Em 1965 Frank Sinatra contava 50 anos de vida e uma obra já invejável, percorrendo várias rotas da história recente da canção popular e de algumas periferias do jazz. Dividido entre o cinema e a música, a sua obra discográfica somava êxitos, mas desde finais de 50 não produzia um álbum ao nível das pérolas que registara nessa década de grandes feitos em disco. Como que a mostrar que ainda era “a voz”, concebeu, sob a direcção de orquestra de Gordon Jenkins, um dos mais notáveis álbuns orquestrais de toda a sua carreira, comparável apenas ao igualmente sublime In The Wee Small Hours, editado dez anos antes. O disco, que ostentava um título no qual Sinatra assumia o inevitável correr do tempo – September Of My Years – sublinhou a existência de um novo registo vocal mais grave e, talvez, sombrio, que os discos swingantes não denunciavam. A voz, assim como o tom dos arranjos de Jenkins encenam pequenos olhares sobre o envelhecimento, a reflexão, e mesmo o arrependimento. As canções mostram raízes na mais clássica noção de pop, mas espreitam pontualmente heranças folk e alguns temperos mais “contemporâneos”. Este é um dos mais notáveis monumentos sinfonistas da obra de Frank Sinatra e uma das suas mais melancólicas colecções de grandes canções. September Of My Years, o tema título do álbum, revela uma densidade quase mahleriana. How Old Am I? segue mais de perto o registo da balada para orquestra que se escutava em muitos filmes da época. E It Was A Very Good Year, olhar de um homem vivido sobre o tempo vivido e a força da memória, é, simplesmente, uma das mais espantosas canções de sempre, aqui em soberba interpretação. A fechar o alinhamento, uma espantosa versão de September Song, de Kurt Weill.
No texto que se lia na contracapa do álbum, Stan Cornyn, que acompanhou as gravações, deixava claro que “hoje não se swinga. Hoje é a sério. Lá dentro, os músicos, comandados pelo informal Gordon Jenkins, ensaiam os arranjos ainda sem a voz. À espera que ele chegue”. Mais à frente, registos já na fita, o mesmo texto sublinha em Sinatra o arquétipo do homem que já viveu bem, a estrela que se idolatra. O homem que para, agora, para olhar para trás e que usa enfim a memória com a visão de um poeta: “Ele viveu já por duas vidas, e pode agora cantar sobre Setembro (…) Setembro pode ser uma atitude ou uma idade, ou apenas uma realidade em sonhos. Para este homem é um tempo de amor. Um tempo para cantar”… E, como nunca, Sinatra cantou.
Frank Sinatra, “September Of My Years” (Capitol, 1965)
Se gostou, escute depois:
Frank Sinatra, “In The Wee Small Hours” (1955)
Elvis Costello + Burt Bacharah “Painted From Memory” (1998)
Divine Comedy “A Short Album About Love” (1997)
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