quarta-feira, outubro 29, 2025

Jack DeJohnette (1942 - 2025)

De Jack DeJohnette dir-se-á, inevitavelmente, que a longa lista daqueles com que colaborou — de Miles Davis a Keith Jarrett, passando por Bill Evans, Sonny Rollins ou Herbie Hancock — bastará para definir a excepcionalidade do seu lugar na história do jazz. Assim é, sem dúvida, mas importa não esquecer os registos em nome próprio de uma discografia imensa em que a sua arte como baterista, dispensando protagonismos pueris, deixou marcas indeléveis em todas as composições em que participou.
Nascido a 9 de agosto de 1942, em Chicago, DeJohnette faleceu em Kingston, Nova Iorque, no dia 26 de outubro — contava 83 anos. Eis uma das suas peças na companhia de Keth Jarrett e Gary Peacock, e um solo espectacular publicado por Bernhard Castiglioni, fundador do Drummerworld.com.
 



>>> Site oficial de Jack DeJohnette.
>>> Obituário no DownBeat.

O equilíbrio do dia [citação]

>>> O gatilho cedeu, toquei na superfície lisa da coronha, e foi aí, com um barulho ao mesmo tempo seco e ensurdecedor, que tudo principiou. Sacudi o suor e o sol. Compreendi que destruíra o equilíbrio do dia, o silêncio excepcional de uma praia onde havia sido feliz. Voltei então a disparar mais quatro vezes contra um corpo inerte, onde as balas se enterravam sem se dar por isso. E era como se batesse quatro breves pancadas à porta da desgraça.

ALBERT CAMUS
O Estrangeiro
> tradução de António Quadros
(ed. Livros do Brasil, 2015)

domingo, outubro 26, 2025

A miragem de Taylor Swift

Ser ou não ser uma estrela, eis a questão: subitamente, há uma canção que nos fala de Elizabeth Taylor... — este texto foi publicado no Diário de Notícias (10 outubro).

[Instagram]
Na velocidade alucinante da (des)informação audiovisual em que vivemos, eis um curioso contraste de imagens que, de uma maneira ou de outra, tem pontuado o nosso quotidiano. Assim, por um lado, revemos Greta Thunberg como expressão de uma postura militante que não desiste de fundamentais valores humanistas ignorados em muitos sectores da vida económica e da acção política. Ao mesmo tempo, por outro lado, Taylor Swift lança o seu 12º álbum de estúdio, The Life of a Showgirl, apoiado por uma série de fotografias com assinatura da dupla Mert Allas/Marcus Piggott que serviram para criar cerca de uma dezena de sugestivas capas para o novo registo.
Identificar assim as duas figuras e as respectivas imagens não significa qualquer aproximação (seja ela ecuménica ou conflituosa) das respectivas formas de existência mediática, nem sequer através do factor “feminino”. Afinal de contas, Thunberg tem 22 anos e Swift está a poucas semanas de completar 36, pelo que até mesmo o eventual uso da palavra “juventude” para classificar a sua coexistência no espaço da comunicação global não passaria de mais um gesto gratuito do pobre imaginário “juvenil” com que muitas formas de televisão tentam resumir a complexidade das pessoas, dos seus contextos e também do seu papel simbólico. Trata-se apenas de reconhecer que, em última instância, tal coexistência enriquece e alimenta a pluralidade do mundo.
No território específico do espectáculo, o protagonismo de Swift é tanto mais interessante quanto a sua trajectória profissional nunca dispensou alguma reflexão sobre as formas de representação do seu trabalho — e também, necessariamente, de auto-representação (a começar pelos estereótipos juvenis do seu primeiro álbum, homónimo, lançado em 2006). Acontece que para The Life of a Showgirl as escolhas dessa teatralização, afinal inerente a qualquer linguagem do espectáculo, se faz através de um insólito recuo temporal, tão conciso quanto irónico — as sofisticadas imagens de Allas/Piggott são a bandeira ambivalente desse verdadeiro processo dramatúrgico.
Poderemos considerar que o título do álbum se refere a “A vida de uma bailarina”, destacando a dança como valor inerente às suas performances (dos palcos aos telediscos), à semelhança de várias estrelas contemporâneas da música popular. O certo é que a palavra “showgirl” arrasta uma antologia de memórias que, pelo menos no contexto do “entertainment” americano, excede os limites de um estilo ou uma técnica.
Nos primórdios do cinema sonoro, e através de muitas associações com o imaginário da Broadway, a “showgirl” pertence ao mundo das chamadas Gold Diggers que, além do guarda-roupa exuberante (que Swift recria com grande pormenor), se distinguem pelas monumentais coreografias dos seus números musicais — lembremos, a esse propósito, o génio de encenação de Busby Berkeley em filmes como Gold Diggers of 1935 (1935), Gold Diggers of 1937 (1936) e Gold Diggers in Paris (1938). Para lá do género musical, o artifício da “showgirl” é mesmo um elemento espectacular que contamina muitas personagens do espectáculo, de uma vedeta do mudo como Theda Bara (Cleópatra num filme de 1917) até aos delírios visuais de Lady Gaga na sua emblemática digressão "The Monster Ball" (2009-2011).
Com Taylor Swift, tudo isso se reencena num jogo contido de humor e nostalgia, já que a “showgirl” que ela elege como modelo é alguém cujo imaginário se rege por componentes artísticas e simbólicas bem diferentes. A saber: Elizabeth Taylor (1932-2011). Encontramos mesmo no álbum uma canção intitulada Elizabeth Taylor, espelhando as amarguras decorrentes da conjugação de euforia e solidão, celebração e abandono, que a condição de estrela pode arrastar.
Lembrando os filmes de Elizabeth Taylor, de A Coragem de Lassie (1946) a Quem Tem Medo the Virginia Woolf? (1966), passando por Um Lugar ao Sol (1951), Gata em Telhado de Zinco Quente (1958) ou Cleópatra (1963), será que todos os ouvintes do novo álbum têm imagens para associar ao nome da “showgirl” que ela evoca? Movemo-nos, assim, num deserto de símbolos: num misto de pedagogia e poesia, Swift assume-se como miragem de uma ideia de “star” que se vai apagando nas nossas memórias.

