domingo, agosto 31, 2008
Ricky Gervais à conquista da América
O verdadeiro romance de Philippe Sollers
Philippe Sollers — que gosta de se definir como "um escritor europeu de origem francesa" — deambula, aqui, das suas origens burguesas à descoberta do universo polimorfo das mulheres (Femmes é um dos seus romances mais conhecidos), das lições de Joyce e Freud às contradições do mundo mediático em que vivemos. Tudo regressando ciclicamente a Mozart. É uma celebração da liberdade que pode nascer da escrita, e com a escrita, um livro de relativização de todos os modelos tradicionais ("crónica", biografia", "romance"), afinal fiel a esse espírito de deriva, dúvida e interrogação de um autor que tem um livro que se chama Teoria das Excepções.
Arte comprada no eBay
O combate dos chefes
A 4 de Novembro os norte-americanos vão escolher o sucessor de George W Bush na Casa Branca. A eleição é claramente um dos acontecimentos do ano e entra agora na verdadeira contagem decrescente. Depois da convenção democrata, chega agora a republicana. Obama e McCain são os dois principais rostos de uma das mais disputadas e mediatizadas eleições de sempre. O Sound + Vision vai aproveitar as semanas de contagem decrescente para aqui recordar histórias, figuras e imagens das eleições americanas desde aquela que, em 1960, elegeu John F Kennedy. Regularmente aqui apresentaremos também as mais recentes sondagens (nacionais e para o Colégio Eleitoral)... Como aperitivo para a história, fica a imagem histórica de Kennedy na Casa Branca, publicada pelo New York Times em 1961.
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Última sondagem nacional (Gallup, 31 de Agosto):
Barack Obama: 48%
John McCain: 42%
Os valores reflectem já os efeitos do discurso de aceitação de Obama, mas também a escolha de Sarah Palin para vice de McCain. Resta ver se, esta semana, a convenção republicana consegue alterar esta tendência.
Segundo o site Real Clean Politics, a soma de sondagens por estado dá, neste momento, vitória nacional a Barack Obama com 273 grandes eleitores no Colégio Eleitoral contra 265 de John McCain. Recorde-se que a eleição presidencial nos EUA não resulta do total nacional de votos, mas sim de um Colégio Eleitoral que representa os estados. Cada estado elege um número de grandes eleitores, reflectindo este número a sua população. A Califórnia é o estado com maior número de eleitores no Colégio Eleitoral, somando um total de 55. Segue-se o Texas, com 34 e Nova Iorque, com 31. Em 48 dos estados o vencedor recolhe todos os seus grandes eleitores. Ou seja, o “perdedor” fica a zero.
Voltaire, segundo Bernstein
"O Padrinho" de novo nas salas... americanas
Há poucas semanas, o mercado do DVD revelou uma preciosa novidade. Ou melhor: uma revisitação de um, aliás, três clássicos. Trata-se da reedição da trilogia O Padrinho (1972, 1974, 1990), em cópias restauradas, executadas sob supervisão de Francis Ford Coppola, Gordon Willis (director de fotografia), Walter Murch (sonoplasta) e Robert Harris (há alguns anos responsável pelo esplendoroso restauro de Lawrence da Arábia). Curiosamente, nos EUA, o acontecimento não vai ficar pelo DVD. A Paramount (estúdio produtor) prepara uma série de exibições de O Padrinho, para já em salas de Nova Iorque, Los Angeles e São Francisco. Quer isto dizer que, pelo menos no mercado americano, as relações entre o circuito tradicional do cinema e os novos suportes de comercialização dos filmes estão a ser equacionadas em todos os sentidos. É um bom exemplo, sobretudo para um mercado como o português em que grandes referências clássicas continuam a ser lançadas nas lojas sem o mínimo trabalho de divulgação. Exemplo? A Mulher Miraculosa (1931), de Frank Capra.
sábado, agosto 30, 2008
"Memento" reaparece em DVD
As cores de Michael Jackson
Não há maneira suave de o dizer: nas polémicas em torno da cor da pele de Michael Jackson há, quase sempre, uma questão rácica. E também um fantasma racista. Porquê uma questão rácica? Porque a sua “perda” de aparência negra tende a ser reprovada como negação da sua própria raça. Porquê um fantasma racista? Porque “mudar” de cor é, por vezes, interpretado como uma menorização simbólica, no limite política, da sua cor original.
