quinta-feira, dezembro 31, 2015

A IMAGEM: Steve Nease, 2015

STEVE NEASE
2016 Baby
28 Dez. 2015

Museu Chaplin abre em 2016

The Criterion Collection
O Museu Chaplin será uma realidade em 2016, relançando para as novas gerações as memórias do homem que criou o mais célebre vagabundo da história da humanidade — este texto foi publicado no Diário de Notícias (26 Dezembro), com o título 'A actualidade do legado de Charlie Chaplin'.

O ano de 2016 vai trazer, por certo, um renovado interesse pela figura lendária de Charles Spencer Chaplin, ou apenas Charlie Chaplin, como ele assinava os seus filmes — ou ainda: Charlot. Assim, na Primavera, o Museu Chaplin será, finalmente, uma realidade. Anunciado como um empreendimento que cruzará as memórias de uma obra universal com as componentes da mais moderna tecnologia de preservação, divulgação e estudo das matérias cinematográficas, o museu resulta da adaptação da propriedade de Manoir de Ban, na Suíça, próximo do Lago Léman, onde Chaplin viveu os últimos 25 anos da sua existência [video: Euronews].


Dir-se-ia que a sua figura lendária atrai os números redondos das efemérides. Lembremos que o homem que criou o mais célebre vagabundo da história da humanidade, nos deixou numa data simbólica, entre todas: faleceu no dia de Natal de 1977, contava 88 anos (nasceu a 16 de Abril de 1889, em Londres). 2015 foi o ano em que se assinalou a passagem de um século sobre a produção de The Tramp (O Vagabundo), precisamente a curta-metragem que consolidou essa personagem que, através das suas aventuras e desventuras, se inscreveu no imaginário colectivo como a encarnação de uma lógica de sobrevivência sempre enredada com as grandezas e misérias da condição humana.
O ano que está a chegar envolve uma especialíssima efeméride: passam 80 anos sobre a estreia (em Nova Iorque, a 5 de Fevereiro de 1936) de Tempos Modernos, por certo a longa-metragem de Chaplin cuja simbologia, tanto ética como política, há muito transcendeu qualquer barreira histórica ou ideológica.
Fábula sobre a desumanização ligada a muitas formas de desenvolvimento industrial, Tempos Modernos representa o encerramento daquilo que poderíamos designar como o “ciclo clássico” do seu criador. Desde logo, porque se trata do derradeiro filme em que surge a personagem do vagabundo, identificado no genérico como “trabalhador fabril”. Charlot é uma figura anónima no interior de uma gigantesca cadeia de produção, vivendo um dia a dia de horários austeros e rotinas severas que, em última instância, foi formatando os seus gestos — a sequência em que tenta manter o ritmo imposto pelas máquinas, repetindo movimentos que transformaram o seu corpo num bizarro autómato, consolidou-se como metáfora deliciosamente burlesca dos excessos da industrialização.
O projecto de Tempos Modernos surgiu durante uma digressão mundial de 18 meses (1931-32), tendo como objectivo principal a promoção de Luzes da Cidade, cuja estreia americana ocorrera nos primeiros dias de 1931. O conhecimento da crise económica na Europa, contaminada pelos sinais de ascensão das forças nacionalistas, levou Chaplin a estudar com afinco as convulsões da economia, defendendo publicamente a sua visão de uma sociedade utópica em que a liberdade humana nunca seria condicionada pelo progresso tecnológico. Numa entrevista dada ainda em 1931, condensou tal visão, afirmando: “O desemprego é a questão vital. A maquinaria deve beneficiar a humanidade, não gerar uma tragédia em que os seres humanos não têm trabalho.”
Curiosamente, Tempos Modernos ficaria também como derradeira expressão da resistência estética de Chaplin à mais radical evolução técnica do próprio cinema: o advento do som que, convém lembrar, se impusera no mercado quase uma década antes (O Cantor de Jazz, com Al Jolson, surgira em 1927). Sem ser exactamente um filme mudo, Tempos Modernos distingue-se por uma banda sonora em que as vozes escasseiam e quase tudo se exprime através de ruídos e música. Nele encontramos Smile, uma das mais célebres canções compostas por Chaplin, ao longo das décadas recriada por nomes como Nat King Cole, Tony Bennett [video] ou Barbra Streisand — Robert Downey Jr. interpreta-a no filme biográfico Chaplin (1992), realizado por Richard Attenborough.


Ecoando também o gosto de Chaplin pelo cinema como um evento a que, no limite, basta o som da música, a divulgação da sua obra para os espectadores do séc. XXI está a passar por muitos “filmes-concerto”. Consultando o seu site oficial, podemos verificar que, da Suíça a Hong Kong, passando por Espanha, Alemanha, EUA, etc., há cerca de quatro dezenas de concertos agendados para o primeiro semestre de 2016 — A Quimera do Ouro (1925), Luzes da Cidade e Tempos Modernos são os filmes mais frequentemente projectados em tais espectáculos.
Na sequência da reposição de vários títulos de Chaplin em magníficas cópias restauradas, o ano que agora termina foi também particularmente rico no espaço específico dos livros. A edição mais surpreendente terá sido Charlie Chaplin – L’Album Keystone: L’Invention de Charlot (Xavier Barral, Paris), uma memória iconográfica dos primeiríssimos títulos rodados por Chaplin, para os estúdios Keystone, ao longo do ano de 1914. Os fotogramas desses pequenos filmes foram recolhidos e preservados, durante a década de 40, por H. D. Waley, na altura um dos directores do British Film Institute. Entretanto, na sua série de álbuns gigantes dedicados a grandes referências cinematográficas, a editora Taschen publicou The Charlie Chaplin Archives [capa], com coordenação de Paul Duncan, integrando documentos cedidos pelos herdeiros de Chaplin, compilados e tratados pela Cinemateca de Bolonha.
Em Luzes da Ribalta (1952), respondendo às angústias da bailarina Terry (Claire Bloom), o envelhecido palhaço Calvero (Chaplin), dizia-lhe: “Há uma coisa tão inevitável como a morte — é a vida” [video, com legendas em espanhol]. Tendo em conta que esse filme possui o fôlego de um genuíno testamento artístico, podemos condensar a herança do homem que inventou Charlot nesse paradoxo: a frieza do destino não exclui a energia da vida. Ou ainda: o riso e as lágrimas são apenas duas faces da mesma moeda.

