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Cada imagem do novo filme de Pedro Costa —
Juventude em Marcha (selecção oficial, competição) — possui esta intensidade de um monumento em que a pedra parece fundir-se com a carne, em que a volatilidade de todas as memórias e todas as utopias se cristaliza na mágoa irrefutável do presente. Estamos perante um prolongamento de
Ossos (1997) e
No Quarto da Vanda (2000), ambos resultantes da relação do realizador com os habitantes do bairro das Fontainhas. Agora, com o bairro desmantelado e as pessoas a serem transferidas para habitações sociais, Pedro Costa elabora uma fábula realista (ou será um realismo tendencialmente fabuloso?) através do qual deparamos com a transparência de todas as dores que persistem, vivendo e falando. Sim,
falando, ja que desta vez a palavra adquire a singularidade poética de algo que vem do real e, ao mesmo tempo, se liberta de todas as suas barreiras fisícas e simbólicas.
Juventude em Marcha é um filme de escuta: da sua contemplação nasce uma ética que devolve o cinema à sua dimensão primitiva de cerimónia íntima, inevitavelmente religiosa.