sexta-feira, janeiro 31, 2014

St. Vincent: digital, diz ela

Imaginemos a geometria futurista dos cenários de Playtime, de Jacques Tati. E suponhamos que, por algum artifício formal ou derivação simbólica, as suas personagens adquiriam a imponderabilidade de um quadro de Magritte... Que poderia resultar de tão inusitado cruzamento? Talvez qualquer coisa como o novo teledisco de St. Vincent, realizado por Chino Moya — para que nada nos falte, o título da canção envolve todo um programa humano e conceptual: Digital Witness.
RENÉ MAGRITTE: Golconde (1953)
JACQUES TATI: Playtime (1967)

Disney no espelho

Não é tanto a personalidade de Walt Disney, como a própria produção Disney que arrisca colocar-se em frente do espelho nesse curioso filme que é Ao Encontro de Mr. Banks, dirigido por John Lee Hancock. Em causa estão, como é sabido, as atribulações da produção de Mary Poppins (1964), opondo o conceito de espectáculo do próprio Disney ao purismo conceptual de que P. L. Travers, autora dos livros, não queria abdicar. De qualquer modo, para além (ou através) desse confronto de personalidades — magnificamente interpretadas, respectivamente, por Tom Hanks e Emma Thompson —, aquilo que emerge é o carácter material dos bastidores da produção, por assim dizer relativizando o artifício inerente ao universo do homem que criou um mundo (Disneylândia) literalmente à sua imagem. Nesta perspectiva, Ao Encontro de Mr. Banks envolve o paradoxo original da cinefilia: o de poder reforçar o encanto do espectáculo através da desmontagem dos seus próprios artifícios.

>>> Mary Poppins recebeu cinco Oscars da Academia de Hollywood, incluindo o de melhor actriz, para Julie Andrews — eis o registo do seu agradecimento.

Scarlett Johansson: star power

O que faz esta fotografia funcionar não é exactamente a identidade de quem nela figura — Scarlett Johansson —, mas sim a soma dessa identidade com o fragilidade da própria imagem. Estamos, afinal, perante um daqueles instantâneos, necessariamente obtidos em circunstâncias pouco (ou nada) controladas pelo próprio fotógrafo, em que algo resiste para além da "imperfeição" técnica ou formal dos resultados — essa coisa à beira do imaterial tem um nome: star power.
Foi a 9 de Janeiro: Scarlett Johansson estava a chegar aos estúdios da CBS, em Nova Iorque, para gravar uma conversa com David Letterman, no seu Late Show. O diálogo é tanto mais sintomático daquele poder quanto a sua motivação principal é o trabalho da actriz em Her - Uma História de Amor, de Spike Jonze, em que Johansson dá voz a um sistema operativo de computador, assumindo uma personagem puramente virtual, literalmente desprovida de imagem.

quinta-feira, janeiro 30, 2014

Riz Ortolani (1926 - 2014)

Ao longo de mais de meio século, foi um dos mais activos e populares compositores do cinema italiano: Riz Ortolani faleceu no dia 23 de Janeiro, em Roma — contava 87 anos.
Na juventude ligado a uma banda de jazz, Ortolani transpôs para o cinema o seu gosto contrastado por melodias românticas e ritmos mais ou menos agressivos, sendo frequentemente "recuperado" por cineastas das mais diversas origens — Quentin Tarantino, por exemplo, utilizou composições de sua autoria em títulos como Kill Bill, 1 e 2 (2003-2004), Sacanas sem Lei (2009) e Django Libertado (2012).
O seu tema mais célebre, More, distinguido com um Grammy, integrava a banda sonora de Mundo Cão (1962), de Gualtiero Jacopetti, tendo sido objecto de muitas versões, incluindo uma de Frank Sinatra. Entre as suas mais de duas centenas de contribuições para filmes (de origem italiana, francesa, alemã, etc.) incluem-se: A Ultrapassagem (Dino Risi, 1962), O Rolls-Royce Amarelo (Anthony Asquith, 1964), Sete Vezes Mulher (Vittorio De Sica, 1967), Aventuras de Gerard (Jerzy Skolimowski, 1970) e A Rapariga de Trieste (Pasquale Festa Campanile, 1982). Para promover a pesquisa e a educação musical, criou a Fundação Riz Ortolani.

>>> Genérico de A Ultrapassagem.


>>> Obituário no New York Times.

William Orbit: nova remistura de "Some Girls"

William Orbit continua a prendar-nos com elaboradas remisturas do álbum MDNA, de Madonna — aí está Some Girls, agora em épicos nove minutos.

Ver + ouvir:
The Blow, From The Future



Chegou agora ao mercado nacional o álbum homónimo que a dupla pop eletrónica The Blow editou no ano passado. Aqui fica um aperitivo para quem ainda não ouviu o disco.