Guia para The Dead Weather [3]

[ 1: Hang You from the Heavens + Are 'Friends' Electric? ]
[ 2: Treat Me Like Your Mother + You Just Can't Win ]


O primeiro álbum, Horehound, chegou a 14 de Julho de 2009, na sequência de três semanas de gravações, em Janeiro desse ano, nos Third Man Studios — uma obra enraizada num assumido primitivismo de garage rock, ao mesmo tempo capaz de transmitir uma sensação de sereno experimentalismo. De novo com assinatura de David Swanson, o teledisco de Will There Be Enough Water?, um blues acústico assinado por Jack White e Dean Fertita, organiza-se como uma homenagem à tradição dos discos de vinyl — declaração ética, filiação estética.


>>> Site oficial de The Dead Weather.

Aretha Franklin canta Carole King

Carole King foi uma das personalidades homenageadas na 38ª gala do Kennedy Center, realizada a 6 de Dezembro. A celebração da sua música teve um momento de invulgar energia e comoção na interpretação do clássico (You Make Me Feel Like) A Natural Woman pela inigualável Aretha Franklin. Composto por King e Gerry Goffin, o tema foi lançado por Franklin, em single, no ano de 1967 — agora, cantou-o para uma ilustre plateia que incluía o casal Obama.
Os outros homenageados no espectáculo foram o realizador George Lucas, a actriz e cantora Rita Moreno, o maestro Seiji Ozawa, e a actriz e estrela da Broadway Cicely Tyson — informações no site do Kennedy Center.

quarta-feira, dezembro 30, 2015

Ellsworth Kelly (1923 - 2015)

FOTO: Artsy.net
Figura fundamental do universo abstracto, o pintor americano Ellsworth Kelly faleceu no dia 27 de Dezembro, na sua casa de Spencertown, Nova Iorque — contava 92 anos.
Em 1997, na introdução ao catálogo de uma retrospectiva de Kelly na Tate, em Londres, Diane Waldman, responsável pela sua organização, lembrava três factores que tinham contribuído para que o reconhecimento do pintor fosse ainda relativamente recente: "(...) a resistência do público à chamada abstracção pura; a ausência, nos primeiros anos da sua carreira, dessa notoriedade instantânea que se tornou uma componente da arte desde o tempo de Marcel Duchamp; e o facto de ele continuar a laborar em ideais que começou a explorar em finais da década de 40."
Podemos, talvez, dizer isto de outro modo: na sua procura de uma depuração das formas e das cores que, por vezes, equivocamente, levou à sua inscrição na dinâmica Pop dos anos 60 (que, afinal, ele precede e, de algum modo antecipa), Kelly foi sempre um criador de efusiva ambiguidade: forçando sempre um pouco mais o apelo futurista de todas as experimentações e, ao mesmo tempo, permanecendo fiel a um gosto de abstracção que, afinal, o definia como um dos "primitivos" do século XX. As singularidades da sua arte, oscilando entre as emoções da percepção quotidiana e o indizível da construção de um olhar individual poderão, talvez, resumir-se nestas palavras exemplares, proferidas em 1996: "As minhas pinturas não representam objectos. São elas próprias objectos e percepções fragmentadas das coisas."
A sua primeira exibição individual ocorreu em Paris, em 1951. A primeira retrospectiva foi organizada pelo MoMA, em 1973. Em 1993, a Galeria Nacional do Jeu de Paume, em Paris, apresentou "Ellsworth Kelly: Os anos franceses, 1948–54". Em 2013, o Presidente Obama atribuiu-lhe a Medalha Nacional das Artes, considerada a maior honra nacional a celebrar a excelência artística.
1949. Janela
1951. Cores para um grande parede
1972. Sem título
2008. Azul, cinzento, verde, vermelho
>>> Ellsworth Kelly falando sobre o seu trabalho no âmbito de uma exposição, em 2012, no Los Angeles County Museum of Art.


>>> Obituário no New York Times.
>>> Ellsworth Kelly no MoMA e no Museu Guggenheim.

Masculino/feminino em português (2/2)

O cineasta de O Lugar do Morto volta a contar uma história eminentemente portuguesa, agora em cenários de Viseu — este texto foi publicado no Diário de Notícias (24 Dezembro), com o título 'Sinais do tempo'.

[ 1 ]

No começo da filmografia de António-Pedro Vasconcelos, logo após a primeira longa-metragem, Perdido por Cem (1973), encontramos um exercício de raiz documental que valeria a pena revisitar. Chama-se Adeus, Até ao Meu Regresso (1974) e o seu título retoma uma expressão corrente dos tempos pré-25 de Abril: na televisão, nas “mensagens de Natal” dos soldados mobilizados para as chamadas províncias ultramarinas, era frequente cada um dos intervenientes concluir os seus votos familiares com a expressão “adeus, até ao meu regresso”.
A.-P. V.
Ao apropriar-se de tais palavras como uma espécie de mantra de uma vivência de angustiada nostalgia, o filme conseguia uma proeza que envolvia tanto de cinematográfico como de simbólico: a frase feita (na medida em que consagra a interminável repetição de um sentido que tende para o esvaziamento) adquiria uma perturbante função reveladora — afinal, na monotonia triste das palavras, pressentíamos a infinita diversidade dos destinos individuais.
Creio que podemos dizer algo de semelhante a propósito dos frágeis “heróis” de Amor Impossível, o par que Victoria Guerra e José Mata compõem numa luminosa avalancha de emoções: são jovens “dos nossos dias” que, em qualquer caso, se revelam para além dos padrões dominantes da ficção, a começar, claro, pelas formatações psicológicas e morais da telenovela. Aliás, a decisiva importância do trabalho dos actores (Soraia Chaves e Ricardo Pereira, nas personagens dos investigadores policiais, são também impecáveis) é reveladora da ambição dramatúrgica do cinema de António-Pedro Vasconcelos: confrontar-nos com sinais que reconhecemos facilmente e, ao mesmo tempo, fazer-nos compreender que nada está adquirido no reino das relações humanas. No limite, conhecer o outro é uma tarefa impossível.

