O panorama pop português em meados de 60 já reflectia alguns sinais de atenção ao que se fazia lá por fora, sobretudo escutando e assimilando as lições nos Shadows, Beatles e dos yé yé franceses. Havia bandas, mas tocavam nos seus circuitos laterais, uma ou outra com disco editado. Ao mesmo tempo, a rádio era ainda, salvo uma ou outra excepção, dominada pelas vozes trabalhadas para canções para orquestra, modelos musicais fáceis e letras inconsequentes. A surpresa aconteceu quando uma das estrelas da rádio, Madalena Iglésias, surgiu entre as candidatas ao Festival da Canção de 1966 com uma canção pop de evidente travo surf (escutado em bandas californianas da época populares entre os mais novos). A letra, todavia, não mostrava ousadias de maior, alinhada na norma que servia a rádio lusitana da altura. A canção era assinada por um nome do establishment, mas olhava inesperadamente para outros azimutes, talvez a pensar na contaminação pop eurovisiva que se começava a manifestar. Ele e Ela ganhou o festival português e a 5 de Março de 1966 representou o país no Luxemburgo, onde colheu seis pontos (um dado pela Dinamarca e cinco por Espanha) a maior soma portuguesa até à data, em três anos de concursos, e um 13º lugar. A canção, e as restantes do EP que integrava, apesar do enorme êxito entre nós e também em Espanha, não reflectiu depois mudanças no rumo da carreira da cantora. É, todavia, das canções “pop” da colheita de 60 de que hoje há mais claras memórias em diversas gerações de ouvintes, não só na versão original, mas em leituras gravadas, respectivamente nos anos 80 e 90, pelos Mler Ife Dada e Entre Aspas.
MADALENA IGLÉSIAS “Ele e Ela” (Alvorada, 1966)
Lado A: Ele e Ela (Carlos Canelhas) + Rebeldia (F Carvalho / J Bragança)
Lado B: Caminhos Perdidos (T Belo / J Filipe / AS Freitas) + Dançar Dançar (JC Pinto / F Nicholson)
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