Reedições:
The Power Station, The Power Station

The Power Station
“The Power Station”
PLH UK Catalog
2 / 5 

Após três álbuns de originais, uma intensa agenda de concertos e um estatuto de visibilidade global conquistado, os Duran Duran chegaram a meados de 1984 com vontade de tirar uns tempos de férias. Depois de terminada a digressão mundial tinham ainda pela frente a edição em single de uma versão remisturada por Nile Rodgers de The Reflex (que se transformaria num dos seus maiores êxitos), o lançamento do álbum ao vivo Arena e a gravação do single (e do teledisco) The Wild Boys, que surgiria como inédito (de estúdio) no registo live... Depois dividiram-se em dois corpos distintos. Simon Le Bon, Nick Rhodes e Roger Taylor juntaram-se em Paris para aprofundar a faceta mais sumptuosa do som dos Duran Duran num projeto a que chamariam Arcadia. E John e Andy Taylor encontraram terreno livre para expressar o desejo de explorar duas premissas fulcrais da alma dos Duran Duran: a sua face mais rock (nem sempre muito evidente nos DD) e um motor rítmico mais próximo de uma identidade herdada do funk. Juntaram-se a Rover Palmer (que tinham conhecido em 1983) e ao baterista Tony Thompson. E sob produção assegurada por Bernard Edwards (Chic), registaram um conjunto de oito temas (entre os quais uma versão dos T-Rex e uma dos Isley Brothers) nas quais apresentaram um rock anguloso e polido (que teria consequências diretas no som de Notorious, o álbum de reencontro dos Duran Duran editado em 1986). The Power Station (nome do estúdio nova-iorquino onde gravaram) foi a designação que adotaram para o grupo e para o seu primeiro álbum (haveria um segundo, claramente menor, onze anos depois). O álbum é um claro exemplo de um sentido burguês que habita muitas vezes entre quem faz vibrar os terrenos do sucesso. Foi coisa mais cara que musicalmente consequente, apesar da boa repercussão que chegou a ter nos EUA. Do alinhamento surgiu, além de uma versão aceitável de Get It On (Bang a Gong) um belo single pop ritmicamente elaborado a que chamaram Some Like It Hot. O resto do disco é acima de tudo um devaneio impecavelmente produzido que cruzou elementos de funk e traços de um rock mais pesado, algo longe do sentido pop e das cores que habitavam a música dos Duran Duran. Convenhamos que na altura muito do que os Power Station venderam e deram que falar se devia ao facto de, entre 1982 e 85 serem os Duran Duran uma das bandas mais populares do planeta. Hoje, quase 30 anos depois, é um episódio paralelo de interesse relativo, datado e bem menos interessante que o mais elaborado So Red The Rose, dos Arcadia. Esta reedição junta remisturas, lados B e edits dos singles e máxis editados na época.

PS. Confesso que, com o tempo, fui perdendo o interesse por este disco.

Um 'Uivo' a caminho do cinema

Esta é a versão integral de uma entrevista a Eduardo Morais, o autor de Uivo, documentário sobre António Sérgio a rodar este ano, e que serviu de base a um artigo publicado na edição de 26 de janeiro do DN. 

Como nasceu a ideia de fazer um filme sobre António Sérgio? 
No Verão de 2009, quando comecei a pensar no meu primeiro documentário, Meio Metro de Pedra, o António Sérgio era um dos interpretes que tinha em mente para dar o seu testemunho. Ao longo da posterior pesquisa e rodagem para o mesmo, esta homenagem sempre me ficou debaixo da língua. Já nos últimos meses, tenho vindo a tentar pesquisar mais sobre o radialista do que a mera biografia e é uma verdade que pouco ou nada existe sobre ele. Como é uma personalidade por quem tenho uma empatia com a ética de trabalho, decidi abordar a Ana Cristina Ferrão sobre a minha vontade de fazer um documentário que o homenageasse.

Como está a procurar assegurar o financiamento?
O financiamento para este documentário será assegurado através de uma campanha de crowdfunding. O crowdfunding é uma espécie de financiamento colectivo, ou uma “vaquinha online”, onde se estabelece um valor para um projecto ser concretizado, e os apoiantes que contribuem são recompensados mediante o valor do seu apoio. A campanha para o Uivo está no ar desde o passado dia 14 de Janeiro (data de aniversário do António Sérgio) aqui.

O que espera poder mostrar no filme?
Neste documentário tentarei mostrar todo o resultado da minha busca de informação sobre o António Sérgio e irei retratar de um modo mais fiel possível a sua vida, tanto profissional como pessoal.

Vai contar com sons e / ou imagens de arquivo (ou de filmes de família)?
O António Sérgio nunca foi muito dado a entrevistas para a televisão, portanto o suporte vídeo para arquivo será colmatado com homenagens criadas por ilustradores e animadores de todo o país. Quanto a fotografias, artigos, capas em que o Sérgio esteve envolvido, à suas indispensáveis locuções, farão certamente parte do complemento às entrevistas.

Vai usar entrevistas?
Quando falamos de um documentário de música, é sempre difícil fugir ao formato “entrevista - imagem de arquivo”. Sendo este um documentário focado apenas numa personalidade, a margem de criatividade estende-se um pouco mais. Abordarei cerca de 40 entrevistados, desde radialistas, jornalistas, músicos, amigos e familiares para que dar o seu testemunho sobre a relação e a história do António Sérgio.

Era ouvinte dos seus programas?
Tenho apenas vaga ideia de ouvir algumas emissões da Hora do Lobo, pois passava na Comercial.

Que memórias mais caras guarda dele? 
Tenho apenas a noção de lhe ter começado a dar o devido mérito quando comecei a pesquisa para o Meio Metro de Pedra, e me apercebi da enormidade de bandas nacionais que o António Sérgio auxiliou, e internacionais que desvendou.

Descobriu algumas músicas em particular nas suas emissões? 
Há que perceber que tenho apenas 27 anos, que a Radar não “chegava” às Caldas da Rainha, e em termos de crescimento musical, tanto eu como a grande maioria atenta da minha geração já vê a internet como uma Mina de São Domingos.