terça-feira, dezembro 29, 2015

A IMAGEM: Dominique Issermann, 2015

DOMINIQUE ISSERMANN
Vanessa Axente [ Chanel ]
2015

Que cinema europeu?

Esta é a estatueta dos Prémios do Cinema Europeu... mas quem ouviu falar neles? — este texto foi publicado no Diário de Notícias (25 Dezembro), com o título 'Que Europa?'.

Pensemos no mais solitário espectador de televisão, algures no continente europeu, longe de qualquer centro urbano, dependente do seu pequeno ecrã para saber como vai o mundo... E formulemos uma pergunta rudimentar: será que esse espectador tem conhecimento da estreia do episódio VII da saga Star Wars? Mesmo sem a ajuda de qualquer estudo sociológico feito por uma dessas “agências de comunicação” que conseguem enviar 57 mails por dia sobre coisa nenhuma, atrevo-me a responder afirmativamente — em boa verdade, creio que esse espectador sabe mais sobre a herança cinematográfica de Han Solo do que sobre os dramas ponderados na recente cimeira dedicada aos problemas do clima.
Pensemos ainda no mesmo espectador e perguntemos o que é que ele sabe — ou melhor, que informação lhe chegou — sobre os prémios da Academia de Cinema Europeu que consagraram o filme A Juventude, do italiano Paolo Sorrentino? Mesmo correndo o risco de alguma precipitação estatística, atrevo-me a supor que ele nem sabe da existência de tais prémios.
Enfim, peço-vos que não confundam estas observações com um qualquer panfleto anti-americano para fazer furor nas zonas mais miseráveis das redes “sociais”. Além do mais, simpatizo com o modo como o novo Star Wars recupera a herança de George Lucas e há muitos anos que considero (e tenho escrito) que falta à Academia de Cinema Europeu uma estratégia mais elaborada e convincente (e, por certo, mais dispendiosa) de promoção dos filmes do nosso continente.
A questão que aqui relanço é de outra natureza. Aliás, do meu ponto de vista, ela permaneceria mesmo que o novo Star Wars fosse uma avalanche de mediocridades e o cinema europeu um prodígio de marketing. Acontece que vivemos numa Europa audiovisual saturada de discursos de exaltação da nossa “cultura” e carente da mais básica atenção aos respectivos produtos. E até estou a usar a linguagem dos profissionais do marketing: é que eles já não dizem “filmes”, mas “produtos”...

segunda-feira, dezembro 28, 2015

As canções de 2015:
Ghost Culture, Lucky



Editado logo em janeiro, e algo ignorado nos 11 meses que se seguiram (apesar de representar mais uma assinatura pela etiqueta Phantasy (de Erol Alkan), o álbum de estreia do projeto Ghost Culture revelou uma das mais interessantes entre as novas propostas de 2015 talhadas com ferramentas eletrónicas. Aqui se revelava mais um caso nascido num quarto, entre a solidão, as ideias e as máquinas, a música evocando frequentemente um saber na relação das electrónicas e dos métodos da dança com a canção como, em finais dos 80 e inícios dos anos 90 encontrámos nos magníficos (e injustamente esquecidos) The Beloved.

As figuras de 2015:
David Fonseca


A edição de um primeiro álbum integralmente cantado em português poderia ser razão para a notícia. Mas foi a forma como David Fonseca pensou a comunicação da nova música que ajudou a fazer também desse magnífico Futuro Eu um disco de referência na sua discografia e entre o panorama atual da música portuguesa. Explorando as possibilidades da Internet, dos serviços de distribuição de imagem e som às redes sociais, David Fonseca encontrou o ritmo e o modelo certos para que as mudanças que propunha fossem apreendidas e assimiladas a pouco e pouco. Se a isto juntarmos os lançamentos em vinil (do álbum e dos singles) temos um ano cheio de bons acontecimentos.

As imagens de 2015:
Beatles em 'streaming'


Tinha havido um falso alarme, há algumas semanas, com uma contagem decrescente que, afinal, anunciava antes uma nova edição da antologia 1, juntando ao áudio os filmes que os Beatles foram criando para as suas canções, editados assim em DVD e Blu-ray. Agora, já com o final do ano em contagem decrescente, chegou a notícia de que a música dos Beatles ia chegar às várias plataformas de streaming na véspera de Natal. Um passo importante na confirmação deste como um espaço de futuro na distribuição da música gravada.

O Natal dos LCD Soundsystem

Os LCD Soundsystem não existem desde 2011 — tiveram mesmo um muito oficial (e fabuloso) concerto de despedida que está registado no filme Shut Up and Play the Hits. Enfim, nestas coisas aplica-se o lema clássico "nunca mais digas nunca"... e rumores não têm faltado sobre a possibilidade de uma reunião, em 2016, da banda comandada por James Murphy. Uma coisa é certa: os LCD reapareceram em pose natalícia, com Christmas Will Break Your Heart, no dizer de Murphy uma "deprimente canção de Natal" — aleluia!

