segunda-feira, abril 03, 2006

Discos da semana, 3 de Abril

Morrissey “Ringleader Of The Tormentors”
Ao fim de mais de seis anos de vida em Los Angeles, para procurar solo fértil para projectar novas canções, Morrissey mudou-se para Roma. E a cidade agarrou-o como nem ele esperara. Ali encontrou o amor. E o novo álbum, naturalmente, não podia deixar de reflectir esse novo Morrissey, renascido em Itália. O ambiente que caracterizou a etapa de composição e as canções que foram nascendo, o desafio ao velho mestre Tony Visconti e a presença de Ennio Morricone como arranjador das secções de cordas, colocaram em cena uma plêiade de elementos aliciantes. Às suas fontes de inspiração literárias clássicas (Oscar Wilde, T.S. Eliott, Philip Larkin, W.H. Auden) juntamos a descoberta profunda da obra de Pasolini (na poesia, mas também no cinema), sob identificação política e, sobretudo, religiosa, noção de “culpa” católica obsessivamente presente. E, acima de tudo, há de novo, e pela primeira vez, a expressão física do sexo com um género específico. Um homem feliz fazia o seu disco. Um disco onde a crítica mordaz ao momento político mundial partilha espaço com uma generosidade e boa disposição que não imaginávamos possível no céptico que há dois anos gravou o genial, mas irado, por vezes defensivo, You Are The Quarry. A própria capa do álbum, onde imita um David Oistrakh em pose de entrega a Tchaikovsky, é provocadora (como sempre) mas irónica (como nunca). O único problema de Ringleader Of The Tormentors pode ser a comparação directa que somos tentados a fazer contra o superior álbum anterior, e a inevitabilidade de não apresentar um conjunto de canções do mesmo calibre. Mas, depois do embate e aparente desilusão, este é um disco que conquista aos poucos e depois satisfaz em pleno. Um disco onde o ícone maior da geração pop indie de 80 sai do intelecto para descobrir a carne.

Neil Diamond “12 Songs”
Nas mãos de Rick Rubin, o veterano Neil Diamond (que sempre recordamos de discos mais duvidosos que interessantes) grava em 12 Songs o melhor álbum de toda a sua longa carreira. Perante o par Neil Diamond/Rick Rubin, estabelecem-se imediatas comparações com a série de quatro álbuns através dos quais o mesmo produtor revitalizou a carreira de Johnny Cash, apresentando-o a uma nova geração de ouvintes, transformando-o no mito em que entretanto merecidamente se fez (o sucesso recente do filme Walk The Line que o diga). Mas Neil Diamond não é Johnny Cash. O velho mestre country, mesmo vivendo uma etapa menor desde os idos de 70, nunca fora estrela ligeirinha e somara até, nos anos 50 e 60, um lote fundamental de discos tão populares quanto musicalmente carnudos. Por seu lado, Neil Diamond sempre optou por fazer carreira sobre canções da sua autoria, característica que Rubin fez questão de vincar como essencial no disco. Depois de meses a ouvir velhos discos e a conversar, outros tantos a compor numa cabana nas Montanhas Rochosas, juntaram-se para gravar um disco sob o menor peso possível de instrumentação, mas que soasse, claramente, a Neil Diamond. E 12 Songs é, exactamente, o que Rick Rubin esperava do cantautor. Um disco de belíssimas canções, de voz segura e madura, e com arranjos que pontualmente juntam corpos adicionais a um tronco feito de canto e guitarra. Talvez imaginando o minimalismo de recursos, Neil Diamond não apresenta aqui sinfonias pop(ularuchas), mas antes canções simples onde o apelo da terra (não necessariamente projecções de heranças folk) se materializa.

The Organ “Grab That Gun”
São canadianas, de Vancouver, e um dos nomes de que mais se fala entre a actual geração de bandas nascidas sob clara admiração pelas heranças pós-punk. Este seu álbum de estreia data já de 2004 e não esconde as referências mais óbvias da sua música que encontramos, sobretudo nos The Smiths e Blondie, mas também no legado college rock de 80. A sua atitude denuncia aquela fronteira entre o amadorismo entusiasmado e os primeiros sinais de vida profissional. E as canções mostram (como se escuta em A Sudden Death) indícios de potencialidades que o futuro poderá transformar num caso sério. Uma boa estreia.

Flaming Lips “At War With The Mystics”
Depois de reinventados no superior The Soft Bulletin (1999), onde redescobriam sentidos para a canção pop rock através da subtil contemplação de heranças várias da América, sob um sentido plástico mais apurado que nunca. Depois de renovada a sua música uma extensão natural da mesma lógica a ferramentas electrónicas e a temperos psicadélicos mais evidentes em Yoshimi Battles The Pink Robots (2002), o novo álbum dos Flaming Lips era, naturalmente, um dos mais esperados do ano. Mas revela-se uma valente desilusão. Neste novo álbum parece que fazem questão de mostrar as potencialidades de uma carteira de loucuras ao serviço da música, insistindo na memória do psicadelismo, juntando doses valentes de intensões prog, mas sem um lote de canções que suportem as visões. E acabamos com um álbum de intenções estimulantes, mas deslaçado e inconsequente porque estruturalmente despido de grande escrita. É pena.