Quando a música de dança é... introspetiva


É para todos os efeitos o terceiro álbum de estúdio dos Pet Shop Boys. Mas na verdade partilha características comuns também com os quatro títulos que o grupo editaria sob a designação Disco. Com apenas seis faixas, mas todas elas de extensão considerável, o disco mostra quão intrpscetyiva pode de facto ser também a música de dança. E daí o título: Introspective. O alinhemento apresenta duas versões – Always On My Mind, originalmente interpretada por Elvis, e It's Alright, de Sterling Void. Junta uma nova mistura de I Want A Dog, originalmente um lado B. Propõe uma leitura do próprio duo para I'm Not Scared, tema que tinham dado a gravar aos Eight Wonder. E de novo acrescentava Domino Dancing, canção que assegurava um primeiro flirt com a música latina, e o monumental Left To My Own Devices, exercício maior de uma ideia de pop sinfónica, sob produção de Trevor Horn. Uma pulsão dançante cruza as versões, sublinhando mesmo marcas de relacionamento com a cultura house que então deixava de ser fenómeno underground e ganhava grande visibilidade.

Para ouvir: Matt Beringer com The Bird & the Bee

Matt Beringer (dos The National ) junta-se aqui à dupla The Bird and The Bee em All Our Endless Love. A colaboração nasceu para a banda sonora do filme Endless Love.

Podem ouvir aqui a colaboração.

Tom Sherak (1945 - 2014)

FOTO: LA Times
Foi presidente da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood no período 2009/2012: Tom Sherak faleceu no dia 28 de Janeiro, em sua casa em Calabasas, California, vítima de cancro na próstata — contava 68 anos.
Depois de uma longa carreira na área da produção (incluindo um período na 20th Century Fox durante o qual o estúdio lançou títulos como Aliens, Die Hard e Sozinho em Casa, respectivamente em 1986, 1988 e 1990), Sherak foi eleito presidente da Academia — foi durante a sua gestão que a entidade que atribui os Oscars implementou a votação online, criando também a possibilidade de o número de títulos nomeados para o Oscar de melhor filme poder chegar a uma dezena. Em Setembro de 2013, tinha assumido a direcção do Mayor's Entertainment Industry and Production Office, organismo vocacionado para reforçar o envolvimento das estruturas da cidade de Los Angeles com a indústria cinematográfica.

>>> Tom Sherak num extracto de entrevista de 2011.


>>> Obituário em The Hollywood Reporter.

quarta-feira, janeiro 29, 2014

Ver + ouvir:
Roosvelt, Montreal



É um projeto de um músico de Colónia (Marius Lauber de seu nome real). E dá-se bem entre as guitarras e as eletrónicas, com tempero dançável. Esta canção é ainda de 2013...

Novas edições:
The Hidden Cameras, Age

The Hidden Cameras 
“Age” 
Evil Evil 
3 / 5 

Há expressões que se colam a obras concretas. E com os The Hidden Cameras mal se vê um texto que não fale de “gay church folk music”, descrição que decorre de palavras do próprio Joel Gibb, o canadiano que é a alma criativa central do projeto e a sua voz. A ideia até se ajustava ao que foi em tempos uma música que partilhava uma costela ativista LGBT com uma alma folk, entregue depois a arranjos luxuriantes (fazendo do álbum Mississauga Goddam, de 2004, um paradigma na afirmação de uma personalidade demarcada que por aquela altura ganhou visibilidade maior). Dez anos depois, Age representa a expressão de busca de um novo patamar na obra do projeto. Colocando ponto final a um silêncio de cinco anos (o anterior Origin: Orphan data de 2009), o novo disco não fecha a porta ao caráter sumptuoso e maior dos arranjos que caracterizaram as suas canções nem afasta do gume das ideias as reflexões sobre temáticas centrais à obra do grupo (escute-se o belíssimo Gay Goth Scene – e o seu magnífico teledisco – para verificar que não há uma mudança de linha, apesar do alargamento do espetro de assuntos abordados entre as novas canções). Mas tal como as letras caminham entre mais temas e espaços, também a música reflete essa demanda de outros horizontes. Com sede hoje em Berlim (que é como quem diz que é ali que Joel hoje vive), os The Hidden Cameras de 2014 assinalam uma aproximação ainda maior às eletrónicas. Mas ao contrário do que nos mostrou John Grant no disco que editou em 2013, Age parece retrato de um processo de mudança ainda não plenamente arrumado. O ensaio dub de Afterparty não resulta, e o lote de composições é desigual, apenas ocasionalmente encontrando os argumentos devidamente convincentes através de uma voz própria nos diálogos que procura aqui experimentar (Doom ou Ordinary Over You são mesmo pérolas que sugerem caminhos que um episódio seguinte poderá aprofundar e melhorar).

De um conto para o palco da ópera

Este texto sobre a estreia mundial de 'Rrokeback Mountain' é uma versão editada de um outros que foi publicado na edição de 27 de janeiro do DN com o título 'Um Amor Impossível Num Palco de Ópera'. 

Nasceu nas páginas da revista New Yorker em 1997, na forma de um conto assinado por Annie Proulx. Em 2005 a sua adaptação ao cinema (por Ang Lee) ganhava o Leão de Ouro em Veneza (e três Óscares no ano seguinte. Esta semana, com música de Charles Wuorinen e libreto da própria Annie Proulx, Brokeback Mountain nasceu como uma ópera no palco do Teatro Real, em Madrid.

“A ópera é sobre um caso típico de uma situação impossível, uma situação trágica. Neste caso são duas pessoas, que querem ter uma relação que, naquele lugar e naquele tempo, é proibida pela sociedade”, explicou o realizador em declarações à AFP, reforçando que este é, de resto, “um problema muito tradicional na ópera”. Tal como no conto, esta é a história de dois cowboys que, durante perto de 20 anos, vivem um romance escondido quando, nos meses de verão, retomam o seu trabalho nas montanhas do Wyoming, longe de tudo e de todos (inclusivamente das famílias que entretanto formam).