007 por... Radiohead!

Pelos vistos, Writing's on the Wall, por Sam Smith, canção-tema da mais recente aventura de James Bond, Spectre, teve concorrência séria. De quem? Dos Radiohead. Como prenda natalícia, a banda de Thom Yorke divulgou o seu Spectre, rejeitado pela produção do filme — com estes votos: "Feliz Natal. Que a força esteja convosco."

domingo, dezembro 27, 2015

Haskell Wexler (1922 - 2015)

É um dos génios da história da fotografia em cinema: o americano Haskell Wexler faleceu no dia 27 de Dezembro, durante o sono, na sua casa de Santa Monica, California — contava 93 anos.
Com uma formação técnica como assistente de imagem, tanto em cinema como em televisão, Wexler teve o seu primeiro grande desafio profissional como director de fotografia de América, América (1963), de Elia Kazan. A mestria com que trabalhava o preto e branco repetir-se-ia em Quem Tem Medo de Virginia Woolf? (1966), de Mike Nichols, valendo-lhe a sua primeira nomeação da Academia de Hollywood e também o primeiro Oscar (foi o derradeiro ano em que a Academia atribuiu dois prémios de fotografia, para produções a cores e preto e branco). Conseguiria ainda mais quatro nomeações e um segundo Oscar, por Caminho da Glória (1976), de Hal Ashby.
O seu empenhamento na discussão dos temas políticos da sociedade americana levaram-no a desenvolver também um importante trabalho como realizador, sobretudo na área documental. Nessa sua trajectória, destaca-se uma ficção contaminada por muitos elementos documentais: Medium Cool (1969), sobre o trabalho de um operador de televisão na Convenção Nacional do Partido Democrata, em 1968 — foi lançado em Portugal em 1971, como América, América, Para Onde Vais?
Entre os títulos em que assumiu a direcção de fotografia incluem-se ainda No Calor da Noite (1967) e O Grande Mestre do Crime (1968), ambos de Norman Jewinson, Voando Sobre um Ninho de Cucos (1975), de Milos Forman, O Regresso dos Heróis (1978), de Hal Ashby, Los Angeles a Ferro e Fogo (1988), de Dennis Hopper, Blaze, Amor Proibido (1989), de Ron Shelton, e Limbo (1999), de John Sayles. Em 1993, a American Society of Cinematographers consagrou-o com um prémio de carreira.

>>> Imagens de dois filmes — Quem Tem Medo de Virginia Woolf? (Elizabeth Taylor) e O Regresso dos Heróis (Jon Voight e Jane Fonda) — fotografados por Haskell Wexler; em baixo, trailer de Medium Cool.


>>> Obituário em The Hollywood Reporter.

As canções de 2015:
Panda Bear, Tropic of Cancer



O álbum Panda Bear Meets the Grim Reaper foi dos primeiros a conhecer edição em 2015, sendo lançado pela Domino Records logo a 9 de janeiro, o que fez com que talvez escapasse a algumas das memórias retrospetivas apresentadas agora em fim de ano. Do alinhamento do sucessor de Tomboy vale a pena recordar, por exemplo, este Tropic of Cancer, que cruza melancolia com uma luminosidade soalheira e evoca sonoridades pop/rock francesas dos anos 60, pensadas como piscadelas de olho ao que chegava do outro lado do canal da Mancha, como as que então eram tão bem conduzidas por Françoise Hardy.

As figuras de 2015:
Max Richter


Uma das mais inesperadas criações de 2015 chegou com uma ideia que vai contra aquilo a que estamos habituados a pensar quando se fala de uma obra de arte. Estamos, de facto, habituados à ideia de que alguém cria algo que o alguém pode contemplar através de um ou mais entre os sentidos. Ou seja, um processo que prevê que se esteja desperto, atento, de preferência som a curiosidade suficiente para sentir, contemplar e até mesmo questionar. Mas e se a obra for pensada para, pelo contrário, servir as horas de sono? Em Sleep o compositor Max Richter apresentou uma peça com oito horas de duração. A sua ideia não é a de votar o seu trabalho a uma anulação da música perante o sono (desejado) do ouvinte. Mas antes a de criar uma música que pode ter nessa experiência uma das suas possíveis leituras.

As imagens de 2015:
Plutão, pela New Horizons


Nunca o tínhamos visto de perto. Mesmo "despromovido" a planeta-anão (numa das decisões menos marcantes da história recente da astronomia) o nosso vizinho distante descoberto em 1930 foi finalmente visitado este ano pela sonda New Horizons, da NASA, que de lá longe nos enviou imagens que revelaram um mundo que na verdade nunca tínhamos visto como agora o conhecemos. Do extenso volume de informação aprendemos muito mais sobre Plutão em poucos meses do que em longos anos de medições feitas a grande distância.

sábado, dezembro 26, 2015

Masculino/feminino em português (1/2)

O cineasta de O Lugar do Morto volta a contar uma história eminentemente portuguesa, agora em cenários de Viseu — este texto foi publicado no Diário de Notícias (24 Dezembro), com o título 'António-Pedro Vasconcelos filma os paradoxos da paixão'.