Erasure “Union Street”
Em meados de 80 os Erasure deram ao mundo uma mão cheia de belas canções pop trolaró. Mas desde o álbum Chorus que a ideia está esgotada, e de disco para disco arrastam o cadáver de uma ideia datada e criativamente exausta. Este novo disco é acústico… E não é pelas ferramentas que se salva uma carreira que já não mexe há muito tempo. Em tempos o grupo agradava uns e incomodava outros. Hoje, é inconsequente.

Mário Laginha “Canções & Fugas”
Mais uma manifestação de uma realidade que convém que se entenda e manifeste mais ainda em discos: o jazz é hoje um dos mais estimulantes pólos de invenção na música que se faz em Portugal. E depois de excelentes discos de Bernardo Sassetti em 2005, cabe a Mário Laginha mostrar novo episódio que justifica todas as atenções. A solo, parte de uma ideia de Bach, mas transporta-a para as suas linguagens e buscas. E nasce um álbum onde o piano nos fala de perto e arrebata. É já um dos discos obrigatórios do ano.

Japan “The Very Best Of Japan”
Pela primeira vez juntam-se numa mesma antologia canções das duas fases editoriais da vida dos Japan, que entre 1978 e 80 gravaram para a Hansa Records e depois, de 1980 a 83, para a Virgin. O olhar panorâmico por uma das mais criativas bandas pop do seu tempo, todavia com falhas na representação da fase anterior a 1979, na qual o grupo era ainda um estranho híbrido de New York Dolls, Bowie e Roxy Music com urgência pós-punk e desejos visionários, mas longe da eloquência da música que gravariam mais tarde, a partir do álbum Quiet Life.

Também esta semana: Daft Punk (best of), The Dears, Tim, Gary Numan, Neko Case, All About Eve (best of), Ciccone Youth (reedição), Grace Jones (best of), Dimitri From Paris, The Jam (antologia), Blue Aeroplanes, Marvin Gaye (DVD)

Brevemente:
10 Abril: The Streets, I Am X, Calexico, Elefant, X Wife, Camané (DVD), Buzzcocks, Teddy Thompson, Faris Nourallah (reedição), Secret Machines, The Knife, Ronnie Spector, Lamchop, Aphex Twin, Beatles (reedições), Arctic Monkeys (DVD), Calexico, Stereolab, The Mission (best of), She Wants Revenge, Legendary Tiger Man, William Orbit, Adam Green
17 Abril: White Rose Movement, Protocol, Dizee Rascal, Bananarama (best of), The Knife
24 Abril: António Variações (integral de estúdio), Fiery Furnaces, Gnarls Barkley, Futureheads, Red Hot Chilli Peppers, Air (colaborações)

Abril: British Sea Power, Thievery Corporation, Moloko (best of), Garbage (best of), The Dears, Tortoise, Clear Static, The Rakes, Gun Shys, Cure, Bruce Springsteen, Madonna (remisturas, apenas em vinil), Madonna (DVD), k.d. Lang
Maio: Pet Shop Boys, Clear Static, Only After Dark (compilação pós-punk), Radio 4, Boy Kill Boy, Garbage, Pearl Jam, Hot Chip, Outkast, Basement Jaxx, Gomez, Scritti Politti, Tears For Fears (reedição), PJ Harvey (DVD), Grandaddy, Lisa Germano, Matmos, Roddy Frame, Red Hot Chili Peppers, Fatboy Slim (best of), Frank Black, Muse, Zero 7, Sex Pistols (reedição), William Orbit, Spiritualized, Death From Above 1979, Velvet Underground (antologia), Elvis Costello + Allen Toussaint

Discos novos ainda este ano: Primal Scream (Junho), B-52’s, Björk, Beyoncé, Blur, Bryan Ferry, Cornershop (Maio/Juho), Damon Albarn (Verão), David Bowie (Junho), Depeche Mode (ao vivo, Outono), Duran Duran (Verão), Feist (Outono), Franz Ferdinand (Outono), Hector Zazou, Jarvis Cocker (Maio/Junho), Joseph Arthur, The Killers (Outono), Kim Wilde, Michael Franti (Junho), Michael Nyman (Maio/Junho), Moby (Verão), Neneh Cherry, Nine Inch Nails, Outkast, Paul Simon, Peter Gabriel, Polyphonic Spree (Julho), Q-Tip, Radiohead, St Etienne, Scissor Sisters, Sisters Of Mercy, Madonna (Lisboa ao vivo DVD), New York Dolls (DVD)
Reedições e compilações ainda este ano: Art Of Noise, Björk, Frankie Goes To Hollywood, Kate Bush (Novembro), Oasis (Lados B, Junho), Propaganda, Byrds (reedição), Clash (reedição)


Estas datas provém de planos de lançamento de diversas editoras e podem ser alteradas a qualquer momento.

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