A ópera Brokeback Mountain “não é sobre o amor gay”, referiu ainda o compositor à AFP. “É sobre uma relação que se expressa através de uma paixão entre dois homens, mas que a não conseguem fruir. A personagem de Ennis é incapaz de aceitar a sua própria natureza, em aceitar-se a si mesmo e depois a tomar medidas para viver uma vida que acomode as características da sua personagem.” Wuorinen justificou que não pretendia que esta sua ópera fosse vista como uma criação essencialmente ideológica ou até mesmo como uma eventual peça de propaganda associada a um ponto de vista em particular. Queria antes expressar, através desta história, o que descreve como problemas humanos fundamentais.

Depois de ter decidido avançar com a criação da ópera, o compositor procurou quem assinasse o libreto. E não escondeu a enorme satisfação com que a própria autora do conto original se mostrou disponível. Trabalharam juntos, durante uma semana, nas montanhas do Wyoming. E depois, por e-mail, foram continuando a desenvolver a colaboração.

Em entrevista disponibilizada pelo Teatro Real, o compositor explica que há diferenças entre a ópera e o filme de Ang Lee que ganhou projeção global. “A ópera vinca a impossibilidade do amor entre estas duas personagens”, defende. Assinala que o filme tem uma fotografia que destaca a beleza da paisagem, mas explica que aquela é uma região perigosa, ameaçadora, onde se pode ser morto por causas naturais ou por outras pessoas. Wuorinen procurou por isso um caminho realista mais próximo do texto original.

Criada entre 2008 e 2012, a ópera (em dois atos e 11 cenas) terá agora uma residência no palco madrileno até 11 de fevereiro. Em palco estarão as vozes de Tom Randle (Jack Twist)e Daniel Okulitch (Ennis Del Mar), os protagonistas, juntamente com Heather Buck (Alma), Hannah Esther Minutillo (Lureen), Ethan Herschenfeld (Aguirre e pai de Lureen), Jane Henschel e Ryan MacPherson (os pais de Jack).

Uma canção dos Pet Shop Boys
por John Gonçalves

Ao longo deste ano celebramos os 30 anos de vida discográfica dos Pet Shop Boys. E por isso pedimos a vários amigos que partilhassem connosco histórias das canções do duo que mais os marcaram. Hoje é a vez de John Gonçalves, músico dos The Gift, escrever aqui sobre o tema Dreaming of The Queen. Ao John um muito obrigado pela colaboração.

O disco mais importante dos Pet Shop Boys aparece seis anos depois de ter comprado Actually, que acabei vendendo por uns míseros 500 escudos em plena crise de identidade musical adolescente e apenas três anos após o magnifico Behaviour, que ainda adoro. Very, ou como alguém escrevia no título da critica em Portugal "Very...Good", é para mim, a obra-prima da banda e aparece-nos com um design arrojado e com uma capa laranja com relevos no plástico do CD.
Para mim, pensar em Pet Shop Boys é automaticamente pensar em liberdade, em dança, em elegância, em inteligência, em ironia, numa estética musical evoluída, em melodias pop, em grandes versos, magníficos versões e letras de excelência! Very tem tudo isso e como em tantos outros discos dos Pet Shop Boys tem lados A e lados B.
Dreaming of The Queen é um lado B, quinta canção do álbum e tem essa inteligência e elegância tão características deles, com uma letra baseada num suposto sonho onde Neil Tennant toma chá com a rainha de Inglaterra e com Ladi Di concluindo que

There are no more lovers left Alive, No one has survived
So there are no more lovers left Alive
Thats why Love has die


 Pergunto quão surpreendente terá sido para Neil Tennant constatar com a Rainha e Ladi Di que sem "lovers left Alive", (obviamente) "Love has Died". Numa letra que inclui Ladi Di "secando os olhos", - presumivelmente de lágrimas - Neil "passeando nu, com a Rainha desaprovando (como não?) e pessoas rindo, pedindo autógrafos", numa clara passagem de sonho surreal, a canção é toda ela melodia pop no clássico mid tempo próprio dalguma vizinhança de Bristol. Não esquecer que o ano é 1993... A canção tem produção contida e electrónica subtil que fez (faz...) destes senhores os melhores nesta área, tem uns sopros e strings sintetizados que lhe dão um tom "épico kitsch" irresistível e muitas vezes característico do som da banda, acabando num clássico "fade out"...
Não sei se será a melhor canção do disco - há Yesterday when I was mad, Can you forgive her?, I wouldn´t normally do this kind of thing, Liberation,The Theatre ou Go west dos Village People - seguramente não é a melhor dos Pet Shop Boys, mas é a que me apetece destacar hoje e a que tão bem caracteriza uma maneira elegante e encantadora de fazer canções pop de ritmo mais lento, sem nunca serem baladas chatas.
Os Pet Shop Boys fazem 30 anos e a sua música é marcante na história pop das últimas 3 décadas. Felizmente ainda temos "Lovers left Alive", muito Amor no mundo e todas as excelentes canções destes senhores para nos deliciar em vários momentos da nossa vida, ora nas pistas de dança ou no conforto de qualquer lugar intimo!
Para os senhores Neil Tennant e Chris Lowe, muitos Parabéns e Obrigado!

