quinta-feira, dezembro 08, 2005

Dakota, 1980

Provavelmente, é esta a matéria viva dos mitos. Quando olhamos para a multidão em torno do edifício do Dakota, algures em 1980, ainda sob o efeito brutal da morte de John Lennon, revemos mais do que o lugar do seu assassinato e as formas do seu luto. Compreendemos, acima de tudo, que o mito pode ser uma via afectiva e ritual para lidar com o silêncio irrecuperável da morte. Há algo de egoísta nesse gesto: consumamo-lo para acreditarmos que vale a pena continuar a viver. Mas é um egoísmo paradoxal: nele se exprime a fúria que impede que as nossas vítimas se desvaneçam na bruma impessoal da história de todos os dias. Não estivemos lá, mas é como se lá tivéssemos estado. Ninguém é perfeito.