Secret Machines “Tem Silver Drops”
Os Secret Machines não são estreantes. Mas com o novo Ten Silver Drops têm reunido a quase unanimidade de opiniões favoráveis entre a imprensa musical de ambos os lados do Atlântico, e contam agora entre os seus mais fiéis admiradores David Bowie, que os começa a apadrinhar com a mesma energia e disponibilidade como, nos anos recentes, o vimos fazer com os Yeah Yeah Yeahs e, mais visivelmente ainda, com os Arcade Fire. Neste seu segundo álbum mostram sinais de mais profunda depuração de elementos fora de órbita, afinando a pontaria rumo a uma música com fôlego e ambição, que parte da memória dos Pink Floyd de inícios dos anos 70 mas que, sem objectivos retro, junta ao caldeirão temperos adicionais captados entre experiências mais recentes, de farrapos de trabalho vocal a lembrar os Jane’s Addiction a breves flirts com a “armadilha” Coldplay (felizmente localizados, curtos e sem consequências perigosas), sem esquecer a mais visível de todas as marcas actuais: a evidente, euforia-furacão de uns Arcade Fire, que aqui conhece segura descendência. O disco mostra uma banda em processo de afirmação de uma maturidade na escrita e interpretação, e sem receio de deixar claras quais as genéticas que hoje alimentam a sua demanda. As canções de Ten Silver Drops são meticulosas obras de visão e ambição, grandiosas nos arranjos, complexas na arte final, mas nunca deslaçadas, nunca perdidas em devaneios maiores que a capacidade de os suportar e moldar (o que se viu, por exemplo, e com os piores resultados, no recente e desapontante At War With The Mystics, dos Flaming Lips). Apesar da grandiosidade que ostentam, da eloquência dos elementos e sua disposição no espaço, conseguem não perder nunca a ideia estrutural da peça que nasce pop e, mesmo vestida em loja de gostos requintados, nunca deixa de ser o que é. Estas são canções seguras de si, cheias de histórias sombrias, feitas de cenografias quixotescas, de excessos controlados, mas que não perdem nunca a sua estrutura primordial. De resto, a alma e força do disco reside precisamente no facto deste se mostrar como um álbum de canções pop que se mascararam, e bem, com sumptuosos trajes progressivos.
Gnarls Barkley “St Elswhere”
Num momento em que, apesar das pontuais excepções, o panorama global “pop” e hip hop parecia algo estagnado, è espera do episódio seguinte, a resposta parece ter sido encontrada na criação de um novo híbrido que pisca ostensivamente o olho ao hip hop, mas que faz questão de afirmar a canção pop como pilar estrutural da sua identidade, temperos diversos depois usados nas artes finais, da soul ao rock, e o que mais o gosto quiser usar. Canções como 19/2000 de uns Gorillaz, Hey Ya! Dos Outkast ou When You Wasn’t Famous dos The Streets são apenas alguns entre os exemplos de uma nova pop viçosa, luminosa, atraente, capaz de importar do hip hop os elementos necessários para renovar uma ideia de prazer para três minutos de voz e música que tem sido a célula fundamental da música popular. A mais recente proposta neste departamento chega através do projecto que reúne o mediático (com feitos justificados) DJ e produtor Danger Mouse com Cee-LO. Juntos chamam-se Gnarls Barkley, somaram primeiras notícias por terem feito do seu single Crazy o primeiro, da história, a chegar ao número um do top inglês apenas com vendas por download. Continuam a ser notícia por manter, até agora, o mesmo Crazy no primeiro lugar (feito raro nos dias de hoje). E são-no uma vez mais com St Elswhere, um álbum de estreia no qual estendem a um alinhamento de 14 temas a ideia de uma pop festiva, arquitectonicamente suportada por estruturas herdadas do hip hop, e para o qual convergem depois referências soul, a memória pop da Motown, ou mesmo heranças indie de 80, estas materializadas numa quase canónica versão de Gone Daddy Gone dos Violent Femmes. Porém, e apesar da excelência de Crazy, da bela versão e de algumas pontuais canções que dá vontade de ouvir vezes sem conta, a ideia é por vezes melhor que a concretização. E o álbum acaba num limbo entre momentos de puro encanto e faixas claramente menores. Também aqui um híbrido, portanto…
António Variações “A História de António Variações – Entre Braga e Nova Iorque”
Ano e meio depois de editado o álbum dos Humanos, no qual o grupo reconstruiu (à sua maneira e gosto) uma série de inéditos encontrados na colecção pessoal de cassetes áudio de António Variações na forma de esboços, maquetes caseiras ou meras vinhetas, a meteria prima que gerou esse disco, assim como outros ensaios encontrados e catalogados nessa colecção de cassetes, permitem a construção de uma “integral” do cantor. A grande novidade deste disco é a inclusão de uma maquete, gravada em estúdio, com banda, do histórico Toma O Comprimido, que poderia ter sido o single de estreia de António Variações em 1981. Dessa mesma sessão é aqui incluído o respectivo eventual Lado B, o tema Não Me Consumas, que os Humanos recuperaram. Junta-se, ainda de inédito, maquetes de Muda de Vida, Maria Albertina e Quero é Viver, uma gravação caseira, com Francis, de Deolinda de Jesus e uma gravação ao vivo, no Rock Rendez Vous, de Anjo da Guarda. O CD, duplo, recolhe a integral de estúdio de António Variações (os dois álbuns e o single Estou Além/Povo Que Lavas No Rio). E para cada tema em estúdio, apresenta-se, um excerto de uma maquete ou ensaio da respectiva canção.