Vale a pena recordar que o cineasta que assina Amor Impossível é o mesmo cuja filmografia integra títulos como O Lugar do Morto (1984), Jaime (1999) ou Call Girl (2007). De facto, António-Pedro Vasconcelos tem-se assumido muitas vezes como retratista de um quotidiano português pleno de contrastes, por assim dizer oscilando entre o desencanto social e o apelo romântico, ou melhor, o gosto do romanesco.
Amor Impossível confirma a consistência de tal atitude. E não apenas porque o metódico trabalho de argumento de Tiago R. Santos se inspira em factos verídicos. Também porque estamos perante uma teia dramática em que uma questão central do cinema de António-Pedro Vasconcelos — como se constitui um par homem/mulher — adquire contornos muito particulares e, de alguma maneira, inesperados.
Num certo sentido, as personagens centrais não poderiam ser mais típicas, ou melhor, mais reconhecíveis. Cristina (Victoria Guerra) e Tiago (José Mata) são dois jovens unidos por uma paixão paradoxal. Há na sua relação uma energia visceral, de que o sexo será apenas o sinal mais evidente, que os transporta para um domínio puramente utópico — para Cristina, Emily Brontë é mesmo a referência inspiradora; ao mesmo tempo, porém, sabemos praticamente desde o começo que se trata de uma paixão funesta que, através de uma teia de flashbacks, vamos conhecer nos seus segredos mais perturbantes.
Para esta reconversão do romantismo em cruel assombramento, é essencial a entrada em cena de um outro par, Madalena (Soraia Chaves) e Marco (Ricardo Pereira), os polícias que investigam aquilo que se passou entre Cristina e Tiago. Dir-se-ia que cada par funciona como espelho ambíguo do outro, aliás expondo um tema que talvez possamos considerar transversal na obra do realizador. A saber: o contraste entre personagens femininas e masculinas, de alguma maneira revelando um equívoco fulcral em que a entrega mais radical parece atrair, perversamente, a mais insuperável distância afectiva. E não deixa de ser curioso que a ânsia romântica de Cristina tenha um momento fulcral na sua exaltação de O Monte dos Vendavais, em diálogo com um professor interpretado por... António-Pedro Vasconcelos.
Todas estas convulsões surgem integradas, não nos espaços mais tradicionais da cidade de Lisboa, mas sim em cenários de Viseu. Eis um “desvio” que importa assinalar, quanto mais não seja porque, para o melhor ou para o pior, muito cinema português tem-se mantido ligado à grande metrópole, aos seus lugares, enredos e personagens. Claro que o cinema não é um mero exercício “sociológico” e até mesmo um filme puramente abstracto pode manter relações viscerais com o nosso aqui e agora. Em todo o caso, a atenção da produção portuguesa ao tempo presente é um valor que importa sublinhar e reconhecer.

Medo [citação]

>>> Tanto a religião como o ocultismo retiram muito do seu poder da estimulação e manipulação simultânea do medo: ansiedade que atormenta os limites constantemente em mudança da personalidade e, em especial, os confins da morte. Quando as novas tecnologias reconfiguraram essas mesmas fronteiras, as sombras e as trevas que assombram a identidade humana começaram a verter do eu e muitas foram alojar-se nos espaços virtuais abertos pelas novas tecnologias.

ERIK DAVIS
Editorial Notícias, 2002

sexta-feira, dezembro 25, 2015

Natal punk

Há um ano e meio que os Green Day não lançavam uma nova canção. Agora, o jejum foi interrompido com um hino natalício, festivamente punk — aí está Xmas Time of the Year.

Seasons greeting cards and Christmas
Lights light up the city
At the end of the year

This time I got no resolutions
Giving thanks for nothing
But joy into the year

Tonight friends are what its worth
Peace and love on Earth
And another year giving thanks again

The sleigh bells deck the halls with good will
Say a prayer for lost souls
Christmas time of the year

Tonight friends are what its worth
...

Somewhere around a plastic manger
Giving thanks to strangers
Christmas time of the year

Fotografar "um estranho por dia"

Começou por ser uma página do Instagram. Agora é também um blog. Chama-se "Um Estranho por Dia" e o nome é para ser tomado à letra. Assim, quatro fotógrafos — Miguel A. Lopes, Rui Soares, Rui Miguel Pedrosa e João Porfírio — apostaram em seguir um método de trabalho cuja simplicidade tem tanto de desconcertante como de fascinante: para cada um deles, trata-se de, literalmente, fotografar um estranho por dia, criando uma rede de retratos em que o poder revelador das imagens surge sempre acompanhado por uma memória condensada da existência de cada um dos fotografados. Ou como identificar a singularidade daqueles com que nos cruzamos é também uma maneira de viver o mundo à nossa volta.

José António, 07 Dezembro 2015
[FOTO: Miguel A. Lopes]
Sara S., 11 Dezembro 2015
[FOTO: Rui Soares]
Gustavo D., 07 Dezembro 2015
[FOTO: Rui Miguel Pedrosa]
Alexandra G., 07 Dezembro 2015
[FOTO: João Porfírio]

Feliz Natal

quinta-feira, dezembro 24, 2015

Uma cantata de Bach

BACH
O Jesu Christ, Mein's Lebens Licht, BWV 118, uma cantata de Johann Sebastian Bach, composta em 1736-37 — aqui numa interpretação do Bach Collegium Stuttgart, sob a direcção do maestro Helmuth Rilling.

A IMAGEM: Elliott Erwitt, 1956

ELLIOTT ERWITT
Marilyn Monroe
1956

Jane Fonda na primeira pessoa

Jane Fonda está nomeada para um Globo de Ouro (actriz secundária) pela sua breve, mas magnífica, composição em A Juventude, de Paolo Sorrentino; alguns analistas da temporada dos prémios apostam que o seu papel a pode fazer chegar também às nomeações para os Oscars — esta entrevista foi realizada durante o Festival de Cannes (Maio 2015) e foi transmitida pela SIC Notícias.

Natal vs. cinefilia

Os filmes de Natal são uma tradição que, de facto, se foi decompondo com o tempo (e as televisões) — este texto foi publicado no Diário de Notícias (20 Dezembro), com o título 'O Natal cinéfilo já não é o que era''.