Como sair deste labirinto? De facto, não se sai. Mais do que isso: por mais voltas que Jackson dê às suas imagens, às suas palavras ou até às suas declarações políticas, toda a sua história será sempre uma história contaminada por essa pergunta básica e perturbante: afinal, o que vale a cor da pele?
No dia em que Jackson completa 50 anos, podemos fazer-lhe a justiça de recordar o mais óbvio (que é também, no nosso imaginário mediático, o mais recalcado). A saber: que ele arriscou, como poucos, construir um edifício formal e um universo artístico em que a resposta àquela pergunta se dissolvesse numa irónica irrisão. Que vale, então, a cor da pele? A resposta é: nada. Ou ainda: tanto faz.
Claro que os mais precipitados verão sempre em tal resposta uma tentativa de negação ou, pelo menos, de cínica banalização da história dos negros dos EUA e de todas as convulsões que, de uma maneira ou de outra, nos remetem para as memórias brutais da escravatura. Poderíamos recordar, como contraponto, o discurso humanista da obra de Jackson (mesmo sabendo que a noção de humanismo é filosoficamente fraca no nosso presente). Mas talvez seja preciso sublinhar que Jackson construiu essa obra celebrando a indiferença da cor.
O seu lendário primeiro single do álbum Dangerous (1991) chama-se mesmo Black or White: não é sobre o confronto entre preto “e” branco, mas sim sobre a mutabilidade simbólica de preto “ou” branco. O teledisco de Black or White, porventura o filme mais perfeito do realizador John Landis, é disso a esplendorosa celebração. Recorrendo a algumas (então) pioneiras técnicas digitais, nele vemos uma série de rostos brancos, negros, de todas as cores, rostos esses que se vão literalmente fundindo uns nos outros, renascendo numa igualdade plena de diferenças.
Do ponto de vista técnico, Black or White é um sinal premonitório do tipo de fusões que o digital estava a instalar. No plano estético, funciona como apoteose de um conceito, afinal, inerente aos nossos tempos de tantas transfigurações: o nosso corpo não vale pela sua cor, porque existe como entidade aberta a todas as mutações. Tudo isso surge envolvido numa sensualidade que abraça todas as ambiguidades, sejam elas de cor ou género. Essa sensualidade, ou melhor, esse erotismo é uma coisa de exuberante colorido.
A pedalar desde 1983
Este é o teledisco original que acompanhava a canção nos singles de 1983 e 84, resgatando imagens de arquivo da Volta a França em Bicicleta. Este mesmo filme foi usado depois como pano de fundo à intepretação da versão original de Tour de France na mais recente digressão dos Kraftwerk.
sexta-feira, agosto 29, 2008
Violência dos blogs (8)
Um dos efeitos mais bizarros da (equívoca) democratização dos blogs é a (ainda mais equívoca) proximidade. Nasceu, assim, o bloguista que julga que está no mesmo plano de qualquer um dos seus interlocutores — e isso, para ele, não só é evidente, como se lhe afigura incontestável.
Michael Jackson: carnal e digital
"Star Wars": cinema ou jogo de video?
Para o melhor ou para o pior, muito cinema americano das últimas três décadas depende do conceito de blockbuster e dos seu dois “inventores”: Steven Spielberg e George Lucas. O primeiro, em 1975, com Tubarão conseguiu um inusitado êxito planetário e sistematizou as leis narrativas e comerciais do blockbuster. Em 1977, com o primeiro título de A Guerra das Estrelas, o segundo refez para a idade moderna o conceito primitivo de serial. Sintomaticamente, Spielberg e Lucas têm os seus nomes ligados através das aventuras de Indiana Jones, outra saga eminentemente popular.
