quarta-feira, setembro 20, 2006

Perder o comboio...

A cada mês que passa a impressão de que as estruturas convencionais da indústria discográfica estão por um fio torna-se cada vez mais evidente. A somar a mais de dez anos de estatismo perante a revolução digital (enquanto decorria choruda fictícia temporada de vacas gordas, alimentada pela reedição re-reedição e re-re-reedição de velhos fonogramas), a políticas de preços injustificadamente elevados, a frequentes opções editoriais de trálálá-lixo em detrimento de real música, começam a surgir novas manifestações de incapacidade em lidar com um mundo que está a mudar mais depressa que a sua capacidade de a ele se adaptarem. E isto para não falar na péssima gestão de catálogo (sobretudo campanhas de reedições) nas delegações locais das sobreviventes multinacionais.
Se a luta contra a pirataria é ideia justa e urgente, as ferramentas usadas são claramente insuficientes. Não bastam serviços de venda online (e convenhamos que ainda são limitados os catálogos disponíveis), não basta legislação de protecção a direitos, não basta lutar por mudança de hábitos (e aplicação de leis) na rádio… O preço do CD é hoje francamente desmotivador. O IVA sobre a música, injusto. E a localização de novo talento ou está sob travão ou desnorteada porque, verdade seja dita, alguma da nova melhor música (e com capacidade para fazer números nas vendas) começa a surgir fora do circuito dominado pelas editoras menos ginasticadas. A Internet, e uma correcta gestão entre a oferta de uns ficheiros e a venda de outros, é caminho de futuro. Porém, ainda parece haver quem não o tenha compreendido.
Na mesma semana em que a Warner revela que chegou a um acordo com o YouTube, a Universal faz saber que considera ilegal o uso que este mesmo site, assim como o MySpace, fazem da música dos seus artistas. Mal compreendendo que, ali, tem hoje janelas de divulgação mais eficazes que uma televisão surda para a música nova e uma rádio que foge de todo o som posterior a 1986. A isto juntam-se falácias borlistas, via SpiralFrog, que falam de ficheiros oferecidos por grandes editoras, mas a troco de publicidade e com mais não sei quantos obstáculos que rapidamente darão a ideia por profundo logro.
O MySpace vai vender música. Três milhões de bandas ali representadas poderão fazer negócio, directamente do produtor ao consumidor, sem nunca precisar de um contrato editorial. É certo que uma grande editora promove esquemas de marketing, e acompanhamento, não esquecendo o investimento nas gravações. Mas para muita música que aí corre, a alternativa é aliciante. E se os Arctic Monkeys ou Clap Your Hands Say Yeah trataram bem de si via Internet (os segundos sem editora), os sinais são claros. Muita da nova música vai nascer e passar ao lado das estruturas convencionais. Às grandes editoras restará repensar a sua postura de mercado, abraçando naturalmente as estrelas galácticas ou gerindo com afinco o acervo de memória que nelas reside. Mas com atitudes como a que a Universal revela, fera ferida sem compreender que está a morder em no local errado, não se vislumbram mudanças de atitude que revelem capacidade em compreender o contexto actual, os novos veículos de divulgação e as suas potencialidades enquanto elementos capazes de estimular um negócio que lhes escorrega cada vez mais depressa dos dedos.
Em crise pela sobrevivência ou se age inteligentemente ou escorrega em disparates de desespero. Tem havido mais sinais da segunda que da primeira opção. É pena.

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