Nas vésperas do Natal de 2004, Polar Express, de Robert Zemeckis, surgiu como uma aposta renovadora no panorama cinematográfico da quadra festiva. Apesar de contar com Tom Hanks como cabeça de cartaz, a história de uma criança que viaja até ao Pólo Norte, na expectativa de um encontro com o Pai Natal, tinha como verdadeira vedeta a tecnologia. De tal modo que entrou no Livro de Recordes do Guinness como o primeiro filme integralmente fabricado através do método de motion capture (por vezes referido como performance capture).
Que estava em jogo? A possibilidade de criar um universo de fantasia desenhada, não através da animação tradicional, mas sim começando por filmar com actores de carne e osso. Na prática, o motion capture envolve uma rodagem prévia com os intérpretes, a partir da qual se cria uma base de movimento e acção que, por sua vez, é sujeita a um tratamento característico de um desenho animado. Polar Express conseguiu um impacto comercial apenas mediano, mas abriu todo um novo capítulo expressivo que tem vindo a ser prolongado através de experiências como Beowulf (2007), também de Zemeckis, ou As Aventuras de Tintin (2011), de Steven Spielberg.
Onde estão, então, os filmes de Natal? Pois bem, por mais que custe às boas almas, quase desapareceram. Desde logo, porque as televisões generalistas há muito reduziram o leque de propostas cinematográficas, aliás reforçando uma secundarização do cinema que, como é óbvio, está longe de se limitar à época natalícia. Depois, porque a lógica do mercado (por certo reflectindo um abalo sociológico que valeria a pena analisar) tende a privilegiar outros produtos: este ano, os trunfos principais de Hollywood são mesmo o regresso da saga Star Wars, e um “western” para adultos, The Hateful Eight, com assinatura de Quentin Tarantino.
É, por isso, com convicta nostalgia que evocamos mestres como Jean Renoir (A Vendedeira de Fósforos, 1928), Vincente Minnelli (Não Há como a Nossa Casa, 1944) ou Frank Capra (Do Céu Caíu uma Estrela, 1946). Mesmo não menosprezando as maravilhas técnicas do cinema deste século, os seus filmes falam-nos de gente muito viva, com actores e actrizes que ainda nem sequer conheciam os desvios digitais que podiam enriquecer (?) as suas personagens..
Na verdade, a cinefilia já não é o que era. No Natal, ou a propósito do Natal, a tradição acabou mesmo por integrar sentimentos perturbantes e contraditórios, como o sarcasmo que encontramos na personagem de um duende interpretado por Will Ferrell (Elf, o Falso Duende, 2003) ou a rede de desencantos que define uma família “como as outras”, observada por Arnaud Desplechin (Um Conto de Natal, 2008).
No mercado português, há, apesar de tudo, um arremedo de tradição. Assim, no dia 24 chegará às salas escuras Snoopy e Charlie Brown, não um típico filme de Natal, mas pelo menos uma celebração de uma infância que, ironicamente, combate as ideias feitas dos adultos. Em qualquer caso, o verdadeiro espírito da quadra está no mais inusitado dos filmes: chama-se Coração de Cão e envolve uma tocante mensagem de ternura e solidariedade assinada por Laurie Anderson. O pretexto é “apenas” a morte de Lolabelle, a cadela da autora, mas se este é o momento de celebrar a vida e o amor, então não haverá filme mais natalício.

quarta-feira, dezembro 23, 2015

As canções de 2015:
Baio, Sister of Pearl



Um dos elementos dos Vampire Weekend (que este ano estiveram em pousio), Chris Baio apresentou em 2015 um álbum de estreia, significativamente mais vitaminado em boas ideias do que os máxis que antes tinha já revelado. Aqui mostrou um talento pop, sem contudo evitar um relacionamento com as dinâmicas da música de dança. Este tema, contudo, é dos que mais seguem um certo classicismo que Baio tão bem assimila neste disco.

As figuras de 2015:
Harper Lee


Muitos, muitos anos depois, descoberto num cofre na casa onde em tempos tinha vivido, o texto datilografado com o romance que originalmente tinha sido entregue a um editor e do qual, sob a sugestão deste, a escritora valorizou os flashbacks e criou antes To Kill a Mockingbird (que se afirmaria como um dos maiores clássicos da história da literatura americana), finalmente viu não só a luz do dia mas os olhos de muitos leitores. Lançado entre nós como Vai e Põe Uma Sentinela (Go Set a Watchman no original), o livro foi um dos fenómenos do ano. E juntou, 55 anos depois, um segundo romance à obra de Harper Lee.

As imagens de 2015:
Os ataques em Paris


Uns viam um concerto. Outros jantavam fora. E havia quem estivesse a ver um jogo de futebol. Meses depois de um raid contra a redação do Charlie Hebdo, a mesma cidade conhecia outra expressão da violência e intolerância jiadista. A mesma que destrói património no Iraque e na Síria (e nem vamos aqui falar agora do tráfico de obras de arte). Naquela noite de 13 de novembro o ataque foi contudo contra uma forma de viver. Uma cultura. Uma cultura que preza a tolerância,  a liberdade... Que se expressa pela arte, na forma de escolher onde e o que se come, que se manifesta no desporto. Há que defender esta cultura. E de não deixar de ir ver concertos, nem ir comer fora (se a bolsa o permite, coisa que já não é assim tão comum) ou ir ver um jogo de futebol.

Viva o cinema em 70mm!

Os grandes formatos voltam a ser uma força motriz do mercado cinematográfico — este texto foi publicado no Diário de Notícias (20 Dezembro), com o título 'O renascimento dos filmes em 70mm'.