Mais de trinta anos passados sobre o Star Wars original, o cartão de visita de Lucas é este desconcertante filme de animação que, com inevitável ironia, dá pelo nome de Star Wars – A Guerra dos Clones. Porquê desconcertante? Porque podemos verificar que este cinema de revisão dos modelos clássicos de ficção científica, e também de novos conceitos de merchandising e marketing, deslizou, lentamente, porventura metodicamente, para o novo país dos jogos de video.
A questão é pertinente, não porque o cinema esteja “interdito” de aceitar contaminações dos jogos de video. Bem pelo contrário: desde Minority Report (Spielberg, outra vez) até Speed Racer (o filme dos irmãos Wachowski também lançado este Verão), já se provou que a sua relação pode ser interessantíssima. Acontece que, por vezes, tal relação parece conduzir a uma bizarra estagnação do próprio cinema. Daí a surpresa: nesta guerra de “bons” e “maus” mais ou menos clonados, o desenho animado é reconduzido a um primitivismo técnico que não aguenta qualquer comparação com a sofisticação digital que domina o mercado (veja-se a excelência de WALL-E e compare-se...).
Daí também o impasse que aqui pressentimos. Dir-se-ia que Lucas produziu um longo “filme-anúncio” de um jogo de video, ao mesmo tempo simplificando o espírito de aventura que, muito justamente, encarnou. É um impasse que, afinal, lança algumas interrogações a todas as futuras opções de aventura da produção de Hollywood.
A primeira sinfonia de Obama
Pixies: novo álbum? (parte 523)
Uma colaboração com Chen Kaige
'Do You Believe In Shame' (single), 1989
A escolha de um terceiro single a retirar do alinhamento de Big Thing fugiu ao registo dançável dos anteriores I Don’t Want Your Love e All She Wants Is. Homenagem a alguns amigos recentemente desaparecidos, entre os quais Andy Warhol e o produtor Alex Sadkin, Do You Believe In Shame é um exemplo da face pop tranquila, mas de construção claramente texturalmente mais elaborada, do álbum de 1988. A canção levantou um caso legal que clamava pela enorme proximidade com o clássico Suzie Q, de Dale Hawkins, célebre na gravação dos Creedence Clearwater Revival, ao que o grupo respondeu ser apenas um acaso, apontando a melodia como fruto de uma simples progressão característica dos blues... O single chegou a tempo de promover uma nova digressão, mas nada mais fez que cimentar o evidente momento de queda de popularidade do grupo. Atingiu apenas o número 30 no Reino Unido e não foi acima do número 72 nos EUA... Isto apesar da edição no formato de triplo single em vinil, com uma série de lados B, entre os quais uma versão ao vivo de Notorious, uma mistura de Drug (It’s Just A State Of Mind), o Krush Brothers LSD Edit (com The Edge Of América e Lake Shore Drive, desta última canção nascendo as iniciais LSD do título) e dois poemas em registo Spoken Word, lidos por Simon Le Bon: God (London) e This Is How A Road Gets Made, depois usados como separadores na digressão. A maior surpresa do single talvez resida no facto da banda ter desafiado o realizador chinês Chen Kaige a dirigir o respectivo teledisco.
Realizado por Chen Kaige, quatro anos antes de se tornar globalmente reconhecido, em Cannes, com Adeus Minha Concubina, o teledisco de Do You Believe In Shame tenta recuperar o carácter mais “cinematográfico” dos telediscos de 1982 e 83. Filmado em Nova Iorque, mostra os elementos do grupo em várias situações, tentando seguir sugestões da canção e das figuras que a inspiraram.
Happy birthday, Michael!
Para além das sombras e fantasmas da história pessoal de Michael Jackson (que não é, por certo, nem simples nem idílica), muito para além das vulgaridades mediáticas que sobre ele se abateram, o seu trabalho criou uma persona artística em que a sensualidade da música e a teatralidade das imagens não são alheias a alguma dimensão de sagrado. É esse o fascínio — e também o medo — que podemos descobrir e contemplar nestas regiões mais recônditas do país da pop.
quinta-feira, agosto 28, 2008
Madame Françoise Hardy
Neste registo de 1969, Françoise Hardy interpreta um original alemão, Träume — no ano 2000, o realizador francês François Ozon utilizou a sua versão desta canção na banda sonora de Gouttes d'Eaux sur Pierres Brûlantes, adaptação de uma peça de Rainer Werner Fassbinder.