Para ouvir: Cat Power remisturada para 'Girls'

A banda sonora da nova temporada da série Girls junta nomes como os de Miguel, Beck, Lily Allen, Rostam Batmanglij ou Jenny Lewis. E ainda Cat Power, que participa com uma nova mistura para o tema You Are Free, substancialmente diferente do original.

Podem ouvir aqui esta nova remistura.

Pete Seeger (1919 - 2014)

[foto incluída num portfolio da Rolling Stone]
Figura lendária da música folk americana, Pete Seeger faleceu a 27 de Janeiro, em Nova Iorque, no Presbyterian Hospital, onde tinha dado entrada seis dias antes — contava 94 anos.
A trajectória de Seeger, condensada em muitas dezenas de gravações (incluindo 52 álbuns de estúdio) envolve dois vectores fundamentais: um enraizamento total na tradição folk e uma sistemática valorização da canção como instrumento de consciencialização social e intervenção política — daí que a sua música vá pontuando muitos momentos charneira da história dos EUA ao longo dos séculos XX/XXI, desde o período do "maccartismo" até à eleição de Barack Obama, passando pela contestação da guerra do Vietname e a defesa das causas ecológicas.
Sete anos mais novo que Woody Guthrie (1912-1967), com ele fundou, em 1940, The Almanac Singers, grupo de existência breve, mas incontornável na história da folk. Exímio tocador de banjo, Seeger cumpriu uma primeira fase da carreira como membro de The Weavers, quarteto de música popular que teve a sua época áurea nos anos 50. Muitas das suas composições, frequentemente divulgadas através de versões de outros intérpretes, tornaram-se referências emblemáticas do imaginário made in USA — entre as mais célebres, incluem-se Where Have All the Flowers Gone?, If I Had a Hammer, Turn! Turn! Turn!, I Ain't Scared of Your Jail e Goodnight Irene.
Recebeu um Grammy pela carreira em 1993; em 1996, foi integrado no Rock and Roll Hall of Fame. Um dos últimos concertos em que participou foi o da tomada de posse de Barack Obama (18 Jan. 2009), em que interpretou This Land is Your Land, com Bruce Springsteen.

>>> Duas performances de Pete Seeger: primeiro, de um concerto de finais dos anos 70, Where Have All the Flowers Gone?, canção originalmente gravada em 1964, integrada no Grammy Hall of Fame em 2002; depois, Take It From Dr. King, numa rara performance televisiva, no Late Show with David Letterman (29 Set. 2008).
Segue-se a apresentação de Bruce Springsteen no concerto de comemoração dos 90 anos de Pete Seeger (Madison Square Garden, 3 Maio 2009).
Os dois últimos videos são registos televisivos que dizem respeito à mesma canção, Goodnight Irene: por The Weavers (com Pete Seeger), algures no começo da década de 50; por fim, numa interpretação de Eric Clapton num especial de Natal (1982).










>>> Obituário de Pete Seeger: New York Times + Billboard + Le Monde.
>>> Pete Seeger no Rock and Roll Hall of Fame.
>>> Entrevista de Pete Seeger à NPR (1 Jul. 2005).

terça-feira, janeiro 28, 2014

Chegou a era digital do cinema

Há muito que a produção cinematográfica integrou muitos elementos digitais. Seja como for, só agora estamos a chegar à mudança mais radical. Ou seja: o desaparecimento (dos circuitos comerciais) das cópias em película de 35 mm — este texto foi publicado no Diário de Notícias (26 Janeiro).

Pensemos em alguns títulos emblemáticos da produção americana de épocas bem distintas: Wings/Asas (1927), de William A. Wellman, sobre os combates aéreos na Primeira Guerra Mundial, consagrado com o primeiro Oscar de melhor filme; Double Indemnity/Pagos a Dobrar (1944), de Billy Wilder, um dos momentos fundadores da tradição do filme “noir”; Sansão e Dalila (1949), com Victor Mature e Hedy Lamarr, lendário épico bíblico assinado por Cecil B. DeMille; Psico (1960), uma referência central na filmografia de Alfred Hitchcock; enfim, Febre de Sábado à Noite (1977), a realização de John Badham que transformou John Travolta numa estrela.
Para além das suas muitas diferenças, que aproxima estes filmes? Pois bem, todos começam com o símbolo de um dos mais célebres estúdios da história de Hollywood: Paramount Pictures. Mas há um outro dado que, na sua aparente banalidade histórica, ganhou uma nova dimensão simbólica: todos eles (e também, obviamente, os muitos milhares produzidos nas respectivas épocas) chegaram aos espectadores em cópias em película de 35 mm. Acontece que, há dias, a Paramount anunciou que vai deixar de distribuir filmes em 35 mm — a comédia Anchorman 2 (a ser estreada em Abril nas salas portuguesas, com o título Que se Lixem as Notícias) será o seu derradeiro lançamento em película; a partir daí, todas as suas produções serão difundidas em formato digital.
Em boa verdade, a notícia não envolve nenhuma surpresa: com mais ou menos atribulações, a reconversão das salas de cinema é uma tendência global irreversível. Em meados de 2012, a Screen Digest (firma de investigação dos mercados audiovisuais com sede em Londres) tinha já publicado um relatório apontando o final de 2013 como um momento charneira na passagem para o digital, prevendo que 2015 será o ano em que os EUA, a par dos principais mercados do planeta, deixarão de ter salas comerciais a projectar filmes em película.
Escusado será dizer que tudo isto suscita muitas dúvidas, em particular nos pequenos mercados que, não vale a pena alimentar ilusões, terão de seguir as tendências impostas pelos mais fortes. Além do mais, há uma pergunta muito específica que emerge: como vão ser vistos os filmes clássicos (e são a maioria) que ainda não foram convertidos para o formato digital?
Importará não reduzir o problema a qualquer combate maniqueísta, quanto mais não seja porque algumas reposições recentes (Lawrence da Arábia, Hiroshima Meu Amor, Casablanca, etc.) confirmam que a indústria já reconheceu a importância da passagem desses clássicos para o digital. O que está em causa é, ainda e sempre, a preservação das memórias cinéfilas como um fundamental princípio cultural e comercial. Desde as empresas de distribuição/exibição até às instituições estatais, todos podem (e devem) enfrentar o problema sem esquecer os direitos do próprio espectador.

