segunda-feira, setembro 18, 2006

Discos da Semana, 18 de Setembro

Scissor Sisters “Ta-Dah”
Que fazer depois de um disco que, como raros, despertou paixões e ódios? Que fazer depois de ver uma ideia nascida de um delírio underground acabar transformada num fenómenio inesperadamente transversal? Que fazer, se estamos perante uma banda de personalidade vincada, vacinada contra tentações exteriores à sua agenda artística, mas ainda em pleno processo de demanda de uma identidade?... Ta-Dah, o segundo álbum, responde a todas estas questões, sorriso na face e vontade em manter viva a festa. É um disco de evolução na continuidade, talvez receoso de apostar em evidentes estratégias de ruptura. Mas não é ainda chegado o momento para o fazer. Mantém-se portanto vivo e evidente o mesmo quadro genético revelado no álbum de estreia, que procura referências em escolas festivas dos anos 70, o disco sound ainda ostensivamente presente, o funk a alimentar as febres de sábado à noite, rock’n’roll encorpado (por vezes de ascendência glam) a dar corpo próprio a uma música que se dança, mas vive viço de palco e convoca qualquer corpo à entrega. Mas entre a continuidade desenha-se a diferença, a partida para novos destinos, o saborear de outros prazeres. I Can’t Decide é country cruzado com vaudeville, numa história de travo western que vinca a profunda identidade americana que cruza todo o álbum. The Other Side convoca o livro de estilo Roxy Music pós-Manifesto, elegância e requinte a revelar aqui o melhor na postura vocal de Jake Shears. Kiss You Off, na voz de Anna Matronic, é reinvenção de exagero à la Kiss sob política new wave e garrida alma pop. Might Tell You Tonight é pop perfeita, mid tempo de travo clássico. Ta-Dah, discretamente, leva os Scissor Sisters para lá de Nova Iorque (que era evidente cenário protagonista no álbum de estreia). Abraça heranças e paisagens da América, furacão liberal por oposição a tempos de temor conservador. Mas longe de querer ser uma bandeira ou manifesto político, é palco de festa libertadora, padecendo de saudável febre de sábado à noite. Sem margem para dúvidas, Ta-Dah vence o desafio do “difícil segundo álbum”.

Camera Obscura “Let’s Get Out Of This Country”
Depois de uns primeiros dez anos de vida sob a sombre dos conterrâneos Belle & Sebastian, os Camera Obscura procuram neste belíssimo terceiro álbum caminhos para uma libertação que, naturalmente não imediata, começa contudo a dar sinais de outras demandas… Encontraram a luz ao fundo do túnel na actual geração sueca que cruza pop e folk (que nos deu já nomes como I’m From Barcelona, Acid House Kings ou Camera Obscura). E algo de facto acontece. O afastamento de um dos antigos vocalistas cortou uma das mais evidentes amarras nas velhas comparações com os Belle & Sebastian, a construção de uma música para uma só voz condicionando de facto novas rotas e destinos. Let’s Get Out Of This Country saboreia afloramentos novos, de uma country timidamente visitada em registo de balada em Dory Previn a temperos mais quentes na igualmente tranquila Tears For Affairs, revelando-se ainda um flirt “spectoriano” em If Looks Could Kill. A pop pastoral (que garante intenções de não ruptura com o passado) domina os cenários do tema-título e do fabuloso Come Back Margaret. E, cereja sobre o bolo, a canção perfeita que é Lloyd Are You Ready To Be Heartbroken (homenagem a Lloyd Cole numa das suas canções-chave com os Commotions) serve de cartão de visita, convidando à descoberta de um álbum que exala luminosidade feita de ecos folk, heranças pop de 60 e arranjos elegantes, sem nunca perder o sentido de uma alma indie, em perfeita sintonia com os tempos.

The Hidden Cameras “Awoo”
Há dois anos, o surpreendente segundo álbum dos The Hidden Cameras, Mississauga Goddam (um dos melhores discos do ano, recorde-se), era um dos primeiros sinais evidentes na revelação de novas e desafiantes tendências entre a música Canadiana, que de resto acabariam por dominar as atenções de muitos nos meses seguintes. Agora, a edição do muito esperado sucessor de tão libertadora pop sem freios acaba quase com sabor a relativa desilusão. Awoo limita-se a repetir as mesmas fórmulas, pop barroca, liberdades formais, caos ordenado de referências de som sobre os poemas sem filtro de Joel Gibb. Mas sem canções ao nível das que antes lhes ouvimos, um álbum apenas agradável, inegavelmente bom, todavia de continuidade inesperada onde se aguardavam, sem travões, novas e mais excitantes visões. Mas, sublinhe-se, ninguém é obrigado à revolução a cada nova gravação… Confiantes, esperemos pela próxima, enquanto se escutam as canções deste disco.

Cassius “15 Again”
Há cinco anos, os franceses Cassius representaram uma das revelações tardias da geração francesa que teve em Etienne de Crécy e Daft Punk pilares estruturais, mas nos Air o seu mais criativo fruto. Mais próximos desse pilar house, os Cassius editaram então um sólido (mas hoje quase esquecido) álbum de estreia no qual se cruzavam as heranças colhidas em experiências pessoais no hip hop e requintes ensaiados como La Funk Mob via Mo’Wax, com um gosto pela house, pelo disco, a canção ocasionalmente na sua meta. O seu novo disco (o terceiro), enferma ainda das mesmas marcas do desnorte que fez de Au Rêve, de 2002, um tiro ao lado. 15 Again é uma amálgama de destinos, uma colecção de canções, que só ocasionalmente descolam da mediania (algumas mesmo medíocres), na qual moram bons princípios e, ocasionalmente, interessantes jogos híbridos nas referências convocadas. Música indecisa entre avançar para a pista de dança ou para os palcos, claramente distante do acid disco que nos davam em 1999, temperos novos encontrados entre o dub, house, acid house, electro alguma pop…Não bastam os bons ingredientes para fazer boa culinária...

Também esta semana: U2 (DVD), Electronic (best of), The Album Leaf, The Hidden Cameras, Bonnie Prince Billy

Brevemente:
25 de Setembro: Junior Boys, Guillemots (edição nacional), Loto, Pixies (dois DVDs), The Veils, Charlotte Gainsbourg, Depeche Mode (3 reedições e um DVD), Arthur Russell (reedição), The Byrds (caixa), Alex Kid, Lurent Garnier, Lloyd Cole, Nuno Prata
2 de Outubro: Beck, The Killers, Arrested Development, Juliette & the Licks, Black Keys, Mercury Rev (best of), Four Tet (remisturas)
9 de Outubro: The Gothic Archies, Cerys Mathews, The Pipettes (edição nacional), The Answer, The Datsuns, The Bluetones, I Am Ghost

Outubro: U-Clic, Maximilian Hecker, Kasabian (edição nacional), Sam The Kid, Sérgio Godinho, The Gift (ao vivo CD e DVD), Protocol, Goldfrapp (remisturas), Pet Shop Boys (CD ao vivo e DVD), Philip Glass (ópera), Duran Duran (2 reedições), Robbie Williams, Clinic, Chuck E Weiss, Jay Jay Johansson, Isobel Campbell, Aimee Mann
Novembro: Humanos (ao vivo), Mariza (ao vivo), Tom Waits, Moby (best of), Jarvis Cocker, Sons & Daughters, Bryan Ferry, The KBC, Third Eye Foundation.


Estas datas provém de planos de lançamento de diversas editoras e podem ser alteradas a qualquer momento

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