A aventura fora de moda
quarta-feira, agosto 27, 2008
Televisão / cultura / futebol
Rock na esplanada da Cinemateca
terça-feira, agosto 26, 2008
"A Solidão": grande cinema espanhol
Vasco Santana ou a publicidade dos anos 30
Ser ou não ser... Tiffany Claus
Uma canção para o Verão (10)
Músicos por Obama
segunda-feira, agosto 25, 2008
Mia Wasikowska no país de Tim Burton
Embora com uma carreira ainda discreta, Mia Wasikowska vai por certo ser falada antes da saída do filme de Burton, uma vez que o seu nome figura no elenco de duas produções especialmente ambiciosas: Defiance, de Edward Zwick, com Daniel Craig, um drama da Segunda Guerra Mundial (com lançamento em Dezembro, nos EUA, a tempo dos Oscars), e Amelia, de Mira Nair, evocação da aviadora americana Amelia Earhart, com Hilary Swank (a estrear em Outubro de 2009).
Curiosamente, o anúncio da escolha de Mia Wasikowska foi feito a 25 de Agosto de 2008, dia do 50º aniversário de Tim Burton.
>>> A foto provém de um site de um fã: Mia Wasikowska online.
>>> Alice: texto integral em inglês.
>>> The Lewis Carroll Society.
67 fotografias de Pequim
Audrey Hepburn era chinesa?
Entre as imagens ultimamente mais comentadas estão a que nos chegaram de Pequim, no dia 8 de Agosto, da abertura dos Jogos Olímpicos. Nelas surgiu a encantadora Lin Miaoke (9 anos) que cantou uma Ode à China. Aliás, ela não cantou, fez playback: a voz pertencia, de facto, a outra criança, Yang Peiyi (7 anos). Para a organização, a primeira tinha uma imagem mais adequada e, daí, a opção pelo playback.
Na imprensa de todo o mundo, com mais ou menos ironia, por vezes com alguma desilusão, a “troca” foi amplamente referida, embora sem empolar a sua dimensão muito particular. Não tem sido assim na Internet e, mais especificamente, no espaço dos blogs. Para muito boa gente, de todos os cantos do planeta, Lion Miaoke e Yang Peiyi foram mesmo as pobres vítimas dos métodos de uma terrível ditadura.
Confesso que não tenho gosto nenhum em brincar com as mais delicadas questões políticas e culturais. Assim, parece-me vergonhosamente gratuito, seja sob que pretexto for, reduzir a história secular do povo chinês e, em particular, as suas contribuições artísticas (incluindo, claro, no cinema contemporâneo) à imagem de um “rebanho” humano. Do mesmo modo, sou sensível à delicada questão da defesa dos direitos humanos na China (e, em particular, no Tibete), embora isso não me pareça legitimar uma visão de tão fascinante país a um governo “mau” de um lado e um povo “silencioso” do outro.
Não estou a caricaturar, pela simples razão de que é essa lógica grosseira que podemos encontrar em muitos espaços da Internet. Assim, insisto, o episódio de Pequim foi frequentemente referido a partir de um agressivo maniqueísmo: fazer playback seria o equi-valente dos mais tenebrosos métodos de repressão política.
Na verdade, as formas de ignorância favorecidas, e muito amplia-das, pela Internet podem ser assustadoras (sem que isso, obviamente, nos faça renegar as maravilhas da World Wide Web). Neste caso, estamos perante uma visão tão redutora, para além de moralista, que dispensa o conhecimento de toda a história do género musical ao longo do século XX, em particular na produção dos grandes estúdios de Hollywood. Basta ver o clássico Serenata à Chuva (1952) para ficar a saber que o playback, com todas as suas ambivalências técnicas e humanas, foi um elemento constituinte da própria gestação do musical.