Erwin Olaf: moda flamenga

Constatação óbvia: as fotografias do holandês Erwin Olaf mantêm uma elaborada relação formal e conceptual com a herança da pintura flamenga. Sem preconceitos de desenvolver tal relação através dos mais diversos domínios, incluindo a moda. Estas são imagens de um portfolio produzido, em 2013, para a edição holandesa da revista Vogue — refazendo a tradição como um elemento vivo da nossa contemporaneidade.

Ver + ouvir:
John Grant, Glacier



Jonathan Caouette, o realizador de Tarnation, criou um novo teledisco para o tema Glacier, que encerra o alinhamento do álbum que John Grant publicou em 2013.

Sound + Vision Magazine
amanhã às 18.30 na Fnac Chiado


Tem lugar amanhã, pelas 18.30 na Fnac Chiado, mais uma sessão do Sound + Vision Magazine. Além de lançar algumas das primeiras grandes ideias deste ano, a sessão vai também fazer contas a alguns dos lançamentos que fizeram história em 2013. Memórias de Hitckhcock, um olhar diferente pela guerra em Lore ou o regresso de David Bowie estão entre os assuntos a abordar.

Reedições:
The Beatles, Meet The Beatles

The Beatles
“Meet The Beatles”
Capitol / Universal
5 / 5

A Capitol Records levou tempo a reagir aos Beatles. Tanto que, antes da editora lançar um primeiro disco dos fab four (com estes já a fazer sucesso na Europa), os Beatles chegaram originalmente aos EUA num LP e um single editados por duas pequenas independentes. Em inícios de 1964, e já sob a Beatlemania instalada na Europa, a Capitol resolve finalmente apostar nos Beatles. Lança I Want To Hold Your Hand em single e apresenta um álbum ao qual chama Meet The Beatles. Apesar de usar a mesma imagem de With The Beatles, recentemente lançado no Reino Unido, o disco americano é diferente, acrescentando a algumas canções desse segundo álbum europeu o single entretanto editado e lados B. Surge assim uma discografia paralela que a Capitol criará para a obra dos Beatles até que, em 1967, Sgt. Pepper’s se apresentou com identidade fixada para edição global. Este foi o primeiro caso de sucesso maior dos Beatles nos EUA e o disco fundador da loucura que então ganhou forma do outro lado do Atlântico. As memórias fundadoras da relação dos americanos com os Beatles são, apesar do álbum antes lançado pela Vee-Jay, os que Meet The Beatles lançou em 1964. De certa forma este tornou-se um clássico que agora é reeditado num alinhamento que junta, num mesmo CD, as suas misturas em mono e estéreo.

Só para japonês ouvir



Ao longo da obra dos Pet Shop Boys houve vários momentos criados expressamente para mercados específicos. In Depth foi um disco, com extensão entre a duração de um EP e a de um álbum, pensado para o mercado japonês em finais dos anos 80. Com seis temas, e essencialmente perto do corpo de canções apresentadas em Introspective, In Depth teve então edição em vinil, cassete e CD, em exclusivo no Japão. Hoje é raridade procurada por colecionadores.

Para ouvir: nova versão de 'West End Girls'




Uma parceria que chega num tempo em que se assinalam os 30 anos da edição da versão original do single que deu visibilidade global aos Pet Shop Boys. A versão surgiu na sequência de um concerto de beneficência em favor do Hetrick Martin Institute, em Nova Iorque.

Lorde: "the new girl"

Na revista Rolling Stone, Rob Tannenbaum chama-lhe "the new girl". E não há dúvida que Lorde fez soar outra(s) nota(s) num universo, musical e mediático, ocupado pelo modelo de Miley Cyrus. A consagração nos Grammy — Royals, canção do ano — terá as ambivalências habituais de qualquer prémio, mas arrasta um simbolismo que merece ser sublinhado: afinal de contas, Lorde — aliás, Ella Maria Lani Yelich-O'Connor, neozelandesa, nascida a 7 de Novembro de 1996 — tem vivido através de uma pose e uma iconografia que, na sua impecável sobriedade, só a ela pertencem. Dos Grammy, justamente, aqui está a performance de Royals.

segunda-feira, janeiro 27, 2014

Entre o Texas e o México

A música de Gina Chavez é a expressão muito directa do cruzamento de referências, inspirações e culturas que faz a sua própria história pessoal: cantora de Austin, Texas, remete-nos constantemente para paragens mexicanas, como acontece nesta canção, Miles de Millas, do seu álbum Up.Rooted — em escuta no site da NPR.

A televisão dos treinadores de futebol

THOMAS EAKINS (1844-1916)
Estudo do movimento humano
Para além das diferenças de pessoas ou canais, a informação televisiva parece comandada por trágicas rotinas de formatação... e, para além do futebol, não há muita coisa a acontecer — esta crónica televisiva foi publicada no Diário de Notícias (24 Janeiro), com o título 'Os oráculos sociais'.