PS. Estando pessoalmente envolvido neste projecto não emito aqui qualquer opinião sobre este disco.
Fiery Furnaces “Bitter Tea”
Os Fiery Furnaces já nos deram exemplos da melhor escrita, sobretudo no conjunto de canções que compilaram no obrigatório EP do ano passado. Porém, transportam no seu sangue uma tendência para o desnorte e anarquia que nem sempre dá os melhores resultados. O seu disco anterior era entediante manobra de autismo, parecendo o novo Bitter Tea um regresso a um espaço onde a comunicação com o exterior parece novamente na agenda do duo. As electrónicas são as ferramentas ao serviço de canções onde se respiram as heranças pop de que os Fiery Furnaces gostam de assimilar na sua escrita, mas onde as marcas de liberdade formal “avariam” saudavelmente quaisquer cânones que essas memórias possam convocar.
Também esta semana: British Sea Power, Thievery Corporation, Moloko (best of), The Dears, Tortoise, Gun Shys, The Cure, k.d. Lang
Brevemente:
1 de Maio: Basement Jaxx, Pearl Jam, Gomez, Scritti Politti, Teats For Fears (reedição), PJ Harvey (DVD), Futureheads, Protocol,
8 de Maio: Red Hot Chilli Peppers, The Raconteurs, Lisa Germano, Bruce Springsteen, Grandaddy, Matmos, Roddy Frame, The Stills
Maio: Pet Shop Boys, Clear Static, Only After Dark (compilação pós-punk), Radio 4, Boy Kill Boy, Hot Chip, Outkast, Basement Jaxx, Gomez, Grandaddy, Lisa Germano, Matmos, Roddy Frame, Fatboy Slim (best of), Frank Black, Muse, Zero 7, Sex Pistols (reedição), William Orbit, Spiritualized, Death From Above 1979, Velvet Underground (antologia), Elvis Costello + Allen Toussaint
Discos novos ainda este ano: Primal Scream (Junho), B-52’s, Björk, Beyoncé, Blur, Bryan Ferry, Cornershop (Maio/Juho), Damon Albarn (Verão), David Bowie (Junho), Depeche Mode (ao vivo, Outono), Duran Duran (Verão), Feist (Outono), Franz Ferdinand (Outono), Hector Zazou, Jarvis Cocker (Maio/Junho), Joseph Arthur, The Killers (Outono), Kim Wilde, Michael Franti (Junho), Michael Nyman (Maio/Junho), Moby (Verão), Neneh Cherry, Nine Inch Nails, Outkast, Paul Simon, Peter Gabriel, Polyphonic Spree (Julho), Q-Tip, Radiohead, St Etienne, Scissor Sisters, Sisters Of Mercy, Madonna (Lisboa ao vivo DVD), New York Dolls (DVD)
Reedições e compilações ainda este ano: Art Of Noise, Björk, Frankie Goes To Hollywood, Kate Bush (Novembro), Oasis (Lados B, Junho), Propaganda, Byrds (reedição), Clash (reedição).
Estas datas provém de planos de lançamento de diversas editoras e podem ser alteradas a qualquer momento.
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