Claro que ninguém quer menorizar a verdade artística de um corpo que canta com... a sua própria voz. Que diabo! Não vamos passar a dizer que Maria Callas, coitada, até tentava cantar... Acontece que os exemplos de play-back são desconcertantemente frequentes na história do espectáculo musical. Há mesmo o caso limite da cantora Marni Nixon que se “especializou” em tais tarefas. Entre os seus muitos e notáveis playbacks estão os de Natalie Wood, em West Side Story (1961), e Audrey Hepburn [foto em cima], em My Fair Lady (1964).
Lembram-se de My Fair Lady, a genial adaptação musical do Pigmalião, de Bernard Shaw, realizada por George Cukor? Tendo em conta que My Fair Lady, ainda por cima, ganhou oito Óscares (incluindo melhor filme), será que podemos deduzir que a democracia americana já foi uma sangrenta ditadura? Ou andamos todos enganados e, afinal, Audrey Hepburn era chinesa?
Nos 90 anos de Bernstein
Pelo mundo fora os 90 anos de Bernstein traduzem-se em programas sinfónicos de homenagem, ora visitando a sua obra ora a dos compositores que mais abordou como maestro. A Filarmónica de Nova Iorque dedica-lhe a próxima temporada. A Naxos edita uma caixa de DVDs. Por cá... nicles!...
Nos 90 anos de Bernstein aqui propomos duas memórias com som e imagem...
A abertura de Candide, na sua versão de 1989, dirigida pelo próprio Bernstein em Londres. Note-se, apesar da idade avançada, o prazer do maestro enquanto dirige a sua música. E por vezes dança...
Reduzir Bernstein a West Side Story é uma injustiça para com toda uma obra que vai muito além deste momento de genial diálogo da tradição clássica com o jazz, a música latina e uma consciência da coexistência de culturas da cidade de Nova Iorque. West Side Story é, contudo, referência incontornável. E aqui fica Somewhere, uma das suas canções de referência, em versão pelos Pet Shop Boys.
Eleições made in USA
Lolita, século XXI
Jerry Finn (1969 - 2008)
>>> Notícia na Billboard.
[Jorge Marques: agradecemos o seu mail].
domingo, agosto 24, 2008
Londres - Pequim - Londres
Um caso de "pirataria" bem antes da pop
Manny Farber (1917 - 2008)
A notícia foi caindo discreta (em alguns meios, atrasada), mas o certo é que o património histórico da crítica de cinema perdeu uma das suas referências míticas — no passado dia 18 de Agosto, faleceu Emanuel Farber, para a história Manny Farber, um dos mais singulares críticos que o século XX, afinal o século do cinema, conheceu. Tinha 91 anos.
Tendo estudado e praticado pintura — por vezes homenageando através dos seus quadros os seus cineastas de eleição —, Manny Farber foi criador de uma escrita em que a deambulação formal e artística resistia a todas as hierarquias consagradas. O seu distan-ciamento em relação a cineastas de "peso" (chamou-lhes mesmo "búfalos de água") como Orson Welles ou Alfred Hitchcock era contrabalançado por uma admiração militante por "artesãos" como Anthony Mann, Raoul Walsh ou Budd Boetticher e, de um modo geral, pelo espírito de série B.
Começou por escrever em The New Republic, tendo passado, entre outras publicações, pela Time, Art Forum, Film Culture e Film Comment. De Farber persiste, assim, uma herança plural que celebra, acima de tudo, o cinema como fenómeno específico, exuberante, sempre em aberto. O seu derradeiro texto data de 1977, foi publicado na Film Comment e tinha como objecto o trabalho da cineasta belga Chantal Ackerman. Uma antologia do seu trabalho existe editada, pela Da Capo Press, com o título Negative Space.
>>> Obituário em The New York Times.
