low e Heroes de Bowie. Em Alluminium, a música dos White Stripes é ponto de partida para arranjos para orquestra (sem voz) por Joby Talbot (velho parceiro de Neil Hannon). Mas, ao contrário de Glass, nem a alma transformada nem a do transformador sobrevive. Resultado? Cacofonia sinfonista sem particular rasgo criativo, com ar de coisa dinâmica, banal e sem sentido, mais moldura que pintura. Apenas para embasbacar quem nunca ouviu uma orquestra. A menos que se saiba dominar as linguagens do melhor teatro, não se veste com fraque falso uma alma nascida das verdades primordiais do rock’n’roll.

A Hawk And A Hacksaw “The Way The Wind Blows”
Ao terceiro disco, o ex-baterista dos Neutral Milk Hotel, Jeremy Barnes, levou o seu projecto A Hawk And A Hacksaw à Roménia, como que a tornar realidade um sonho sugerido no álbum anterior. Ao disco chamou, inclusivamente os metais da Fanfarre Ciaocarlia, assim como a colaboração de Zach Codon (Beirut), mas no fim apresenta-nos um disco que mais parece retrato de encanto por um exotismo, que um jogo de assimilações e partilhas como o que revelara em Darkness At Noon ou Zach Condon sugere em Gulag Orkester. Nota-se uma seiva beatlesca nas entrelinhas, mas a euforia cigana ofusca e ensopa a arte final de um disco agradável, mas inconsequente.

Também esta semana: Humanos (ao vivo), Heaven 17 (best of), Spektrum, Clash (singles numa caixa), Cristina Branco (ao vivo)

11 de Dezembro: Sonic Youth (lados B), Bernardo Sassetti, Eleni Karaindrou (ao vivo), Post Industrial Boys
Para 2007: JP Simões, U-Clic, Klaxons, The Good The Bad and The Queen, Mika, John Cale, Amélia Muge


Estas datas provém de planos de lançamento de diversas editoras e podem ser alteradas a qualquer momento

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