A história do pensamento cinematográfico ensina-nos que a demagogia populista tende a censurar o simples gosto de pensar e argumentar em torno da especificidade de cada filme. Observe-se o que, não poucas vezes, acontece com os blockbusters intercontinentais. Na prática, tendem a ser compreendidos (?) como meras proezas de marketing, gerando uma vaga de notícias susceptível de contrariar a mais básica abertura à complexidade, contrastes e contradições da história económica dos filmes — sendo essa história uma parte fulcral da sua história cultural.
A conjuntura actual é motivadora. O espectacular impacto do novo episódio de Star Wars justifica alguma atenção que não ceda à estupidez de valorizar os filmes em função do volume “maior” ou “menor” da respectiva bilheteira (embora fosse interessante discutir as hipóteses comerciais de um filme que ocupe, por exemplo, dois ou três ecrãs face a outro que tenha direito a mais de uma centena). Acontece que os herdeiros da saga de George Lucas estão a ajudar a reabrir uma questão interessantíssima que, sendo industrial e comercial, é também criativa e artística.
A proliferação de grandes ecrãs, em particular das novas salas IMAX, servindo filmes especificamente pensados para as suas dimensões (e também para o respectivo envolvimento sonoro), veio relançar uma interrogação fundamental: será que a sua oferta pode ajudar a mobilizar os espectadores que, imbuídos dos valores da nova cultura digital, tendem a privilegiar os seus aparelhos personalizados (computador, telemóvel, etc.), distanciando-se da experiência social da sala escura?
Curiosamente, um dos efeitos colaterais desta “nova vaga” de filmes que apostam numa certa imponência física envolve a revalorização do velho formato de 70mm. E não apenas no plano simbólico. Assim, o novo filme de Quentin Tarantino, The Hateful Eight, não só foi rodado nesse formato como será lançado no dia de Natal, nos EUA, numa centena de salas equipadas ou reequipadas com sistemas de projecção para a película de 70mm, entrando no circuito digital nos primeiros dias de Janeiro (a data da estreia portuguesa continua por anunciar).
Entretanto, foi noticiada a intenção da Warner Bros. lançar Batman v. Superman: The Dawn of Justice (Março de 2016) com um número significativo de cópias de 70mm. Mais do que isso: sendo esse mesmo estúdio detentor dos direitos de algumas das superproduções da década de 60 que utilizaram o formato — incluindo o emblemático Lawrence da Arábia (1962), de David Lean —, a sua eventual reposição em 70mm pode contribuir para uma significativa reconversão de estratégia, conceitos e práticas da distribuição e exibição cinematográfica.
Está em jogo, afinal, a recuperação de importantes sectores de público que desistiu de uma relação regular com as salas. Escusado será dizer que nada disso se poderá, ou deverá, fazer sem atender à necessidade de defender a pluralidade dos mercados (em particular dos mais pequenos e vulneráveis), integrando os filmes “grandes” e “pequenos”. Em qualquer caso, importa não menosprezar a dimensão dos ecrãs como um dos factores de mobilização de espectadores. E também de partilha do prazer de assistir a um filme.

domingo, dezembro 20, 2015

The Gift, 20 anos — e mais além

Não era um concerto de surpresas, nem concebido exactamente para surpreender. The Gift — na foto, da esquerda para a direita: Miguel Ribeiro, John Gonçalves, Sónia Tavares e Nuno Gonçalves — estiveram no Meo Arena para revisitar 20 anos de carreira, como quem experimenta os seus próprios limites. Ou seja: tacteando os contornos do que podem ser os próximos 20 anos.
Foi uma celebração que teve de tudo um pouco: energia musical, saber de palco, intimismo contido e ruído colectivo, e até alguns benignos percalços com o sistema de video... Em termos práticos, The Gift mostraram o sentido mais essencial da sua persistente e coerente independência — não é uma mera pose, nem um rótulo mediático, antes a genuína verdade de uma banda que continua a saber conciliar uma lógica experimental com uma cuidadosa gestão de carreira. Não faltou sequer, em exercício sem rede (literalmente), uma versão do My Way, de Sinatra, que a voz de Sónia defendeu com serena convicção.
Uma escolha? Se for apenas uma: Laura, do velhinho e insubstituível Digital Atmosphere (1997).


>>> Site oficial de The Gift.

sexta-feira, dezembro 18, 2015

"Star Wars": elogio dos actores

Star Wars está mesmo de volta — esta nota foi publicada no Diário de Notícias (17 Dezembro), com o título 'Elogio das personagens'.

Vale a pena fazer um esforço para além dos efeitos mais simplistas induzidos pelo poder planetário do marketing. Não se trata, de facto, de reabrir a guerra estúpida entre cinema "comercial" e filmes de "autor", mas sim de avaliar de que modo J. J. Abrams retoma a herança de George Lucas, em particular da trilogia inicial de Star Wars (sendo a segunda claramente menor). Em Star Wars: O Despertar da Força nem sempre se terá evitado um certo efeito de "videojogo", hoje em dia dominante em muitas grandes produções. O certo é que este VII episódio, ainda que preservando a nostalgia dos heróis do passado, consegue criar uma nova galeria de personagens que refazem os dramas (familiares, antes do mais) de aventuras anteriores, deixando as necessárias pontas soltas a ser retomadas nos episódios seguintes. Destaque absoluto para Daisy Ridley (inglesa, 23 anos), intérprete de Rey, afirmando invulgares qualidades de interpretação — não tenhamos dúvidas que a sua história cinematográfica irá projectá-la muito para além desta galáxia.

quinta-feira, dezembro 17, 2015

Ver + ouvir:
David Bowie, Lazarus



E depois de Blackstar eis que chega um segundo tema do novo álbum a editar a 8 de janeiro. Além da canção-título já conhecida e deste Lazarus é já sabido que o álbum inclui ainda novas gravações dos temas incluídos no single Sue (Or in a Season of Crime), lançado em finais de 2014.

O teledisco para esta canção será estreado dia 7 de janeiro, na véspera do lançamento do álbum.

A força despertou! Mesmo!


Acabou a travessia do deserto em que andava o universo Star Wars!