>>> Manny Faber por Paul Schrader.
sábado, agosto 23, 2008
Elogio do CinemaScope
Eis mais uma, dessas que vão proliferando sem o mais pequeno trabalho de enquadra-mento histórico e comercial. Chama-se Um Estranho na Minha Vida — título original: Strangers When We Meet — e é um filme que reflecte de modo exemplar a preocupação dos estúdios de Hollywood, em finais dos anos 50, princípio de 60 (o filme é mesmo de 1960), de oferecer intrigas que, pela sua dimensão assumidamente adulta, se demar-cassem do crescente impacto do entertainment televisivo. Encontramos, aqui, sob a direcção de Richard Quine, o par Kirk Douglas/Kim Novak a interpretar uma história de adultério que, definitivamente, integrou um desencantado realismo social, dispensando os modelos tradicionais do "galã masculino" ou da "mulher fatal". Tudo isso, importa sublinhar, em feliz coexistência com o formato CinemaScope, também ele, pela sua amplitude visual e potencialidades dramáticas, comercializado (desde 1953) como um explícito desafio à pequenez do ecrã televisivo.
Olímpicos: ganhar e perder
Analisa-se muito pouco a responsabilidade das televisões na criação de determinadas expectativas colectivas, em particular na área do desporto. Nos Jogos Olímpicos, por exemplo.
Ópera baseada em '1984' chega ao DVD
Em 1974, David Bowie tentou criar uma primeira abordagem musical ao mundo e personagens do 1984 de Orwell. Porém, desencantada com a primeira adaptação do romance ao cinema (em 1956, com realização de Michael Anderson), a viúva do escritor não autorizou a adaptação. Apesar de ter já algumas canções escritas, o musical ficou na gaveta. Mas da ideia nasceria o álbum Diamong Dogs. Em 2005, coube ao maestro e compositor Lorin Maazel o desafio de transformar o romance de Orwell num espectáculo musical. Com libreto de J. D. McClatchy e Thomas Meehan, 1984 (a ópera) estreou-se em Londres, na Royal Opera House, em Maio de 2005. Maazel, que contava já 75 anos (e 50 de carreira) quando aceitou finalmente o desafio de compor 1984.
Maazel encontrou preciosa colaboração no realizador de cinema canadiano Robert Lepage, nome já com experiência na ópera tendo assinado, entre outras, as direcções artísticas de O Castelo de Barba Azul de Bartók ou A Danação de Fausto de Berlioz. Com um elenco onde se destacam o barítono Simon Keenlyside (no papel protagonista de Winston Smith), o tenor Richard Margison (como o vilão O'Brien), o soprano Nancy Gustafson (como Julia) e a voz de Jeremy Irons na leitura, em off, dos comunicados de propaganda, a ópera é um monumento de música e imagens. A encenação explora a omnipresença do olhar do Big Brother sobre um espaço opressivo pós-industrial, sombrio e intimidante. A espantosa música de Maazel, por sua vez, sublinha o fosso que separa o discurso oficial do poder, forte e implacável, que esmaga as vozes e sonhos do indivíduo. A Royal Opera House esgotou a lotação enquanto a produção esteve em cena. E o mesmo aconteceu, pouco depois, quando passou pelo palco do La Scala, em Milão. Agora, 1984 chega a DVD em imagens captadas em Covent Garden em 2005, num filme realizado por Brian Large. Como extra, uma contextualização da história.
No texto que acompanha o DVD, Lorin Maazel relata como a sua ópera nasceu de uma profunda admiração pelo texto de Orwell. O compositor confessa-se admirado pelo "génio" do escritor, mas também pelo carácter contemporâneo das temáticas sociais que o romance levanta. O tom de denúncia que o livro veicula, nomeadamente quando foca o subjugar do indivíduo perante uma ideologia e um poder absoluto, é claramente central na ópera que nasce da sua fiel adaptação. Das palavras, Maazel captou atmosferas que transformou em música, que, 59 anos depois, mantém vivo o "horror" de 1984. Originalmente publicado em 1949, o livro teve também já vida no pequeno e grande ecrãs. Uma primeira adaptação ao cinema em 1956 por Michael Anderson e uma segunda versão, para TV, em 1965, por Christopher Morahan, horrorizaram a viúva de Orwell. Já depois da sua morte, Michael Radford apresentou (em 1984) uma terceira e magnífica adaptação, com os principais papéis entregues a John Hurt e Richard Burton, com banda sonora assinada pelos Eurythmics.