Há dias, procurando uma informação que teria surgido nas notícias das oito da noite, algures num canal generalista, passei por uma experiência (obviamente não premeditada) a que não pude deixar de reconhecer um contundente valor sintomático.
Tirando partido da possibilidade de percorrer os programas a uma velocidade acelerada, consultei várias dessas edições: tudo começava com os mesmos rostos de dirigentes partidários; seguiam-se os mesmos três treinadores de futebol (Cristiano Ronaldo surgia também, em momentos diversos, em montagens mais ou menos “patrióticas”); por fim, havia um curto período de imagens mais confusas, porque mais breves, que só consegui identificar voltando à velocidade normal... eram notícias do estrangeiro.
Que valor “científico” isto tem? Nenhum, como é evidente. Conheço há várias décadas o cinismo que leva a insultar automaticamente qualquer discurso crítico, denunciando as suas pretensões “científicas”... O que está em jogo é bem diferente: são ideias sobre o mundo em que vivemos e, em particular, perspectivas sobre os valores dominantes no poderoso espaço mediático, hoje em dia central em qualquer tecido social.
Assim, independentemente de variações e excepções, a paisagem noticiosa, também ela, tende a reproduzir formatos. Como? Elegendo determinados discursos e personalidades como figuras “obrigatórias”. Exemplo? Jorge Jesus, Leonardo Jardim e Paulo Fonseca foram promovidos a oráculos da sociedade portuguesa que, mandam as televisões, devem ser escutados todos os dias.
Há, por isso, um grande desafio que se coloca aos que fazem e pensam a política em Portugal. Consiste em perguntar que efeitos normativos tais formatos produzem no tecido social e, em particular, no trabalho cognitivo de cada cidadão. Numa altura em que a especulação sobre os candidatos à Presidência da República também já entrou na formatação noticiosa, seria útil que os líderes do comentário político – Marcelo Rebelo de Sousa e José Sócrates – tivessem a serenidade de sublinhar a urgência de lidar com tal desafio.

Os Grammy dos 33 casamentos

Macklemore, Mary Lambert, Madonna, Ryan Lewis e Queen Latifah
(in Grammy.com)
Ainda há quem saiba valorizar os símbolos. Aconteceu em Los Angeles, na 56ª edição dos Grammy, com a celebração simultânea de 33 casamentos!
É verdade: 33 casais, heterossexuais e homossexuais, deram o nó em plena cerimónia, num evento que teve Queen Latifah como apresentadora e responsável legal pela celebração das uniões (graças a uma licença concedida pelo estado da Califórnia). Tudo isso, claro, com as devidas bênçãos musicais: primeiro, Macklemore e Ryan Lewis (vencedores de quatro prémios, incluindo melhor álbum rap para The Heist) interpretaram Same Love, com Mary Lambert (tal como no disco); depois, Madonna apresentou uma versão abreviada, paradoxalmente mais intimista, de Open Your Heart — vale a pena ver e escutar.

Angelina Jolie + Lana Del Rey

Esta é uma história que quase podia ser um conto de fadas... dentro de um conto de fadas. Em boa verdade, a sua origem tem mais de meio século, uma vez que nos remete para A Bela Adormecida, a versão do conto de Charles Perrault produzida por Walt Disney em 1959. Aí, a canção Once Upon a Dream (Sammy Fain/Jack Lawrence), interpretada por Mary Costa, surgia como um símbolo suave, por certo romântico, da personagem da princesa atingida pela maldição de Maleficent (Maléfica), a fada má.


Agora, existe uma nova versão de Once Upon a Dream, cantada por Lana Del Rey e o mínimo que se pode dizer é que a serenidade do original parece ter sido contaminada por uma elaborada inquietação. É essa, pelo menos, a conclusão que se retira do trailer do filme Maleficent — a produção volta a ser dos estúdios Disney e tem estreia americana marcada para 30 de Maio (Portugal: Maléfica, 5 de Junho). Pormenor não secundário: passou-se dos desenhos animados para os intérpretes de carne e osso, pertencendo a Angelina Jolie o privilégio de assumir a figura maligna que gostamos de admirar.

Ver + ouvir:
The Hidden Cameras, Gay Goth Scene



Durante alguns meses este teledisco esteve ausente da Internet e passou entre o circuito de festivais de cinema (entre nós estreou no Queer Lisboa). Agora é um dos aperitivos online para o novo álbum dos canadianos The Hidden Cameras.

Novas edições:
The Blow, The Blow

The Blow
“The Blow”
Kanine
4 / 5

Já com mais de dez anos de vida, a dupla The Blow é um belo exemplo de um entendimento a dois não apenas entre duas profissionais da música, mas também entre as electrónicas e uma certa identidade indie que faz com que, mesmo abrindo horizontes da escrita à canção pop, por aqui haja uma evidente falta de vontade em ceder a tentações dos caminhos mais em voga. Chamaram The Blow ao seu mais recente disco – editado ainda em 2013 mas agora com distribuição entre nós – e, como parece sugerir a velha tradução de atribuir o nome da banda a álbuns com um peso maior na sua obra, na verdade parece que aqui assinalam aquele que é, até aqui, o mais consistente dos episódios da sua discografia. Elas são na verdade Khaela Maricich e Melissa Dyne (juntas no trabalho e na vida privada), e pela história das Blow passou em tempos Joanna Bechtolt, que entretanto temos acompanhado via Yacht. A visão da dupla transcende o mero espaço da criação musical e incorpora na sua identidade não apenas uma vontade em juntar elementos dos espaços da performance e das artes visuais e promove, através da ligação maior entre as suas duas almas, uma reflexão sóbria e cativante sobre a vida, os relacionamentos, os pequenos e os grandes nadas que fazem o dia a dia de quem vive a dois. Com belíssimos momentos de escrita pop como os que escutamos em A Kiss, From The Future ou, sobretudo, Hey (o single que devia ter sido e ainda não o foi), The Blow é um belo disco para quem acredita na canção como forma de retratar quem somos. E na pop electrónica como uma linguagem que não se esgota nem nas tendências do momento nem numa vontade em inventar o momento a seguir. Há uma paz por aqui, que sabe bem, como uma tranquila vida doméstica.