sexta-feira, outubro 24, 2025

Bugonia — nostalgia, provavelmente

E se a ficção científica à maneira da década de 1950, quase naïf, envolvente no seu simbolismo, nostálgica na procura da inocência perdida, voltar a ser possível?

BUGONIA (2025)
Yorgos Lanthimos
 

terça-feira, outubro 21, 2025

domingo, outubro 19, 2025

Easy Riders, Raging Bulls — o filme

Easy Riders, Raging Bulls (Simon & Schuster, 1998), de Peter Biskind, é um livro fundamental para compreender as convulsões do cinema americano ao longo das décadas de 1960/70 e os seus efeitos, realmente revolucionários, nas estruturas de Hollywood. O respectivo subtítulo é esclarecedor: How the Sex-Drugs-and-Rock 'N Roll Generation Saved Hollywood.
O livro deu origem a um documentário, homónimo, realizado por Kenneth Bowser. Revelado, extra-competição, no Festival de Cannes de 2003, é uma peça preciosa para conhecer o que aconteceu entre Easy Rider (1969) e Raging Bull (1980) — aqui está, em ficheiro do YouTube.
 

sábado, outubro 18, 2025

James Lipton e o Actors Studio — uma memória

Na nossa sessão da FNAC dedicada a James Dean e ao Actors Studio não podíamos deixar de evocar a personalidade emblemática de James Lipton (1926-2020), escritor, actor, apresentador da notável série de conversas Inside the Actors Studio (1994-2018). Em destaque esteve em particular o ritual das 10 perguntas com que Lipton iniciava as conversas com os seus 277 convidados. Aqui fica uma breve evocação de Lipton, no momento do seu desaparecimento, nos ecrãs da NBC (3 março 2020).

James Dean: a herança do Actors Studio
* SOUND + VISION Magazine / FNAC [ hoje, 18 out. ]

Símbolo lendário da revolução do Actors Studio em Hollywood, James Dean morreu há 70 anos — Nuno Galopim e João Lopes revisitam a sua época e a sua herança.

>>> FNAC Chiado — hoje, dia 18 outubro, 17h00.