E hoje escrevi:

"Foram meses de espera, teaser após teaser, o trailer mais adiante e depois os mais curtos spots. As imagens iam apresentando personagens novas, recuperando velhas caras, mostrando novos espaços, recordando objetos, sublinhando sobretudo que a lógica do poderio digital em registo mais próximo do videojogo em que tinham vivido os filmes da segunda trilogia era coisa para esquecer. Falar do novo Star Wars: O Despertar da Força implica começarmos por aqui. Porque foram estas as primeiras janelas que se abriram, alimentando as esperanças de que os valentes tropeções das prequelas medíocres que o próprio George Lucas comandou a partir de 1999 não seria coisa a repetir-se por aqui… Agora, visto o filme, há que antes de mais elogiar o trabalho de quem fez os trailers e tesers… Porque ao contrário de tantos outros que temos visto nos últimos tempos, verdadeiras versões condensadas dos filmes, aqui nada da trama foi de facto sugerido. Despertou-se o apetite sem sequer desvendar um pedacinho da narrativa. Pelo que a “força” uma vez mais está com a história (e não com o arsenal digital). E convenhamos que há muito que um filme chegava a sala sem que a curiosidade fosse estragada por spoilers. E agora o filme. Sim, e que filme!"

Podem, ler aqui o que penso sobre o filme.

Hollywood sob o signo de "Star Wars"

J. J. Abrams
As notícias da ante-estreia, em Los Angeles, do novo episódio de Star Wars traduzem uma ideia básica: Hollywood está com o despertar da Força — este texto foi publicado no Diário de Notícias (16 Dezembro).

A Força está com os herdeiros de George Lucas? Podemos apostar que sim. De tal modo que a narrativa da primeira projecção oficial de Star Wars: o Despertar da Força, em Los Angeles, só podia ser a crónica de uma apoteose anunciada. O repórter do Los Angeles Times não resistiu a começar o seu texto em tom brincalhão: “A muito aguardada ante-estreia (...) realizou-se na segunda-feira à noite — e Hollywood apareceu em força (desculpem, mas já sabiam que tinha de ser)”.
Mesmo tendo em conta os padrões espectaculares da indústria americana e, em particular, dos estúdios Disney (proprietários da Lucasfilm, entidade produtora deste episódio VII e dos que se seguirão), a ante-estreia foi reconhecida como um evento de excepção pelos media americanos. Assim, foram realizadas projecções simultâneas nas três salas emblemáticas do Hollywood Boulevard — Dolby Theatre (palco habitual dos Oscars), TCL Chinese Theatre e El Capitan Theatre — para mais de cinco mil convidados. E se o aparato de segurança também pode caracterizar um acontecimento deste género, valerá a pena dizer que a polícia de Los Angeles mobilizou meia centena de agentes (tal como costuma acontecer em noite de Oscars).
Steven Spielberg
George Lucas e J. J. Abrams, respectivamente o criador da saga e o realizador do novo filme, foram as vedetas da noite. Em qualquer caso, Abrams (que tem entre mãos a produção de mais um episódio de Star Trek, agora com realização de Justin Lin) não deixou de agradecer a outro cineasta, também presente na ante-estreia, decisivo na sua escolha para dirigir O Despertar da Força — é ele Steven Spielberg.
Abrams e Harrison Ford (que retoma a figura heróica de Han Solo) foram os mais solicitados pelos fãs. Acompanhavam-nos os outros membros lendários do elenco, Mark Hamill (Luke Skywalker) e Carrie Fisher (Princesa Leia), a par da nova vaga de intérpretes: Adam Driver e Oscar Isaac, já relativamente conhecidos do grande público, e ainda os “novatos” Daisy Ridley e John Boyega, ambos nascidos em Inglaterra. Entre os convidados, estavam cineastas como Spike Lee, Michael Bay e Ava DuVernay, os actores Matthew McConaughey, Geena Davis, Rob Lowe, Sofia Vergara e Joseph Gordon-Levitt (vestido de Yoda, com o rosto pintado de verde), e ainda John Lasseter, director criativo da Pixar, Jeffrey Katzenberg, presidente dos estúdios de animação da DreamWorks, e o produtor musical Quincy Jones.
É bem verdade que, em pouco mais de 72 horas, o filme será conhecido por milhões de espectadores em todo o mundo — Portugal é um dos países em que a estreia ocorre na quinta-feira, com algumas salas a organizar sessões logo à passagem da meia-noite (dos maiores mercados mundiais, só a China esperará até 2016, com o lançamento agendado para 9 de Janeiro). De qualquer modo, a Disney solicitou aos meios de comunicação americanos um embargo até quarta-feira, esperando, em particular, não ter surpresas desagradáveis com a vida “social” nas redes da Internet. As primeiras reacções, nomeadamente no Tweeter, respeitavam o pedido da Disney, predominando um tom de inequívoco entusiasmo. Brett Morgen, realizador do recente documentário sobre Kurt Cobain (Cobain: Montage of Heck) surgiu como uma das vozes mais arrebatadas, rotulando o novo episódio de Star Wars como “o melhor blockbuster desde o original”.
Os grandes testes cinematográficos e industriais começam agora. Primeiro, trata-se de saber se há, de facto, uma renovação geracional na base de fãs da saga; depois, no contexto de Hollywood, está em jogo o investimento galáctico da Disney (que comprou a Lucasfilm por 4 mil milhões de dólares) e, em particular, a gestão do seu presidente, Robert Iger (acusado por alguns analistas de ter pago um preço excessivo). Nas páginas da Variety, publicação de referência da indústria do entertainment, especula-se sobre a possibilidade de O Despertar da Força superar as receitas globais de Avatar (quase 2,8 mil milhões de dólares): “Tendo em conta a reacção da multidão na segunda-feira à noite, a força foi, realmente, despertada.”