Grammys 2014: e para o ano há mais


Sem grandes surpresas os Grammys de 2014 foram parar em doses mais fartas aos Daft Punk (cinco) e à dupla Macklemore & Ryan Lewis (quatro). Lorde ficou com a Melhor Canção... Os Vampire Weekend com o Melhor Álbum Alternativo. E uma gravação de The Tempest, de Thomas Adès, no Met, como a melhor de Música Clássica. Entre a multidão de prémios (e são mesmo muitos) não houve surpresas de maior. Na cerimónia Same Love, de Macklemore & Ryan Lewis serviu de banda sonora a um momento político, promovendo a união de uma série de casais atenta à diversidade na cor da pele e na orientação sexual. Ringo atuou com McCartney. Stevie Wonder com os Daft Punk... E para o ano há mais.

Veja aqui a lista completa dos vencedores.

Visões pop com travo latino


O álbum Bilingual celebrou uma relação com a cultura latina que certamente muito deve ao relacionamento que os Pet Shop Boys começaram a dada altura a estabelecer com os palcos sul-americanos. Editado no formato de single em novembro de 1996 (sendo assim o terceiro extraído do alinhamento de Bilingual), o tema conheceu então título definitivo como Single-Bilingual (era apenas apresentado como Single no álbum).


O teledisco de Single-Bilingual, realizado por Howard Greenhalgh afasta-se contudo do espaço latino sugerido pela canção para celebrar um cenário business class claramente europeu, mostrando mesmo imagens de Bruxelas e do comboio Eurostar que cruza o canal da Mancha.

Para ouvir: 'November', segundo Max Richter



Numa altura em que o músico vê reeditado o álbum Memoryhouse, recordamos November, de Max Richter, tema que foi usado num dos trailers de A Essência do Amor, de Terrence Malick.

Mãe e filho

FOTO: US Magazine
Um par de gentlemen à entrada para os Grammy. Ou como David Banda e a sua mãe, Madonna, dão razão à velha máxima de Vogue: Strike a pose! A preto e branco como a tradição impõe e, ao mesmo tempo, desafiando os significados convencionais da palavra "envelhecimento".

domingo, janeiro 26, 2014

Uma nova versão de "Titanic"?

Que há de comum entre estas duas imagens? Pois bem, Leonardo DiCaprio figura em ambas. Mas há 17 anos a separá-las. A mais pequena, por certo a mais conhecida, apresenta-o, com Kate Winslet, numa das cenas mais emblemáticas de Titanic (1997); a outra, actualíssima, mostra-o com Jonah Hill, num encontro a que, por certo, não é estranho o seu trabalho no genial O Lobo de Wall Street, de Martin Scorsese (aliás, DiCaprio e Hill estão ambos nomeados para os Oscars, respectivamente nas categorias de melhor actor e melhor actor secundário) — aconteceu tudo na edição de sábado do programa Saturday Night Live, da NBC, podendo condensar-se na mais velha máxima do espectáculo e dos seus prazeres: that's entertainment!

Quatro actores para quatro Oscars?

Proeza muito especial: Golpada Americana tem actores nomeados nas quatro categorias de interpretação. Pretexto para algumas breves memórias — este texto integrava um dossier sobre o filme, publicado no Diário de Notícias (22 Janeiro).

Na história da Academia de Hollywood, o filme Reds (1981), de Warren Beatty, foi o 13º a obter nomeações nas quatro categorias de interpretação. Depois, durante três décadas, nenhum conseguiu repetir a proeza. Até que, nos dois últimos anos, dois títulos voltaram a conseguir tal feito: Guia para um Final Feliz e Golpada Americana. Ou seja: dois filmes realizados por David O. Russell.
Escusado será dizer que tal performance é reveladora da importância dos actores no cinema de Russell. Com uma curiosidade suplementar que vale a pena sublinhar: os actores de Guia para um Final Feliz nomeados nas categorias principais, Bradley Cooper e Jennifer Lawrence (Lawrence ganhou), são os mesmos que concorrem na categoria de secundários por Golpada Americana. No primeiro filme, os secundários eram Robert De Niro e Jacki Weaver; agora, os principais são Christian Bale e Amy Adams.
Será possível quatro actores do mesmo filme arrebatarem quatro estatuetas douradas? A estatística, pelo menos, diz que não. Dos catorze filmes que, ao longo de 85 edições dos Oscars, foram nomeados em todas as categorias de interpretação, nenhum conseguiu o pleno. E só dois ganharam três prémios: Um Eléctrico Chamado Desejo (1951) e Network – Escândalo na TV (1976). Este tinha mesmo cinco nomeações, já que Peter Finch e William Holden concorriam ambos para melhor actor (Finch ganhou). Quanto a Um Eléctrico Chamado Desejo, falhou precisamente na categoria de melhor actor: o derrotado chamava-se... Marlon Brando!